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O Raio Verde

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Uma onda de emoção percorre o Portugal dos pequeninos! Este ano, Paulo Portas, mestre das falácias televisivas, não tem lugar nos debates entre os líderes dos partidos e coligações concorrentes às eleições. Vão ficar os portugueses privados de assistirem, em formato compacto, aos malabarismos e aos números de ilusionismo do Paulo Portas. Ao tom confessional com que anuncia milagres! Ao tom teatralmente convincente com que vende tudo, da lavoura a frigoríficos a esquimós, da segurança social a ferraris a sem-abrigo, de novas oportunidades de negócio a apartamentos na lua, de promessas de pleno emprego a curto prazo a ilhas submersas! Está Portugal em risco de não assistir àquele número sempre repetido de Paulo Portas pontuar cada frase com olhar esdrúxulo de estão a ver como sou mesmo, mesmo esperto. Nem às suas grotescas indignações!

O CDS está em polvorosa! O seu grande líder, o seu líder condenado à pequena imortalidade do Portugal nosso remorso, que se treinou desde a creche para ter papel de primeiro plano na política nacional, de ser uma estrela de primeira grandeza no mundo dos espectáculos La Feria da política, vai ficar na sombra daquele canastrão com voz de barítono hesitante e sangue de barata. O CDS está atacado de delirium tremens com a hipótese do seu querido líder ter um eclipse parcial durante o período eleitoral. Ficar limitado a calcorrear feiras, a concorrer com a ciganada, a escovar escamas de peixe dos casacos de fino recorte, a comer entremeadas e beber vinho carrascão, a usar megafones, a distribuir panfletos para desfazer maus-olhados socialistas e fazer amarrações democrata-cristãs. Será notícia, será sempre notícia, os media sempre adoraram os seus tiques, o perfume das públicas virtudes vícios privados vaporizado pelos seus maneirismos, os seus bonés. Para completar a fotografia fica a faltar a sua aparição nos debates, o número do homem de estado que ele ensaiou até quase cair para o lado. Nem seria necessário tanto esforço em que tem as suas qualidades histriónicas. Paulo Portas leva muito a sério o seu destino de comediante das artes políticas. Está inquieto com as traças que ameaçam esburacar a lã com que tecia os tapetes que o levariam ao topo. A sentar-se triunfante no galo de barcelos, cantando estridentemente para o galinheiro o apreciar.

E agora Paulo? Com medo de perder deputados CDS, entalou-se! Aquelas sondagens que o Marco António anunciou com aquela pronúncia grosseira de político camiliano, fizeram mossa nas hostes democrata-cristãs. Fingiram que não existiam, embora sentissem a mordidela. Não evitaram o ataque de brotoeja que fez o Jaguar ganhar pó na garagem em vez de bem luzidio transportar o pequeno líder em grande estilo para os estúdios televisivos.

O desalento, a raiva pelo erro de cálculo. Número dois de bico calado! Não pode ser! Não pode ser! Não pode ser! A solução apareceu de onde menos se poderia esperar. O Raio Verde!!! A grande solução, o grande salto em frente, pela mão de um leitor tardio de Júlio Verne que andava perdido nos corredores do Largo do Caldas! Uma revelação maior que a do arcanjo Gabriel à Virgem. A Heloísa Apolónia de “Os Verdes” coligada com o PCP na CDU, também deve ter voz. É uma injustiça nunca ter participado nos debates eleitorais! O desespero tem estes lances democráticos. Para acalmar a euforia aparece Corregedor da Fonseca e a Intervenção Democrática. Não tem grupo parlamentar mas faz parte da coligação CDU! Faltava esta para empalidecer o raio verde!

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vigaristas,aldrabões e todos os outros ões

burro

Desta gente espera-se tudo! mesmo tudo! já nada nos devia espantar! A realidade ultrapassa sempre a ficção.

Ontem Paulo Portas, à boleia da crise grega, faz um discurso nas Jornadas parlamentares PSD/CDS digno de um vendedor da banha da cobra! Hoje ouve-se Passos Coelho tirar da cartola este coelho com mixomatose: “O discurso do medo era o trunfo do governo, os gregos destrunfaram esta maioria”

Nenhuma evidência trava esses vigaristas intelectuais, esses vendedores de vigésimos premiados que todos os dias vendem nos meios de comunicação social. Claro que o pano de fundo da comédia grotesca que essa gente caricata escreve, encena e representa, é o imenso fracasso das suas políticas austeritárias que nos empurram para o buraco grego. A transpiração de medo que a solução que for encontrada para crise grega, qualquer que seja, ainda que contra a vontade dos burocratas com sangue de barata instalados em Bruxelas, será a negação do que andaram a vender nos últimos quatro anos. O relatório do FMI, que  tentaram esconder, aponta nessa direcção. Mesmo que seja insatisfatória a solução, não deixará de haverá uma reestruturação da dívida e medidas para ultrapassar ima austeridade estúpida. Quem vende gato por lebre convencido que nunca será descoberto, continuará  a palavrear de mentirolas quase inocentes a gravosas e enormes mentiras. Há gente presa, há gente interdita por muito menos. A realidade é que haverá sempre gente que ainda compra a esses Oliveiras da Figueira (o homem que vendia frigorificos aos esquimós e sobretudos aoa congoleses) um automóvel em primeira mão. O pior é que é garantido que o carro não tem motor e a carroceria é de baquelite!
Oliveira da FigeiraMesmo o mais medíocre farsante, como são estes senhorecos, terá sempre espectadores, neste Portugal do Burro em Pé(*) . O Portugal visto tal e qual é. Uma sociedade desapiedada em que os pobres são abandonados, em que as crianças passam fome, em que os velhos são mesmo tratados como trapos. O Portugal de antanho que Passos Coelho  e Paulo Portas revisitaram e ressuscitaram.

Espera-se, deseja-se que a lucidez conquiste cada vez mais portugueses!

(*) Burro em Pé, José Cardoso Pires, publicado em Dezembro de 1979, pela Moraes Editores, ilustrada com pinturas de Júlio Pomar e capa de Sebastião Rodrigues.

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OXI

Não! Não, os gregos não querem morrer de pé!

Querem viver de pé!

OXI

Grande lição de dignidade e de democracia que a Grécia deu a uma Europa pantanosa que vende honra, dignidade e princípios na mesa do orçamento, na contagem dos euros!

Em que um país, a Alemanha, o maior incumpridor de dívidas no século XX, que tem dívidas por saldar a vários países que saqueou, destruiu e roubou, dá ordens a uma Europa Connosco submissa e sem vergonha!

No dia seguinte ao OXI, não vamos fazer grandes divagações políticas, registe-se a perplexidade e a estupidez contumaz dos mangas-de-alpaca europeus. A Grécia, o povo grego resistiu a todas as miseráveis chantagens, ao aperto do garrote que durante uma semana aumentaram exponencialmente.

As declarações que se ouvem, alguns de tão engulhados ainda nem sequer abriram a boca, desnudam a abjecção que os corrompe como um vírus. Entre todos ouça-se com desprezo as declarações do periquito e da pinguim reunidos de emergência em Paris, enquanto Varoufakis sai de cena de pé e pelo seu pé.

