1- CABEÇAS “PENSANTES”
Nos prados verdes e viçosos da nossa comunicação social os inúmeros comentadores pastam com o sorriso alegre, ruminante e beato de quem olha o futuro com a certeza da eternidade dos mercados mesmo quando a sua queda livre já nem sequer é anunciada, é um facto. Uma realidade inquietante por coexistir com os sinais de confrontos, cada vez mais frequentes, que vão dos debates diplomáticos mais aparentemente civilizados àqueles em que a diplomacia se exerce pelo uso da força, das sanções à intervenção militar, a sua forma extrema.

Nada disso remove o sorriso bovino da multidão de comentadores em concorrência ao que Cavaco Silva revelou ao mundo embasbacado, ter descoberto nas vacas açorianas. Os géneros são os mais diversos cobrindo largo espectro. Dos mais sofisticados que se esforçam por parecer independentes e lançam boias para que o sistema não se afogue nas suas próprias contradições aos que, dotados de enorme espessura óssea, arremetem contra a realidade como arietes medievais a rebentar portões das cidadelas onde ela se refugia para a ferir de morte ao som do alarido das carpideiras a entoarem os improváveis amanhãs que cantam do império.
Uma dessas luminárias, cegas pelo furor de acreditar teologicamente no futuro da ordem unipolar no mundo, é Miguel Monjardino (MM) que todas as semanas arrota tonteiras, o que faz presumir como atormenta as meninges dos seus alunos na Universidade Católica que, quando chegam à rua, devem ficar atónitos verificando que ou a realidade naqueles minutos de trânsito mudou quase completamente, ou que pouco do que lhes foi impingido tem a ver com ela.
A sua crónica no Expresso de 25 de Outubro é o exemplo acabado de um pretenso Tirésias de vão de escada que à cegueira física soma a cegueira mental que o torna num completo incapaz de ler o presente e prever qualquer futuro. O tema “Energia e Política”, em que, referindo a Ucrânia, as eleições que se iriam realizar nesse fim-de-semana, faz considerações sobre questões geoestratégicas relacionadas com a energia, as finanças, os equilíbrios globais.
Em duas penadas despacha as questões energéticas actuais para fazer duas demonstrações: 1ª O orçamento russo é muito dependente das exportações de petróleo e gás, o que a torna muito vulnerável e um país muito fraco. 2º Os EUA lideram a revolução energética a nível mundial e a influência de Washington na regularização da globalização financeira nunca foi tão grande.
2. MERCADOS DAS ENERGIAS
O estado actual dos mercados energéticos é muitíssimo mais complexo do que que MM supõe. Quanto ao segundo pressuposto é o avesso da realidade. O objectivo de MM é linear. Comungou a hóstia macdonnald do mundo unipolar com a fé de quem acredita que será dirigido para lá dos séculos pelos seus donos que atiçam a canzoada: ladrem, ladrem, quanto mais ladrarem menos gente olha para os nossos pés de barro.

A turbulência dos mercados do petróleo é dominada pelo baixo preço do barril de petróleo que resulta, por um lado do abrandamento da economia mundial, por outro por a Arábia Saudita estar a inundar o mercado com petróleo, chegando a vendê-lo aos seus clientes asiáticos a US$50/60 o barril. A decisão da casa Saud pode ser o resultado de um conluio EUA/Arábia Saudita, para atingir, em primeira linha, a Rússia, em, segunda linha o Irão, depois todos os outros países produtores. Mas a primeira consequência é arrasar os mercados de futuros, sem ainda serem previsíveis as consequências, sobretudo nas bolsas de Nova Iorque e Londres, as principais praças desse “produto” financeiro. Tudo isto é menos que linear, mas faz MM, do alto da sua fissurada ciência, decretar impante, como todos os ignorantes o são, que “a revolução energética é agora liderada pelos EUA”. Não percebe que a entrada da Arábia Saudita nessa trama, ao atingir fortemente a Rússia, cujo PIB muito depende das exportações de petróleo e gás o preço barril terá que ter um patamar mínimo de US$ 100, tem efeitos colaterais brutais, alguns ainda não entrevistos.

3-NOVAS FONTES ENERGÉTICAS
Os norte-americanos são neste momento energeticamente autossuficientes, têm capacidade exportadora por via da produção de óleo e gás de xisto, o “shale”. Só que o preço de extracção do “shale”. Só que o preço extracção do “shale ”números da Agência Internacional de Energia (AIE), varia entre os US$ 60/85, barril igual ou superior ao actual preço de mercado do barril de petróleo. No seu valor mínimo só um preço acima dos US$105/barril remunera essa produção. É de referir que os investimentos são enormes porque os poços esgotam-se praticamente na primeira perfuração. Isso sem referir o desperdício de água, necessária em volumes brutais, os impactos ambientais A poluição das águas subterrâneas consequência do “fracking” começa a ser severa e preocupante. Outros fenómenos como o aumento de sismicidade, já cientificamente comprovada, e outros enunciados mas ainda não mensurados, tornam a produção de “shale” controversa.

