
Os ilustres deputados do CDS-PP eleitos por Setúbal, Nuno Magalhães e João Viegas, endereçaram ao não menos ilustre colega de partido e Ministro da Economia Pires de Lima, fazendo uso de uma prerrogativa parlamentar, uma pergunta sobre a suspensão da construção de um acesso alternativo a Praias do Sado e trataram de espalhar a notícia pelos jornais locais.
O acesso às Praias do Sado integrado na variante Casas Amarelas – Mitrena foi cortado há alguns anos quando a via foi finalmente concluída, após mais de uma década em que apenas ligou a Nacional 10 precisamente ao acesso que foi cortado. Depois disso, câmara municipal e junta de freguesia movimentaram-se – sem sucesso, diga-se – para que um acesso alternativo fosse criado. A Junta de Freguesia do Sado, em particular, nunca abandonou a reivindicação e manteve pressão constante para o acesso fosse construído. Dos ilustres parlamentares do CDS-PP, pouco ou nada se ouviu, pelo que se saúda esta repentina atenção à questão, que pode até ser resultado de um despertar súbito de alguém que tenha querido ir às Praias do Sado e se tenha perdido nas novas ligações rodoviárias, mas pode também ser uma tentativa de, em ano eleitoral, fazer um brilharete com uma resposta que, provavelmente, já se conhece. Sabe-se lá se o Ministro terá já decidido avançar com a ligação e, com a resposta dada, os senhores deputados não irão para as Praias do Sado publicitar a excelência da governação portista-passista que, assim, finalmente resolve um problema com o qual os senhores deputados nunca se preocuparam?
Claro que estamos apenas perante especulações das mais puras e duras que pode haver, mas cá estaremos para ver o que acontece…
A pergunta sobre o acesso às Praias do Sado é, porém, apenas um pretexto para abordar uma outra questão que os mesmos ilustres deputados dirigiram, em dezembro do ano passado, ao Ministério das Finanças, pergunta que teve resposta em janeiro seguinte, mas que, até hoje, João Viegas e Nuno Magalhães não arranjaram tempo para dar a conhecer aos setubalenses e azeitonenses. Claro que, na altura, não divulgaram publicamente, como agora fizeram com a pergunta das Praias do Sado, o teor da sua curiosidade, provavelmente porque tiveram receio da resposta. A verdade é que, a julgar pela não divulgação da resposta do Ministério das Finanças, os receios confirmaram-se e confirmou-se também o velho aforismo popular, recheado de razão, que aconselha a ter cuidado com o que se pergunta…
Para se perceber o que está em causa é necessário recordar que o tema central das últimas eleições autárquicas setubalenses foi a taxa máxima de IMI praticada no concelho desde 2002, taxa que, apesar de se manter nos limites máximos desde então, teve os valores cobrados significativamente aumentados em 2013 para muitos proprietários na sequência da reavaliação dos imóveis que o governo PS decidiu e que o Governo PSD-CDS executou.
No centro do debate estava a interpretação jurídica que a autarquia sempre fez e que a obriga praticar as taxas máximas de IMI. Entende a CDU que tais valores decorrem da legislação que regulou e regula os contratos de reequilíbrio financeiro como o que a CMS celebrou em 2003 para impedir a falência da Câmara, contrato que, entre outras obrigações, obriga as autarquias que os assinam a praticar os valores máximos em todas as taxas cobradas.
Essa foi, e continua a ser, a razão legal invocada pela CDU para cobrar taxas máximas, razão que o CDS-PP, o PSD e o PS, os responsáveis pela reavaliação de imóveis que motivou brutais aumentos do imposto a pagar, contestam, defendendo que a autarquia deveria baixar o IMI, numa atitude que tem tudo de demagógico e desonesto, ou não fosse o CDS-PP, em particular, um dos partidos responsáveis pelo mais brutal aumento de impostos de que há memória em Portugal, entre outras malfeitorias que o Manuel Augusto Araújo aqui aborda com grande precisão e regularidade…
Este foi o pano de fundo em que os ilustres deputados dirigiram ao ministério das finanças, em 11 de dezembro de 2013, a seguinte pergunta: «Pode o Governo revelar qual a condicionalidade associada ao contrato de reequilíbrio financeiro assinado em 2003 pelo Município de Setúbal, em particular no que diz respeito à fixação da taxa de IMI?».