Por cá, muitos dos nossos comentadores alinham com aquele contabilista anão que debita números e inanidades (um tal José Gomes Ferreira, quando escrevo este nome fica à beira da maior náusea em memória desse enorme intelectual, escritor e poeta de cujo nome ele se apropria, devia ser proibido de o usar com tal propositada coincidência!) e os nossos governantes, primeiro-ministro e vice primeiro-ministro, na primeira linha, iguais a si-próprios e ao “seu” Portugal

Ó Portugal, se fosses só três sílabas,

 

linda vista para o mar,

 

Minho verde, Algarve de cal,

 

jerico rapando o espinhaço da terra,

 

surdo e miudinho,

 

moinho a braços com um vento

 

testarudo, mas embolado e, afinal, amigo,

 

se fosses só o sal, o sol, o sul,

 

o ladino pardal,

 

o manso boi coloquial,

 

a rechinante sardinha,

 

a desancada varina,

 

o plumitivo ladrilhado de lindos adjectivos,

 

a muda queixa amendoada

 

duns olhos pestanítidos,

 

se fosses só a cegarrega do estio, dos estilos,

 

o ferrugento cão asmático das praias,

 

o grilo engaiolado, a grila no lábio,

 

o calendário na parede, o emblema na lapela,

ó Portugal, se fosses só três sílabas

 

de plástico, que era mais barato!

 

                             Doceiras de Amarante, barristas de Barcelos,

 

rendeiras de Viana, toureiros da Golegã,

 

não há “papo-de-anjo” que seja o meu derriço,

 

galo que cante a cores na minha prateleira,

 

alvura arrendada para ó meu devaneio,

 

bandarilha que possa enfeitar-me o cachaço.

 

 

Portugal: questão que eu tenho comigo mesmo,

 

golpe até ao osso, fome sem entretém,

 

perdigueiro marrado e sem narizes, sem perdizes,

 

rocim engraxado,

 

feira cabisbaixa,

 

meu remorso,

 

meu remorso de todos nós…(*)

Não, basta! Não seremos feira cabisbaixa, nem Portugal será o nosso remorso!

Seremos tão gregos, quanto os gregos são portugueses!

(*) Ó Portugal se fosses só três sílabas, Alexandre O’Neil

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Cultura Gold

images Paulo Portas, com eleições à vista, tirou mais um coelho da cartola. Alargou a atribuição de vistos gold a quem invista na cultura. O mínimo 350 mil euros. Mais barato do que se fizer aquisições imobiliárias, 500 mil euros, ou transferir um milhão de euros, para uma conta sediada em Portugal,. A primeira e já sabida curiosidade, é o governo PPD/CDS, andar a captar capitais com essas ofertas, e preocupar-se pouco ou mesmo nada com os grandes capitalistas nacionais, useiros e vezeiros na fuga de capitais para paraísos fiscais, são centenas de milhões de euros por mês, informa o Banco de Portugal, ou em escapar aos impostos, localizando empresas em países que lhes concedem benefícios, alguns escandalosos como se veio a conhecer com o Luxemburgo Leaks, prática semelhante mas mais agressiva da que a praticada por outras paragens como a Holanda, país de acolhimento a belmiros e soares dos santos. A segunda curiosidade é essa gente vender-se barato. Oferecem um visto gold a troco de uns amendoins para a cultura. O Secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier, veio esclarecer que o montante de 350 mil euros é para criar “precisamente um incentivo adicional”. Acentuou que “o governo está empenhado em divulgar esta medida junto de potenciais investidores mostrando-lhes o que se faz cá se faz.” Dá o exemplo do que aconteceu nos EUA, no Kennedy Center onde, durante três semanas, estiveram “integrados na mostra cultural Iberian Suite mais de uma centena de criadores portugueses e lusófonos com os seus mais recentes trabalhos nas áreas do teatro, da dança, da música, das artes visuais, da literatura, da gastronomia” . A caldeirada das indústrias criativas. O enunciado dá para perceber o conteúdo de tanta criação, cócócóró. A luzidia comitiva era uma montanha russa assim porque não era assado. Lamenta Barreto Xavier “não termos projecção internacional enquanto potência de arte contemporânea significativa” e acrescenta com vergonha “por vezes temos uma ideia exagerada sobre nós próprios a esse respeito”. Mais umas banalidades a juntar às com que nos mimoseia cada vez que abre a boca. Deste governo que outro secretário de Estado se podia esperar? A concessão de vistos gold para a área da cultura está no mesmo nível de mediocridade. Depois de sucessivos anos de desinvestimento no sector da Cultura, até se atingir o estado comatoso actual, não serão os vistos gold que a vai reanimar. Atearão uns fogachos fátuos, iremos ver de que calibre. Os vistos gold serão apoios intermitentes e pontuais. Obviamente, até pela sua natureza, excluem-se de qualquer plano cultural, mesmo de curto prazo. Em nada contribuirão para uma política cultural, mesmo a não política do actual governo. Serão dirigidos com a vista curta de obter rapidamente benefício. Isso vai favorecer quem já tem nome, a mais das vezes não por valor real mas por bem dirigidas operações de marketing. Será mais fácil comprar uns tricotados ou umas panelas à Joana Vasconcelos, lá estará o olho vivo da Everything is News para não deixar escapar a oportunidade, do que apoiar um projecto de João Limpinho, apesar do saber, da seriedade artística, da qualidade estética demonstrada nas esculturas que integram o Museu está na Rua, no Bairro da Bela Vista em Setúbal. Será mais fácil encomendar um espectáculo musical a Rodrigo Leão do que uma obra a António Pinho Vargas, apesar do abismo artístico e estético que os separa. Outros exemplos poderiam ser enumerados. Apesar desse quadro, sempre se poderia ter colocado a fasquia mais alto e com outro fundamento. Dirigi-los para um sector específico, o do património construído, muito em avançado estado de degradação, exemplo próximo o Conservatório Nacional, e não deixar os investimentos serem feitos quase a vontade do freguês. Sem normas, o melhor, mais de acordo com o seu gabarito, será Barreto Xavier montar uma banca de venda de produtos culturais na Feira de Carcavelos, especializada em vistos gold. O Paulinho, frequentador habitual desses eventos, lá o iria visitar para ver como corre o negócio e degustar um menu de farturas pós-modernas. Lugar para diálogos pouco confidenciais: “O senhor vice primeiro-ministro engraxa? Não, hoje engraxo nas Necessidades!” Esta gente vende-se barato e sem critério.

(publicado no jornal Avante! em 16/4/2015)

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A CHOLDRA

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Esta gente não tem vergonha alguma! Do primeiro-ministro ao mais ignoto membro de algum gabinete, este governo é a ralé em movimento! Mentem sem uma ruga. Tripudiam a realidade e a verdade sem uma hesitação.

Agora, na ordem do dia, as listas de contribuintes VIP que, com o desplante dos grandes vigaristas, afirmavam não existir. Quando se prova que existem, que começaram a ser pensadas e organizadas com as trapalhadas da Tecnoforma, onde Passos Coelho era o rapaz das gazuas que abria portas por onde entravam sacos de dinheiro a troco de umas cambalhotas instrutivas, abrem as bocas do espanto pela denúncia da tramóia. Vale tudo para proteger a cambada de mais sobressaltos. Sem escrúpulos de qualquer espécie, utilizam a máquina administrativa do Estado em proveito próprio. Para se esconderem, para ocultarem as nuvens de nódoas que desabam permanentemente sobre eles.