O conluio entre a Arábia Saudita e os EUA, que tem o objectivo de levar a Rússia á falência e submeter o Irão aos ditames do império, acaba por ter um efeito de ricochete nos EUA, que a Arábia Saudita utiliza em proveito próprio procurando ocupar o lugar agora deixado quase vazio pelos outros grandes produtores, como a Líbia e o Iraque. Trava as veleidades exportadoras dos EUA, porque a produção de gás das rochas betuminosas é marginal e mesmo que não fosse não existem infraestruturas para a sua exportação. A outra face dessa “revolução energética é que, embora a extracção de hidrocarbonetos de rochas compactas tenha aumentado a bom ritmo, os operadores têm-se endividado de forma brutal. O custo e as exigências continuadas de investimento, não é coberto pelas receitas geradas. Ivan Sandrea, da Oxford Institute for Energies Studies, num relatório recente afirma: “quem pode ou vai querer, financiar a perfuração de milhões de hectares e centenas de milhar de poços com prejuízo permanente? (…) A benevolência dos mercados de capitais dos EUA, não pode durar para sempre”. Análises da Blombreg e do Barclays concluem que cada US$1 ganho custou US$2,11. O que é insustentável a curto e médio prazo e está sobre forte pressão dos actuais preços do barril de petróleo, impostos pela Arábia Saudita. Este é a radiografia da “revolução energética a nível mundial é agoira liderada pelos EUA“ que faz salivar de alegria MM, porque com os seus fracos recursos em massa cinzenta, um bem que mesmo escasso é gratuito, não vê que essa revolução energética tem mais razões políticas que económicas, o que a torna frágil e de futuro, a curto e médio prazo, mais que incerto.
Outra ficção é o “light crude” saudita acabar por substituir as outras importações de petróleo europeias. A transformação das refinarias para o “light crude” exige investimentos incomportáveis. A Europa beneficia no curto prazo, mas não a médio prazo.
4-DÓLAR, PETRODÓLARES
As primaveras árabes, a guerra no Iraque e na Síria, a emergência dos islamitas radicais, os vários braços da Al-Qaeda, tudo invenções dos serviços secretos norte-americanos ao serviço de uma política expansionista e de defesa do petrodolar e com o fim último de cercar a China e a Rússia, tem sido postas activamente em prática. Saddam Hussein, embora com restrições violentas à exportação do seu petróleo, começou a vendê-lo em euros. Kadhaffi, estava a tentar implementar um sistema de venda do barril de petróleo em dinar-ouro. Na Síria estava ser projectado um oleoaduto e um gasoduto para dar acesso directo ao Mediterraneo ao gás e ao petróleo do Irão. Estão explicados os conflitos, o frenesi de agitar as rotas bandeiras dos direitos humanos e da democracia esburacadas pelos interesses económico-finnceiros. A opinião sobre estes conflitos de alguns diplomatas que andam por aí a perorar dariam vontade de rir se a situação mundial não fosse tão séria.
Ainda em relação à energia MM diz e bem, pepitas raras de verdade são largadas de quando em vez para dar credibilidade ao disparate, que a Europa vai demorar uma década a ser energeticamente independente da Rússia, para concluir que a viragem da Rússia para a China é uma miragem. Em menos de dez anos prevê-se que os oleadutos entre a Rússia e a China entrem em funcionamento, pelo que não se percebe onde habita a miragem.
A política do petróleo a um preço artificialmente baixo tem consequências que não podem ser mensuráveis com certezas absolutas, pelos efeitos perversos que tem sobre quem a prática e apoia. Em relação aos EUA tem uma exigência não negligenciável: manter o dólar, com variações mínimas, à cotação actual. Garantir a cotação exige a sobrevivência do petrodólar, resultante de um acordo EUA/Arábia Saudita, que impôs o dólar como moeda de referência nas transacções de petróleo, depois adoptado por outros países da OPEP, e o dólar como moeda de referência nas transacções internacionais. MM sabe quanto essa premissa é fundamental e arremete contra todas as evidências. Decreta que “a influência de Washington na regulação da globalização financeira nunca foi tão grande como agora”. Isto já não é um disparate. É uma alarvidade todos os dias desmentida pelas mais diversas e inquestionáveis fontes.
5- DÓLAR À BEIRA DO ABISMO
Um alerta vem do FRED (Federal Reserve Bank of St.Louis) que noticia que só num ano, 2008; foi criado quase tanto dinheiro (817.904 milhões de dólares) como nos 63 anos anteriores (de 1945 a 2008 821.686 dólares). Que nos seis anos de crise, Janeiro de 2008/Setembro 2014, foi criado quatro vezes mais dinheiro do que entre 1945/2008.

