Aquela gente que gravita no universo político português debitando sentenças e proclamando dogmas, com a liberdade e audiência que lhes é permitida por um jornalismo medíocre, minado de simpatizantes sem qualidade da mais rasca política de direita, sabendo-se de rédea solta derrama os maiores dislates. Sabendo que lhes está garantido esse direito não hesitam, rapidamente ocupam os espaços que a comunicação social estipendiada lhes concede. Assim se vão pondo tijolos, dos mais variegados tipos, no muro do campo de concentração do pensamento único neo-liberal.
Uma frente de batalha actual é as eleição presidencial. Nada é demais para empurrar Cavaco para uma vitória na primeira volta.
Na semana passada, um jornal diário foi ouvir membros da sua Comissão Política e de Honra. O que se diz sem hesitação é fenomenal.
Joaquim Aguiar, da Comissão Política cavaquista, é peremptório a atestar que os outros candidatos têm “programas do século passado e a crise liga o passado ao futuro” (…) Cavaco é o único que tem os próximos cinco anos para abrir esse caminho”.
Ninguém questiona o que são políticas do passado e que futuro é esse. O que deveriam fazer quando o personagem sempre defendeu políticas do passado. Logo a seguir ao 25 de Abril, Aguiar era um peão de brega do grande capital que tinha feito caminho debaixo do guarda-chuva do fascismo. Escriba aspirador das alcatifas dos corredores sombrios de uma grande frente de capitalistas (MDE/S) que, tendo fracassado o golpe Palma Carlos-Sá Carneiro e estando em marcha o 28 de Setembro da Maioria Silenciosa, vinha prometer, com desaforada demagogia, o «desenvolvimento económico» oferecendo de mão beijada 120 milhões de contos de investimento e 150 mil postos de trabalho, mediante garantias políticas que eram um regresso ao passado próximo. Era tentar alcançar, depois da Revolução de Abril, a almejada e fracassada primavera fascista. Nessa altura o jovem Aguiar, vendia os seus talentos de mordomo do capital aos fascistas reciclados, proclamava, com o descaro que não perdeu, que aquela era a política do futuro, que o programa do MFA era o passado. Pouco imaginativo mas muito activo a abrir as portas dos gabinetes do poder, nunca perdeu o jeito de fazer pela vidinha mudando de farda conforme o vento. Repete-se cacofonicamente colando os mesmos selos no que lhe vai passando pela frente.
Nogueira Leite, da Comissão de Honra, estampa-se sem remissão afirmando que há um desfasamento enorme entre a estatura política de Cavaco e a dos outros candidatos. Dizer isto é tentar apagar tudo o que Cavaco fez quando foi primeiro-ministro, esbanjando os oceanos de dinheiro que desaguavam de Bruxelas numa política de betão pra encher o olho, ou depois já Presidente da República a escolher conselheiros do calibre de Dias Loureiro, a enredar-se no caso das escutas de Belém, a ter tido a sua campanha eleitoral apoiada financeiramente pelo BPN. Ou agora, presidente e candidato, a fazer um discurso de apresentação que é um auto elogio de banalidades medíocres em que tenta mostrar, num português cacarejante, que não há português como ele.
É esta a estatura de Cavaco Silva, não sendo de esquecer feitos culturais que muito bem se adesivam na sua imagem de confesso admirador de Macgywer. Foi no seu governo que um secretário de estado da cultura vetou a candidatura de José Saramago ao Prémio Europeu da Literatura e suportou a decisão de um embaixador que proibiu a exibição de um filme de João César Monteiro no país onde exercia funções. Coisas do tempo de glória de Cavaco a atribuir a autoria da Utopia a Thomas Mann ou a dizer competividade, mas aí está muitíssimo acompanhado, só corrector ortográfico os põe a escrever competitividade.
A maioria de Bocage conhecerá as anedotas, embrulha-se com o número de cantos dos Lusíadas, é provável que julgue que Luísa Todi ganhou um Emmy com uma cantoria qualquer e que o padre António Vieira é um pároco de aldeia esmolar.
Um país de Burros em Pé.
Que bom para nós e que mau para eles que a sua memória não seja curta, caro MAA !
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