Cobardemente, para se safarem, quando as suas canalhices ficam expostas na praça pública, atiram pedras à administração pública, lincham os seus funcionários na primeira curva. Fogem a assumir quaisquer responsabilidades políticas por mais evidentes que sejam.

Um governo que ataca em matilha, como hienas fedorentas, o Estado é o mesmo governo que mais o instrumentaliza em proveito próprio e dos seus mandantes. Um governo que, desde o primeiro dia se entrega à destruição do Estado, que deliberadamente desestabiliza e desorganiza a máquina administrativa do poder central e do poder local, que desdenha e avilta os funcionários públicos, é o mesmo governo que a eles recorre para se desculpabilizar, assacando-lhes culpas próprias.

Da dupla Passos Coelho-Paulo Portas ao mais ignoto dos seus sequazes que navegam pelos gabinetes governamentais, é tudo uma maralha sem honra nem dignidade, acoitados na falta de honra e dignidade do Presidente da República, que atira com displicência para o caixote de lixo as exigências de demissão desse bando de trafulhas políticos.

Neste pântano, não há flores. Só ratazanas que nos assaltam a vida.

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Libido 4

Depois do acordo de princípio, alinhavado entre o governo grego e a CEE, das múltiplas declarações entre os protagonistas e o que os nossos (des) governantes foram comentando em desbragada linguagem, recomendamos um fim-de-semana alucinante à espera dos próximos capítulos desse teatro escabroso em que se procura esfolar a democracia.

WOLFANG E MARIA LUIS

“Campo de Concentração Austeridade”, “Loucos por Coligações ou São Bento e os 120 Dias de Sodoma”, ”Portugueses mais um esforço para continuarem a ser Esmifrados” e ”Contos para Adultos dos Tarados das Reformas Estruturais”, quatro filmes para maiores de dezoito anos, recomendados para um fim-de-semana acabrunhante, à espera da lista grega a ser entregue em Bruxelas.

Os dois primeiros são protagonizados por Maria Luís Albuquerque e Wolfang Schaulbe e Pedro Passos Coelho e Paulo Portas, duas das duplas mais famosas no mundo da pornografia financeira, do cinismo político e da crueldade social. Os dois últimos são grandes orgias, celebrando os infortúnios da austeridade com os quatro protagonistas e narração de Cavaco mergulhado no fundo do Poço de Boliqueime, Opções adicionais discursos, entrevistas, declarações dos protagonistas, não recomendadas por questões de higiene mental.Coelho POrtas

Aviso muito importante: os filmes contém cenas sadomasoquistas que podem ferir a mais empedernida sensibilidade, mesmo dos mais experimentados.

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A Grécia, a CEE os seus mandantes, seus mandaretes e monicas lewinskis

A ESPERA DOS BÁRBAROS

— Que esperamos na ágora congregados?

 

Os bárbaros hão-de chegar hoje.

Porquê tanta inactividade no Senado?

Porque estão lé os Senadores e não legislam?

 

Porque os bárbaros chegarão hoje.

Que leis irão fazer já os Senadores?

Os bárbaros quando vierem legislarão.

 

Porque se levantou tão cedo o nosso imperador,

e está sentado à maior porta da cidade

no seu trono, solene, de coroa?

 

Porque os bárbaros chegarão hoje.

E o imperador espera para receber

o seu chefe. Até preparou

para lhe dar um pergaminho. Aí

escreveu-lhe muitos títulos e nomes.

 

— Porque os nossos dois cônsules e os pretores

saíram hoje com as suas togas vermelhas, as bordadas

 

porque levaram pulseiras com tantas ametistas,

e anéis com esmeraldas esplêndidas, brilhantes;

porque terão pegado hoje em báculos preciosos

com pratas e adornos de ouro extraordinariamente cinzelados?

 

Porque os bárbaros chegarão hoje;

e tais coisas deslumbram os bárbaros.

 

– E porque não vêm os valiosos oradores como sempre

para fazerem os seus discursos, dizerem das suas coisas?

 

Porque os bárbaros chegarão hoje;

e eles aborrecem-se com eloquências e orações políticas.

 

– Porque terá começado de repente este desassossego

e confusão. (Como se tornaram sérios os rostos.)

Porque se esvaziam rapidamente as ruas e as praças,

e todos regressam as suas casas muito pensativos?

 

Porque anoiteceu e os bárbaros não vieram.

E chegaram alguns das fronteiras,

e disseram que já não há bárbaros.

 

E agora que vai ser de nós sem bárbaros.

Esta gente era alguma solução.

                                                               Konstandinos Kavafis

(tradução Joaquim Manuel Magalhães/Nikos Pratsinis)

ovelhas

 

Os cônsules, pretores que entre dois partidos sozinhos ou coligados, se sucediam na Grécia, impondo ao povo grego as soluções dos bárbaros foram democraticamente derrotados. As iníquas reformas estruturais, um saco de mentirolas que nada reestrutura e tudo destrói,  que garrotavam a economia, aumentavam a dívida, mantinham os privilégios da oligarquia, aprofundavam  a corrupção, atiravam cada vez mais gregos para a miséria e o desemprego, foram democraticamente derrotadas. Quem venceu pelo voto, propõe outro caminho para sair da crise, caminho dentro do quadro político, económico e social dos bárbaros. Nem isso os bárbaros aceitam. Inquietam-se porque não querem que seja sequer possível pensar que há outras saídas para a crise económica dos países que se debatem com dívidas que são impagáveis, consequência da crise mais geral da Europa tatuada no sistema que se arrasta agónico mas que se julga eterno, sem alternativas.

Governantes e seus sequazes querem ditar, impor as suas leis sobre os países devastados por uma estúpida cegueira que alimenta os oligopólios financeiros, promove uma crescente desigualdade social, instala um desastre económico e social de proporções inquietantes. Mentem manipulando as estatísticas para travestir o desastre. Mentem. mentindo sempre e, sem pudor,  fazem circular a mentira por uma comunicação social mercenária ao seu serviço.

Na CEE, os países que se sujeitaram às receitas das troikas, viram as suas dívidas em relação ao PIB aumentar exponencialmente entre 2007 e 2014. Irlanda 172%, Grécia 103%, Portugal 100%, Espanha 92%. A dívida mundial que em 2007 era de 57 biliões de dólares, em 2010 foi de 200 biliões de dólares, ultrapassando em muito o crescimento económico. Tendência que continua o seu caminho para o abismo, em benefício dos grandes grupos financeiros, entrincheirados nos chamados mercados. O chamado serviço da dívida, os juros, são incomportáveis. São esses os êxitos de uma política cega submetida à ganância usuária que não tem fronteiras ou qualquer ética.