Ao contrário do que fizeram agora com o acesso às Praias do Sado, os ilustres deputados mantiveram-se, desta vez, «mudos e calados» à espera da reposta, que, aliás, foi célere e entrou na Assembleia da República em 29 de Janeiro de 2014, assinada pela inspetora de finanças diretora Ana Paula Barata Salgueiro, com a “concordância” do Secretário de Estado do Orçamento, Hélder Reis.
Não é necessário ser jurista para perceber que a resposta do Ministério das Finanças apoia o entendimento que a CDU sempre teve da questão e que, infelizmente, continua a motivar a cobrança de taxas máximas de IMI no concelho. Aparentemente, ao contestar este entendimento, que é também o do Governo, os representantes locais do PSD e do CDS apelam a que se cometam ilegalidades, o que é, no mínimo, estranho.
Respondeu então o Ministério da Finanças, com o aval do Secretário de Estado do Orçamento, que o contrato de reequilíbrio financeiro da Câmara Municipal de Setúbal «foi celebrado ao abrigo do artigo 260 da Lei das Finanças Locais então em vigor (Lei nº 42/98, de 6 de agosto) e do artigo 570, nº 8 do diploma de Execução do Orçamento do Estado para 2003 (DL nº 54/2003, de 28 de março)». A inspetora que assina a resposta refere que «importa, contudo, ter presente que, à data, os municípios autorizados a celebrar este tipo de contratos tinham obrigatoriamente que incluir um conjunto de cláusulas nos referidos contratos que correspondiam às exigências constantes do DL nº 322/85, de 6 de agosto (na altura, por referência ao DL nº 98/84, de 29 de março), em particular ao disposto no seu artigo 8° (quantificação de objetivos, prazos de recuperação da situação financeira, instrumentos adequados, designadamente os de caráter financeiro, compromissos que ambas as partes assumiam no sentido da realização dos objetivos programados e, naturalmente, as garantias do cumprimento das cláusulas contratuais)».
Da legislação enquadradora dos contratos de reequilíbrio financeiro resultava «com clareza», continua a resposta do Ministério das Finanças, «que os municípios se comprometiam a atualizar obrigatoriamente algumas receitas próprias e a incluir, anualmente, essas alterações nos correspondentes documentos previsionais. É neste contexto particularmente exigente que devem ser analisadas as restrições impostas à atualização das receitas próprias, designadamente, a definição das taxas máximas sobre os impostos municipais, em particular o IMI e o IMT (sublinhado meu). Aliás, esta obrigatoriedade está expressamente consagrada no artigo 11° do DL nº 38/2008, de 7 de março (aprovado na sequência da entrada em vigor de nova Lei das Finanças Locais, Lei nº 2/2007, de 7 de março), que sucedeu ao já referido DL nº 322/85, de 6 de agosto».
A resposta enviada aos dois deputados do CDS-PP acrescenta que, «com maior ou menor detalhe, há que ter presente que a lógica subjacente à restauração dos municípios em situação de desequilíbrio, como o caso em apreço, assenta, necessariamente, em dois pressupostos essenciais, a maximização das receitas e a contenção das despesas (sublinhado meu). É à luz deste enquadramento normativo que foi definida a taxa de IMI aplicável pelo Município de Setúbal, no quadro do contrato de reequilíbrio financeiro, então celebrado, sendo certo que o acompanhamento subsequente do mesmo coube sempre ao “membro do Governo responsável pela área das autarquias locais”, conforme resulta expressamente da conjugação do artigo 160 do DL nº 38/2008, de 7 de março, conjugado com o artigo 220 do mesmo diploma, norma transitória que previa que “O regime jurídico previsto no presente decreto-lei em matéria de acompanhamento aplica-se aos municípios cujos planos de reequilíbrio financeiro tenham sido aprovados nos termos do DL nº 322/85, de 6 de agosto”».
Os ilustres deputados podem sempre argumentar que estas respostas são públicas, e é verdade, pois estão disponíveis na Internet AQUI e AQUI, mas a verdade é que a pergunta sobre as Praias do Sado tem exatamente as mesmas caraterísticas, mas essa foi profusamente divulgada.
Interessante seria ouvir agora o que têm a dizer os senhores deputados sobre a resposta do ministério das finanças. Certamente nada. Não dá jeito…
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