Quer dizer, sem resolver a crise, a tipografia não parou de imprimir notas verdes. Um sinal de que tudo está a correr mesmo muito mal é o FED ter deixado de divulgar as estatísticas de M3 (M1, dinheiro em circulação e dinheiro depositado em contas à ordem. M2 M1 mais dinheiro depositado em contas a prazo e pequenos instrumentos de poupança. M3, M2 mais os grandes instrumentos de poupança, eurodólares, outras divisas, etc.). a partir de Março de 2006, ocultando deliberadamente esse indicador. O que vale o dólar? O primeiro sinal de alarme vem do mercado do petróleo. O dólar, os chamados petrodólares só são agora usados em 75%/80% das transacções mundiais. Pior é a situação do dólar como moeda de trocas comerciais. Os BRICS decidiram fazer as transacções entre si nas suas moedas. A China e o Japão, os maiores parceiros comerciais asiáticos, usam as suas moedas desde 2012. A tendência para abandonar o dólar é crescente já atinge mais de 30% das transacções comerciais mundiais, tendência em aceleração. Um editorial recente do Wall Street Journal, avisa para o enorme perigo de nos próximos três anos o dólar só estar presente em 50% das transacções comerciais mundiais e nos cinco anos seguintes tornar-se uma moeda quase irrelevante. Mais pessimistas são alguns analistas neoliberais. Lord Christopher Monckton de Brenchley, um dos assessores e mentores de Margaret Thatcher escreve um artigo com o título “The dollar colapse not whetter, but when”, que a falência do dólar é uma questão de tempo , porque os EUA, com uma dívida gigantesca aumentam-na em 64 000 dólares a cada segundo!!!

Jeremy Levy, economista que previu a crise do subprime, avisa a forte probabilidade de crash em 2015 .Peter Singer, que gere um dos maiortes fundos de investimento o Trust Investment Elliot Managenement, calculado em 5 400 mil milhões de dólares, escreveu uma carta aos seus investidores, carta também reproduzida na Bloomberg News, avisando-os que não é prevísivel o tempo que irá durar uma política com dados de crescimento falsos, com postos de trabalho falsos, com dinheiro falso, com investimentos falsos, com financiamentos falsos. Os alertas disparam de todos os lados. A confiança que dava ser dono da tipografia e de se poder imprimir notas verdes a toda a hora para as injectar na economia, foi chão que deu uvas. Poderão ser previsões excessivamente pessimistas, mas noutros tabuleiros a realidade move-se.-
5- REALIDADES EMERGENTES
Os indicadores acumulam-se. Segundo o FMI o PIB da China; 17,6 biliões de dólares, 16,5% do PIB mundial ultrapassou em Setembro o dos EUA,17,4 biliões de dólares, 16,2% do PIB mundial. Os analistas do FMI e do BMI, previam que isso só acontecesse em 2016. Um facto a sublinhar porque a última vez que isso sucedeu foi em 1876 quando os EUA ultrapassaram aa Grã-Bretanha.

As previsões do FMI para 2015 são catastróficas para os EUA. A diferença entre os dois países será superior a dois biliões de dólares.
Outra novidade registada nos estudos do FMI é que o poder de compra G7- EUA, Japão, Canadá Inglaterra, França. Itália, Espanha, foi ultrapassado por um novo G7- China. India, Rússia, Brasil, Indonésia, África do Sul, Turquia em dois mil milhões de dólares.

Tudo notícias pouco favoráveis ao dólar e ao domínio dos EUA sobre o mercado de capitais que se joga noutras frentes. O Banco de Desenvolvimento decidido pelos BRICS, tem entre outros objectivos por em circulação uma moeda alternativa ao dólar nas transacções mundiais. É uma ameaça aos habituais instrumentos de dominação financeira actuais, o FMI e o BMI. A internacionalização do yuan está em marcha. Já salvou a Bolsa de Londres de grande afundamento e começa a ser olhado pelo BCE como moeda importante para as suas reservas monetárias. Na área do Pacífico a China desafia abertamente os EUA com um Banco de Desenvolvimento Asiático. Ainda na recente reunião da APEC- Asia-Pacific Economic Cooperation, que se realizou em Pequim, Obama tentou contornar os objectivos da China, reunindo-se na embaixada dos EUA com os doze mais importantes países, excluindo a China e a Rússia. Não teve êxito e acabou por ver aprovada a proposta da China que, através do Banco da China e do Fundo China, vai investir 140 000 milhões de dólares em ionfraestruturas ferroviárias, rodoviárias e marítimas para desenhar uma nova Rota da Seda. Xi Jinping foi muito claro nesse objectivo, firmado num Acordo Estratégico Trans-Pacífico de Associação Económica, que irá redesenhar o mapa de negócios da Costa Asiática do Oceano Pacífico estendendo-o até à Europa, para garantir um novo equilíbrio no campo económico. Os EUA são atirados para um plano secundário nesse novo eixo mundial.
6- O OURO E O DÓLAR
Como se isto tudo não fosse suficiente a outra arma que os EUA têm utilizado para manter artificialmente o dólar ao seu valor actual é a manipulação do mercado do ouro. Desde 2010 que o FED, os seus agentes bancários têm realizado vendas de ouro a descoberto. O mercado da Comex, a bolsa de ouro actual com sede em Nova Iorque, desde essa data, vende ouro-papel e não ouro-físico. Os grandes compradores são os especuladores e os hedge funds que compram e vendem activamente esse ouro-papel para controlarem o preço do ouro e proteger o dólar. As emissões de ouro papel são brutais, muitos analistas afirmam que os EUA já não terão ouro que cubra as emissões de ouro papel. A Alemanha e a França por diversas vezes reclamaram em vão a devolução do ouro que enviaram para os EUA, durante a II Guerra Mundial. Há quem veja nisso um sinal grave de haver insuficiência de ouro físico nos EUA.