Os governos deixaram de estar ao serviço dos seus povos, nem estão sequer dos seus eleitores. São correias de transmissão dos oligopólios financeiros que se subtraem a qualquer escrutínio democrático ou outro de qualquer tipo. Traçam um quadro legal que os suporta e legitima a ilegitimidade. A democracia é uma chatice, um entrave, um pauzinho nessa gigantesca engrenagem que nos atira barranco abaixo, com efeitos devastadores para a humanidade. Nada interessa a não ser o lucro de quem especula sem produzir nada. As pessoas são uma roda nessa engrenagem.

chaplin

Charlie Chaplin, TEMPOS MODERNOS

Quem não caminha ordeiramente nesse rebanho, quem se opõe, mesmo que mandatado e sufragado democraticamente, é considerado irresponsável, como disse o ogre Wolfang Schauble, ministro da economia da Alemanha, em relação à Grécia. As suas enormidades ecoam pela boca dos seus bufões, das suas monicas lewinskis por todos os cantos de uma Europa submissa aos diktats do bando de arruaceiros financeiros que rouba a tripa forra países e povos. Em Portugal, as nossas monicas lewinskis são mais fatelas, mais rascas com se tem visto e ouvido de Cavaco a Passos Coelho, de Portas a Pires de Lima mais a matilha dos seus sarnentos rafeiros de fila. Espumam raiva, ódio dos ecrãs televisivos às ondas radiofónicas. Quem se atreve a riscar, ainda que levemente, essa realidade em que nos enforcam é logo atacado e silenciado quanto baste por essa matilha de pensamento ulcerado.

Os burocratas europeus dogmáticos, leitores e intérpretes da cartilha neoliberal dizem que a realidade é assim mesmo! Será?

A realidade nunca é a realidade que nos querem impingir como Aragon tão bem descreveu. Há mais vida para lá desse biombo com que a querem esconder qualquer luz, mesmo bruxuleante, de esperança para a humanidade.

ISTO È UMA OVELHA,escultura de João Limpinho

 

AS REALIDADES

Era uma vez uma realidade

com as suas ovelhas de lã real

a filha do rei passou por ali

e as ovelhas baliam que linda ai que linda está

a re a re a realidade

Era uma vez noite de breu

e uma realidade que sofria de insónia

então chegava a fada madrinha

e placidamente levava-a pela mão

a re a re a realidade

No trono estava uma vez

um velho rei que muito se aborrecia

e pela noite perdia o seu manto

e por rainha puseram-lhe ao lado

a re a re a realidade

 

CODA: dade dade a reali

dade dade a realidade

A real a real

idade idade dá a reali

ali

a re a realidade

era uma vez a REALIDADE.

Aragon

(tradução António Cabrita)

ceci nést pas une pipe

pintura de Magritte

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Pastel de Nata a Cavalo

Pastel de nata

cavaloEm Portugal, as armas e os barões assinalados de uma maioria, um governo, um presidente, o alfa do pensamento politicamente esquálido de Sá Carneiro, deixam registos a assinalar nestes últimos anos.

Um Presidente especialista em raspadinhas premiadas do BPN. Um Primeiro-Ministro que, segundo o seu último empregador, era um entendido em gazuas ”que abria todas as portas” Um Vice-Primeiro Ministro perito em submarinos e feiras e aparecer dedo no ar por tudo e por nada. Uma Ministra das Finanças que hoje diz uma coisa e amanhã outra e é mestre em falhar todos os objectivos ,pelo que os seus melhores orçamentos são os rectificativos. Um moedeiro falso que corta a eito na investigação e vai para a Europa dizer o que nunca disse nem fez para garantir o tacho. Um Ministro da Educação que lança o caos no ensino básico e secundário , sorri satisfeito por lhe cortarem 700 milhões no orçamento do ensino superior e na ciência. Uma Ministra da Justiça que implementa o caos com a reforma judicial. Um Ministro do Ambiente que impõe uma taxa sobre os sacos de plástico e os sujeita ao IVA e inventa um imposto sobre o carbono que vai provocar um aumento generalizado sobre os bens essenciais. Um todo poderoso ex-ministro da Presidência e dos Assuntos Parlamentares, profissional em licenciaturas turbo. Um Governo finge não saber que a austeridade é o maior inimigo da natalidade e para a incentivar aumenta a discriminação social com um cociente de 0.3/filho no IRS, que beneficia tanto de um presidente de um conselho de administração que ganha 4,2 milhões de euros/ano, como a um casal com o ordenado mínimo, porque os filhos dos ricos não são iguais aos filhos dos pobres. Da chamada sociedade civil exemplos também abundam. Há um banqueiro que cinco dias antes de o seu banco declarar falência apresentou com pompa e circunstância o livro de sua autoria Testemunho de Um Banqueiro. A história de quem venceu nos mercados”. Um outro recebeu a distinção de doutor honoris causa para nos depois se descobrir o enorme buraco do seu banco que era, diziam, um dos pilares da economia e da finança nacional. Esses dois sucessos tiveram lugar no ISEG pela mão de João Duque que o dirigia e é membro destacado do think-tank nacional que continua a ser reverentemente escutado nos media..

Etc, etc, etc. A lista poderia continuar, ser quase interminável, se não tivesse acontecido nos últimos dias uma iluminação quase divina que nos deixa alumbrados.

O anterior Ministro da Economia tinha descoberto e empunhado a alavanca mestra para aumentar as exportações: o pastel de nata.. Anos passados a por canela nos pasteis de nata sem se verem resultados palpáveis eis que o Presidente da República se chega à frente, dá um valioso e definitivo contributo:“o hipismo é uma área chave para o desenvolvimento da economia nacional”É a grande revelação que banaliza mesmo as da Senhora de Fátima aos pastorinhos. O grande desígnio nacional está encontrado: O Pastel de Nata a Cavalo

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Comédias de São Bento!

arlequins

Em princípio, se tudo correr bem, as escolas começarão o ano escolar normalmente com mais de um mês de atraso! Se no fim tudo continuar a correr mal, mal vai correr para os professores colocados que não ficam colocados porque o ministro com uma lata infame desmente-se dando o dito, na AR aos deputados, jornalistas e assistentes, por não dito, o ano escolar começará normalmente não se sabe é quando. Para o governo, para o ministro, para o ministério nada de grave se passa porque a normalidade acontecerá, só não se sabe quando.

Parece que há uma comarca nos Açores onde o Citius já funciona em pleno. No resto do país, mais de um mês desde o fim das férias judiciais, de viagens diárias de centenas de quilómetros percorridos por muitos funcionários judiciais em busca do seu novo posto de trabalho, de tribunais em obras, de tribunais atascados pelos processos oriundos de tribunais fechados, de arrumos e desarrumos e do Citius continuar em estado comatoso, a Justiça e os tribunais irão um dia encontrar a normalidade da reforma judicial, só não se sabe quando.

A ministra das finanças, com a mesma convicção com que afirmou que o caso BES não custaria um cêntimo aos contribuintes, agora diz que o caso BES afinal vai entrar nos bolsos de todos nós. A facilidade com que mentem e se desmentem os governantes, os deputados das bancadas da maioria que suporta o governo, os seus comentadores de serviço, torna-se pegajosa. Já nenhum deles se se consegue livrar desse vírus que torna os cérebros dessa gente esponjosos. Papel mata borrão das maiores abominações.

Após três anos a sermos esfolados vivos, olhamos atónitos para o wrestling verbal entre o primeiro-ministro, o vice-primeiro-ministro, a ministra das finanças, as claques governativas, todos de olhos em bico fixados no calendário eleitoral a prometerem e a descomprometerem-se com uma baixa de impostos, se. Se em principio e se tudo correr bem. Os resultados da esfola, apesar dos sucessivos bailes de máscaras das estatísticas, não têm corrido bem. O grande objectivo sempre trombeteado da redução do défice falhou sempre desaforadamente. Este ano falhará por quase 1%. Eles dizem que não haverá mais austeridade. Vão reduzir o IRS que nos estrangula! Mais à frente percebe-se que, mais uma vez, nos mentem! Não será o IRS mas uma ligeira redução da sobretaxa de 3,5% sobre o IRS. O IRS vai continuar a estrangular-nos
!

Cortarão pouco, muito poucochinho na sobretaxa, se as coisas correrem bem. Se o aumento da despesa com os transportes públicos e o BPN, que continua uma sangria desatada, não for considerado para o défice.  Isto antes de se conhecer quanto é que de facto vai custar a todos nós a implosão do BES, que ainda tem um banqueiro no activo que, apesar de se saber que recebeu comissões submarinas, continua a dar beijos públicos ao primeiro-ministro. Tudo boa gente. Tudo farinha bichosa do mesmo saco.

Quanto é que estas comédias nos vão custar? Qual o preço de tantas mentiras? Quando se destapar a tampa da sanita onde essa gente habita, quanto vai ser a factura que vamos pagar para arejar o país e despoluir o ar?

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CDS, Geral, Passos Coelho, paulo Portas, PSD

A Porta de Duchamp e Passos Coelho

Porta de Duchamp
Quando vivia em Paris, no pequeno apartamento da rua Larrey, Duchamp fez instalar dentro de casa uma porta que não podia estar aberta nem fechada porque estava sempre aberta e fechada ao mesmo tempo.

A resposta que Passos Coelho deu ontem na Assembleia da República, após recuperar a memória compulsando documentos, abre a porta de Duchamp.

Diz ter recebido pagamentos de despesas de representação que fez a trabalhar para a Tecnoforma ou para a ONG que essa empresa inventou e usava para captar a dois bolsos dinheiros da CEE, com formações sem utilidade visível a não ser sacar dinheiros comunitários como muito boa gente, com o mesmo ou equivalentes expedientes, o fez. Lembremos que, paralelamente, a Bolsa de Lisboa viveu, não por acaso, um dos seus períodos mais eufóricos.

Se Passos Coelho não recebeu honorários mas despesas de representação, que a lei não obriga, não obrigava, a declarar se forem consideradas no exercício de actividade profissional, o primeiro-ministro está a fechar a porta de Duchamp que inevitavelmente abre para a aldrabice que fez quando, ao deixar de ser deputado, pediu subsídio de reintegração por ter exercido o cargo em regime de exclusividade. Sublinhe-se que nunca pediu a exclusividade por uma xico espertice rasteira, para receber o suplemento que lhe era atribuído por ser vice-presidente da bancada do PSD.

Numa entrevista o presidente da Tecnoforma, foi muito claro. Passos Coelho era um facilitador. Calcula-se de que facilitação se tratava. Andar pelos corredores do governo a bater às portas. Principalmente à porta do seu amigo, então Secretário de Estado, Miguel Relvas. Passos Coelho era uma gazua das portas dos gabinetes do governo. O que nada abona ao seu currículo.

Claro que é relevante saber se almoçou por 100 euros ou por cinco mil euros. Se de facto, ao longo de três anos, recebeu 150 mil euros, qualquer coisa como um ordenado mínimo actualizado a cada três dias, de despesas com almoços e viagens o que não são gastos de uma pessoa remediada,

As reacções das bancadas que apoiam o governo ao strip-tease incompleto e mal executado por Passos Coelho na AR foram lindas de se ver. Com a lágrima ao canto do olho a aplaudir o quase mendicante primeiro ministro, querido líder que andou uma semana a correr e a uivar atrás do rabo, em grande sofrimento até conseguir reavivar a sua selectiva memória que continua a não se lembrar de quanto embolsou em viagens e comezainas.

Também foi comovente ouvir Paulo Portas a reiterar a confiança na palavra de Passos Coelho. Um Paulo Portas convertido irrevogavelmente à sobrevivência, abjurando a pés juntos o P. Portas do Independente, aos saltos sobre o seu túmulo, renegando-o três vezes por trinta dinheiros.

Tanguismos e trafulhices à portuguesa, que condenam sisificamente Passos Coelho a ficar encerrado numa sala equipada com a Porta de Duchamp. Nunca sairá de lá.

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Cultura, Geral, Literatura

E Não se Pode Exterminá-los

Deveria já ter colocado um “post” sobre o Prémio de Romance e Novela da APE 2014. Não o fiz  contra o impulso de publicar imediatamente o discurso de Alexandra Lucas Coelho na entrega do prémio. Um belo discurso que naturalmente deveria eriçar os representantes do governo e do Presidente da República. Adiei, por obliquamente, ter tido conhecimento da javardice da intervenção de Barreto Xavier, outra coisa não seria de esperar em que chafurda na pocilga da governação, do mal amanhado silêncio de Diogo Pires Aurélio que representava aquela coisa agrafada ao cadeiral da Presidência da República pelos votos dos portugueses os mesmos que votaram a favor do chiqueiro comandada por Passos e Portas. Pois é, a democracia alberga, muitas vezes premeia, gentalha espúria, acanalhada, vendedora de vigésimos premiados para sacar votos. Adiante.
Publico agora o discurso de Alexandra Lucas Coelho, com uma discordância de fundo. O seu romance que prefiro é E a Noite Roda, ainda não li Vai Brasil. Prefiro-o emparelhado com os outros romances de língua portuguesa ou traduzidos, publicados nos últimos dois anos. Está entre os que continuam a olhar-me nas mesas por onde andam, espalhados pela casa, sem estarem perdidos. Sobre ele  farei breve nota como as que tenho feito para o Guia de Eventos de Setúbal a chamar a atenção de eventuais leitores para os romances de que gosto. Submetendo-os ao meu gosto, evidentemente. Já estava entre os próximos selecionados ganhasse ou não ganhasse o prémio da APE.

Voltando ao assunto. Publico agora para anteceder o discurso pelo relato que a Alexandra Lucas Coelho faz das cenas miseráveis da cerimónia. Mais uma foto radiografia da gentalha que nos governa. O título do “post” é recuperado ao Karl Valentin (lembram-se? na Cornucópia?) é o que me apeteceria dizer dia a dia, hora a hora, minuto a minuto se não ouvisse aquele belo verso do meu amigo Manuel Gusmão que a Alexandra Lucas Coelho refere: “apesar de todas as evidências, a alegria”. Sim, a alegria que nos faz viver vivendo dos poemas do Manuel Gusmão e do Herberto Helder, dos romances da Alexandra Lucas Coelho e do João Paulo Borges Coelho, das músicas do Pinho Vargas e do Nuno Corte-Real, dos filmes do Miguel Gomes e do João Botelho, do teatro do Jorge Silva Melo e do Marco Martins, depois  de ouvir, nestas últimas semanas, a Messe de Notre Dame pelos Graindelavoix, na Igreja de São Roque, o Rameau de Os Músicos do Tejo nos Dias da Música, o Das Lied van der Erde, que estou a ouvir enquanto escrevo. cantado pela Christa Ludwig e o Fritz Wunderlich, dirigido pelo Klemperer. Mas tudo isto não apaga as evidências, antes pelo contrário mais as sublinha e acentua o fedor em contraste com os perfumes coloridos de Lisboa.