Paul Craig Roberts, ex SubSecretário do Tesouro nos governos Reagan, advertiu que a China e a Rússia esforçam-se para fortalecer a sua posição com compras maciças de ouro, enquanto os EUA apostam em atrasar essa intenção com guerras e outras intervenções para debilitar os seus rivais e proteger o petrodólar. Vai mais longe. Com o cohecimento de causa que lhe dá o lugar governamental que ocupou, coloca em dúvida que os EUA ainda tenham reservas de ouro, incluindo a de outrso países que lhes foram confiadas. Na sua opinião essas reservas estão esgotadas.
De facto, no ano corrente tanto a China como a Rússia têm comprado enormes quantidades de ouro físico, cuja cotação embora continuando a subir lentamente, consequência da manipulação comandada pelo FED, está longe de ser a que se calcula ser o seu valor real. A China e a Rússia para contrariar e alterar essa situação decidiram instalar no mês de Novembro em Xangai uma Bolsa de Ouro, onde as vendas a descoberto são proibidas e só será transacionado ouro físico. O yuan passará a ter como padrão o ouro o que irá acelerar a sua internacionalização e incrementar a sua procura como a moeda de reserva.

A Bolsa de Xangai será uma fortíssima ameaça às Bolsas de Nova-Iorque e Londres. Vai ser uma luta entre dois mercados de ouro, um baseado na avaliação da realidade e outro no jogo e manipulação. Mais uma forte ameaça ao dólar e ao petrodólar num país com uma dívida brutal, provavelmente já impagável, com enormes e crescentes défices comerciais. Uma política económica sacrificada pela especulação, a desmesurada cobiça de agentes financeiros cujo objectivo principal é salvar cinco ou seis megas conglomerados financeiros, cujos antigos decisores e executivos controlam o FED, o Tesouro e as agências financeiras federais.
6-O MUNDO SOB UMA SERIA AMEAÇA
É essa realidade evidente que ameaça os EUA o que MM não vê para continuar a afirmar que os EUA comandam o mundo financeiro. O pior cego é o que não quer ver, sem querer ver os enormes perigos para a paz mundial que isso representa, bem evidente no frenesi guerreiro de Obama, esse prémio Nobel da Paz que já bombardeou sete países. Pano de fundo o desespero de manter o dólar a flutuar antes que cada nota de dólar não valha mais que as do jogo do monopólio. Há entre os políticos norte-americanos quem acredite e defenda que o primeiro a sacar do gatilho nuclear fica a salvo. MM pensa pouco e mal o estado do mundo, muito menos consegue entrever as grandes alterações geoestratégicas que se estão a desenrolar que provocam o desespero perigoso do império, da sua ordem unipolar. Deve considerar legítimo, normal que Obama discurse na Academia de West Point declarando-se um convicto fora da lei :” Os Estados Unidos usarão a força militar, unilateralmente se necessário, quando os nossos interesses o exigirem, a opinião internacional conta, mas a América nunca vai pedir autorização”. Claro que os interesses dos EUA não são os interesses dos norte-americanos mas os do complexo militar-financeiro, quem verdadeiramente governa por interpostos democratas ou republicanos.
A Miguel Monjardino, arauto rouco do império, oferecemos um rolo de papel higiénico para se babar com o padrão, escrevinhar no verso a sua Guerra e Paz, Tolstoi deve rebolar-se até ao fim da eternidade de raiva do uso abusivo que o idiota lusitano faz do título da sua obra-prima, para depois de cada escrita lhe dar a finalidade para que foi fabricado. As crónicas de MM terão finalmente utilidade e acabam no sítio certo.

Gostar disto:
Gosto Carregando...