 

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Descrição da Alexandra Lucas Coelho sobre o que se passou depois do seu discurso na Gulbenkian quando lhe atribuíram o prémio da APE

Não há gravações do que se passou durante a entrega do Grande Prémio de Romance e Novela da APE, na sala 2 da Fundação Gulbenkian, a 7 de Abril. Havia jornalistas presentes mas não em trabalho, a tomar notas. Por isso não há forma de citar “ipsis verbis” o que disse o Secretário de Estado da Cultura (SEC), Jorge Barreto Xavier. Mas há algumas dezenas de testemunhas que podem acrescentar ou corrigir o que vou tentar resumir agora aqui, por tudo se ter passado numa cerimónia pública.

Sendo este prémio tradicionalmente entregue pelo Presidente da República, decidiu o actual presidente, Cavaco Silva, à semelhança de anos anteriores, fazer-se representar. Neste caso, pelo seu Consultor para Assuntos Culturais, Diogo Pires Aurélio. Isto era o que eu sabia quando escrevi o discurso para a ocasião. Já no átrio da Gulbenkian, perto da hora marcada, 18h, a APE comunicou-me que a cerimónia estava um pouco atrasada porque esperavam o Secretário de Estado da Cultura.

Quando Barreto Xavier chegou e entrámos todos para a sala, o protocolo sentou-o ao centro da mesa, junto a Diogo Pires Aurélio. Nas pontas, Gulbenkian (representada por Rui Vieira Nery), APE (José Manuel Mendes, José Correia Tavares), júri (representado por Isabel Cristina Rodrigues) e eu. Vieira Nery abriu, sucintamente; seguiram-se discursos da APE; Isabel Cristina Rodrigues leu o texto em que o júri justifica a atribuição do prémio a “E a Noite Roda”. Diogo Pires Aurélio e eu levantámo-nos para que ele me entregasse o sobrescrito do prémio, um minuto de formalidade, sem palavras, para a fotografia. Chegou a minha vez de discursar, li as páginas que trazia. No fim, houve uma ovação de pé. Digo isto para dar conta da atmosfera que os representantes do poder político tinham diante de si.

A APE convidou então o SEC a intervir. Ele escolheu falar sentado, sem se deslocar ao púlpito. Uma das coisas que disse, na parte, digamos, cultural da intervenção, foi que eu bem podia declarar que não fazia ficção porque claro que fazia ficção porque é isso que um escritor faz, ficção. Foi o primeiro arroubo dirigista, que nos devia ter preparado para o que aí vinha.

Na parte, digamos, política, destaco quatro coisas: o SEC disse que eu devia estar grata por estarmos em democracia e eu poder dizer o que dissera; que durante anos os portugueses se tinham endividado acima das suas possibilidades; que, ao contrário do que eu dissera, ninguém saíra de Portugal por incentivo deste governo; e, sobretudo, que eu tinha dito que não devia nada a este governo mas que isso não era verdade porque este governo também subsidiava o prémio.

Referia-se ele, assim, a um prémio com décadas de existência; atribuído a alguns dos mais extraordinários escritores de língua portuguesa; cujo montante em dinheiro resulta de vários patrocínios, sendo que os públicos resultam do dinheiro dos contribuintes; e que tem atravessado os mais variados governos, sem que nunca, que me recorde, algum governante o tenha tentado instrumentalizar. Foi a mais escancarada confusão de Estado com Governo que já presenciei, para além do tom chantagista ao nível de jardim de infância das ditaduras. E, apesar dos apupos, de quem lhe gritava da plateia “Mentira!” e “O Estado somos nós!”, o SEC insistia.

Como cabe ao Presidente da República, ou seu representante, encerrar a cerimónia, a APE instou Diogo Pires Aurélio a falar. O representante do Presidente da República declinou e encerrou a sessão. No fim, cumprimentou cordatamente todos os presentes na mesa e retirou-se.

Já Barreto Xavier, aproximou-se de mim na confusão da retirada. Julguei que se vinha despedir, depois de dizer o que tinha a dizer. Nada disso. Queria dizer-me, visivelmente irritado, que o que eu fizera tinha sido de um grande “primarismo”. Respondi-lhe que então devia ter dito isso mesmo ao microfone, que eu já dissera o que tinha a dizer e não lhe ia dizer mais nada. Fui andando, para contornar a mesa e acabar com a cena, mas o SEC insistia: que eu tinha sido “primária”.

O “Público” pediu-me o discurso para publicar online na tarde do dia 8. Quatro horas depois, 89 mil pessoas tinham lido o texto. Ontem, o post no FB do “Público” tinha sido visto por 170 mil. Obrigada a todos pela partilha. Continuar a ler

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Política

Quase no epílogo…

PassosCoelho2012Carnaval02As coisas tinham até começado com um sinal de esperança – o “irrevogável” pedido de demissão de Paulo Portas prenunciava um novo ciclo político. Mas após uma semana e chegados ao epílogo desta novela trágico-cómica, conclui-se que o mais relevante será Portas e o seu partido (11,7% nas últimas Legislativas) se terem guindado, ao que se sabe, às mais altas responsabilidades no Governo.

No princípio da crise, iniciada com a demissão de Vítor Gaspar e a indicação da sua discípula Maria Luís Albuquerque para o Ministério das Finanças, parecia até genuína a intenção do líder do CDS – provocar o derrube do Governo. Como é que, demitindo-se o chefe de um dos partidos da coligação, o Presidente “aguentaria” o Governo? E mais se viesse a ser votada no Parlamento uma moção de censura ou recusado um voto de confiança?

As reacções dos mercados financeiros, com os aumentos imediatos nos juros exigidos aos títulos da divida soberana e a queda dos valores dos títulos na Bolsa de Lisboa, criaram um clima emocional e político que ofuscou a evidência – o Governo PSD-CDS caía devido ao completo e total falhanço de tudo aquilo a que se propusera, destruído pelas suas contradições internas. Para Paulo Portas o momento era o adequado para sair de cena, assim julgando poder controlar os danos de dois anos de governação. Limitava-se assim a assinar o que julgava(mos) ser a certidão de óbito da coligação!

O estado de protectorado sob o qual o país se encontra impediu o que seria a saída mais saudável para a crise – a demissão do Governo e a convocação de eleições.

Abertas as hostilidades P. Coelho rapidamente se deslocou ao encontro dos chefes europeus, onde avultou o mediático e simbólico encontro com A. Merkel na escadaria da Chancelaria em Berlim. Por esses dias o inefável Schauble, com a ajuda do também inefável Barroso e de outros figurões de primeiro plano do Directório, rapidamente deixaram claro por que baias se poderia conduzir a política portuguesa – manter a coligação da Direita no poder, evitando o recurso a eleições!

Com Portugal assistiu-se à mesma intrusão na soberania nacional que já havíamos visto em Itália com a imposição de M. Monti, ou na Grécia com a recusa do referendo proposto pelo então primeiro-ministro G. Papandreou.

Com Portas reconduzido ao redil, a direita portuguesa teve que voltar a dar uma de bom aluno. Isto é, “fazendo das tripas coração”, segurar as pontas e congelar por mais algum tempo o cadáver político que é a coligação e o Governo.

Com a decisão já tomada pelo Directório europeu, Cavaco Silva entreteve-se emtransferir rodriguinhos ouvindo partidos e parceiros sociais e, como sempre, nada dizendo ao país. Já todos sabemos que não é ele quem toma a decisão!

O remendo da coligação é uma manobra de puro tacticismo. Faz com que a partir de agora Portas e o CDS deixem de poder fazer um discurso dúplice. O que custa ao maior partido da coligação, o PSD, entregar ao seu aliado algumas das principais pastas e assuntos: a coordenação económica, as relações com a troika e “reforma do Estado” – a confirmar-se o que foi tornado público. P. Coelho aligeira assim as suas responsabilidades, preparando-se para arrastar consigo os seus amigos do CDS se o barco se afundar.

O que ganhou o país com esta crise ditada a partir do interior do Governo?

O prometido e a que tudo se sacrificou acesso aos mercados financeiros tornou-se mais difícil e distante. Ficou mais próxima a perspectiva de um segundo resgate, agora “brando” nas palavras do jornal espanhol El País”. Para enfrentar tamanho desafio o Governo que agora se apresta a iniciar funções apresenta-se minado pela desconfiança acumulada entre os seus principais actores e desgastado perante o público.

A economia determinará o êxito ou o fracasso deste novo-velho governo. O emprego, o investimento, o rendimento disponível dos cidadãos, a reposição da confiança. Isto é, a inversão do longo ciclo de recessão que as políticas de quem queria “ir além da troika” conduziram o país. Perante isto as explicações que P. Portas terá que dar, mais cedo ou mais tarde, são quase irrelevantes!

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Política

Agarrem-me que eu vou-me a eles!

O CDS de Paulo Portas faz lembrar o valentão da taberna que se arma sempre ao pingarelho, mas é só língua.

Ameaça, mas não bate. Insinua, mas não prova. Diz que faz, mas não faz. 

Afinal, tudo o que conta para Portas, como sempre, não são os reformados e os feirantes, os contribuintes de que diz ser o líder, nem sequer os pobrezinhos ou a classe média de que se arroga ser defensor. Nem sequer são os “supremos interesses” do país que interessam ao grande líder.

Tudo se resume a meros cálculos  eleitorais de sobrevivência partidária para que, nas próximas eleições, mais tarde ou mais cedo, possa continuar a enganar os incautos. Mesmo depois de ter sido ativo, e não passivo, organizador do saque feito aos portugueses pelo governo de que é ministro.

Portas, além do valentão de taberna que se segura no vizinho do lado e grita a plenos pulmões “agarrem-me que eu vou-me a eles”, faz também lembrar uma história de caserna sobre o papel daqueles que participam, mas não entram. Só que o CDS participou e entrou fundo neste último ano e meio de  saque fiscal e salarial aos trabalhadores portugueses, permitiu e incentivou o roubo de que os funcionários públicos estão a ser alvo, mas quer agora sair, impoluto, da mais valente vigarice em que os portugueses foram apanhados nas últimas décadas.

Ler as notícias sobre o que o CDS pensa do orçamento de estado para 2013 já nem sequer é motivo de espanto, apenas motivo de nojo, de asco profundo que cresce de dia para dia.

No fundo, o CDS está cada vez mais parecido consigo mesmo: nunca mais se assume, e quer continuar a enganar tudo e todos.

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Geral, Política

Procissão de Cegos

Parábola dos Cegos, Pieter Brueghel, o Velho
um cego conduz uma caravana de cegos

Um governo em fuga. De cobardolas que metem os pés pelas mãos na Assembleia da República ao serem confrontados com moções de censura que despem as tarouquices do seu argumentário. Que fogem a sete pés do povo, mesmo do povo que o elegeu. Povo que assiste ao aviltamento de um primeiro-ministro a correr para o avião para desembarcar numa qualquer reunião insignificante para, por poltronaria, abandonar a comemoração da implantação da República, mesmo quando, pela primeira vez em cem anos, foi celebrada quase à porta fechada. Com todos os ministros a escolherem portas esconsas para entrar e sair, procurando escapar-se sem ser percebidos.

Um governo de pantomineiros que cada vez que aperta um furo do cinto dos portugueses, para a maioria já não existem mais furos, promete que é a última vez para poucos meses decorridos arremedarem a mesma conversa em que já ninguém acredita.

Um governo de ineptos incompetentes que se escondem uns atrás dos outros. Isto não é um governo é uma barraca de feira onde os ministros aparecem e desaparecem, tentando fugir a ficar no retrato do descalabro da governação e às bolas que o povo lhes atira sempre que tiram a cabeça de fora. A desorientação é de tal jaez que já recorrem a números de ventriloquismo, em que o Borges é o principal e prazeroso boneco de serviço. Teatradas de títeres que, com argumentos cavilosos, vão tramando o país.

Espectáculo nauseante e fedorento o desta procissão de pseudo tecnocratas cegos por uma ciência de numerologias tóxicas que matam e esfolam os direitos sociais, económicos e políticos, que espalham a desgraça por todo o país clamando em vão pelo fim da crise, simulando uma luz fátua ao fim do túnel quando já nem sequer se vê o túnel. Cortejo de cegos que se vendem por trinta dinheiros ao todo poderoso capital e caminham para o barranco para onde também querem empurrar o país. Para onde o atirarão se os deixarmos prosseguir essas políticas errantes, de mentes perturbadas pelo deserto das folhas de cálculo de economias virtuais sem gente, sem terra, sem sol, sem árvores, sem mar, sem nada.

Um governo de homens de palha do capital, serventuários das latrinas dos mercados, que andam atarantados a correr desatinados pelos labirintos da crise atirando medidas às paredes a ver se alguma pega e tapa ao acaso um dos vários buracos por onde ela entra e cresce. Bola de neve a levedar sem parança ameaçando ir desfazer-se num abismo de que não se vê o fundo.

Enquanto Portugal é um titanic a afundar-se abalroado pela crise, os partidos do governo e a oposição intermitente do outro partido do amaldiçoado arco governamental escrevem um capítulo de raro brilho e densidade da História Universal da Pulhice Humana. Não é que desde muito tempo atrás essa história não esteja a ser enriquecida com episódios nacionais, só que agora atingiu-se um grau superior de sofisticação, desde que o primeiro-ministro gargarejou a voz para  desafinar o nini vestida de organdi depois de ter anunciando o maior roubo, feito de uma assentada, aos trabalhadores para enfiar os milhões extorsionados nos bolsos do grande capital, até à cena de ópera buffa, vista em directo e ao vivo, de Paulo Portas a enfiar-se cadeira abaixo, escrevendo com o afã de mulher-a-dias a enfrentar a porcaria que tinha conscientemente feito, mentindo aos eleitores sem uma ruga de pudor, como é seu timbre e fica bem com os fatos às riscas e na moda que enfarpelam a sua chibante xico-espertice. Enquanto Honório Novo lhe esfregava na cara lampeira as asquerosidades que tinha feito, nas suas costas, os seus parceiros de quadrilha riam-se, com velhacaria, a bandeiras despregadas. Os episódios sucedem-se, cada um mais desprezível que o anterior.

Portugal está a ser governado por esse bando de malévolos cegos, que se passeia sem rumo pelos corredores do poder defecando poucas e corruptas ideias nas leis com que vai enforcando o país, onde já só se atrevem a por um pé dentro de cápsulas de segurança.

Portugal vive em estado de calamidade económica, social e mental. Tem que se livrar dessa gente para que o ar se torne de novo respirável. Uma emergência que já disparou todos os sinais de alerta. Não há tempo a perder.

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Política

Portas, o revolucionário

Há quem o garanta a pés juntos: Lenine alçou levemente uma sobrancelha quando um português, de visita, em chuvosa manhã domingueira, ao mausoléu onde congelaram o chefe da revolução russa na moscovita Praça Vermelha, lhe contou, ao ouvido, que Paulo Portas e seus compinchas até já admitem a nacionalização das Parcerias Público Privadas para salvar as metas do défice impostas pela troyka.

Que não, explicou o português, não se tratava daquele grupo de rapazes que o substituiu no poder quando começaram a pensar em congelá-lo,  o Zinoviev, o Kamenev e o Stalin, mas sim um outro grupo de rapazes, também conhecido por careca, alemão e etíope, que, nos últimos meses se entreteram a dar cabo da vida aos portugueses e da economia do país em nome do FMI, do BCE e Comissão Europeia.

Vladimir Ilitch, que pode não saber quem é esta gente da troyka, mas conhece o Portas de gingeira, alçou ainda mais a outra sobrancelha quando o português, que já aguentara estoicamente duas horas na fila, à chuva, só para o ver, lhe leu o “Expresso” deste fim de semana, onde um anónimo dirigente do antigo PP de Paulo Portas afirma, sem se rir, que “vamos ter de acabar por ter de tomar medidas unilaterais e, aí, a hipótese radical seria a nacionalização. No CDS já falámos disso“.

Por cá, enquanto Lenine quase descongelava, ouvia-se uma gargalhada monumental em reação ao fervor nacionalizante do CDS, em especial graças à declaração do chefe do partido — que põe água da fervura, para disfarçar, claro — segundo a qual essa coisa de nacionalizar não é bem assim, mas já invocar o interesse público, para forçar uma “negociação dura“, isso sim, é para avançar.

É uma espécie de “segurem-me, senão vou-me a eles” em que Portas é especialista, como ficou provado nestes últimos dias de simulacro de crise interna da coligação de governo PSD/CDS.

Claro que Validmir Ilitch, depois da primeira reação de espanto, acabou por esboçar um largo sorriso que deixou os taxidermistas do mausoléu profundamente intrigados, mas não o português que acabara de lhe dar a notícia, visto a atravessar a Praça Vermelha em direção aos antigos Armazéns do Povo a rir convulsivamente…

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Política

O CDS está no Governo?

Há coisas realmente curiosas e estranhas. De que outra forma se poderá encarar as declarações do líder parlamentar do CDP-PP, hoje, na Assembleia da República, que disse ao seu parceiro de coligação Vítor Gaspar que o Orçamento é um “trabalho em progresso”, além de, segundo o “jornal Público”, ter reclamado “alterações para compensar as medidas que têm consequências difíceis”.

E disse mais: “O Governo pode fazer esforço redobrado para encontrar despesa para cortar [nas PPPs e nas empresas públicas] e que permitam compensar algumas medidas na área fiscal e social que tem impacto negativo. Creio que é este o trabalho que devíamos concentrar atenções.” Mas, então, afinal o CDS-PP não tem estado no Governo e não tem andado a trabalhar com o seu parceiro de coligação para encontrar despesa para cortar?

Das duas uma: ou Magalhães se esqueceu de ter dito que as medidas anunciadas na sexta-feira passada respeitam a equidade e não são, de forma alguma, um aumento de impostos, além de ajudarem a criar emprego, ou então só agora  Paulo Portas, regressado de mais uma das suas fantásticas missões de diplomacia económica, lhe leu a cartilha para reproduzir na Assembleia. É o que dá as crianças falarem antes dos adultos e sem a permissão deles…

Reconheça-se que a jogada em curso é brilhante. Aliás, Portas, nestas jogadas é brilhante. Se a coisa seguir o caminho que se está a ver, há que concordar que, do ponto de vista do CDS, este é o melhor momento para se afirmar à direita e, nesse espaço político, fazendo-se de protetor dos pobres e oprimidos sufocados por impostos, capitalizar o descontentamento crescente.

Se já houve bons momentos para o CDS alargar o seu espaço na direita portuguesa, este será certamente o melhor de todos. Portas não vai perder a oportunidade.

O chefe do CDS consegue, entretanto, a quadratura do círculo. Está no poder, define as políticas, mas apresenta-se inocente, como o que rejeita aumentos de impostos e mais sacrifícios. Ou seja, participa, mas não entra…

É uma estratégia inteligente, lá isso é. Só é pena se seja tão pouco leal e séria.

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economia, Geral

Passados a ferro pela credibilidade

Passos Coelho tem uma abre-te sésamo para justificar as políticas desastrosas que estão a atirar Portugal para o mais fundo dos abismos. A tudo responde com uma palavra: credibilidade. O desemprego sobe por causa da credibilidade. O investimento público e privado estagna para garantir a credibilidade. O défice orçamental não pára de crescer a bem da credibilidade. A credibilidade  que este governo tem conseguido para o país, garantindo os aplausos dos mercados e das quadrilhas financeiras, que, apesar disso, não vá o diabo tecê-las, continuam a gozar à sombra de juros agiotas com que continuam a celebrar os êxitos do dredibilidade do coelhismo.

O Euro grupo, reunido na semana passada, passa a ferro a credibilidade de Passos, Portas & Companhia, desconfiando dos apregoados êxitos da sua governação pedindo à troika “ que trabalhe em conjunto com as autoridades portuguesas durante o quinto exame regular do programa de ajustamento que começa a 28 de agosto para garantir que o processo de ajustamento continue a decorrer de forma bem sucedida”. Traduzindo., com um milhão de desempregados, milhares de falências, venda ao desbarato de bens públicos, consumo nos níveis mais baixos, investimento perto do zero, emigração a disparar, sobretudo entre os mais jovens, tensões sociais a atingirem um nível de insuportabilidade, e a provada impossibilidade de cumprir a s metas acordadas com um programa, que supostamente nos iria salvar da crise e que só a têm agravado, faz soar os alarmes em Bruxelas que diz sem querer dizer que isto está a estoirar, que o falhanço é garantido, por isso  é necessário mais tempo.

A questão é, mais tempo para quê? para “se fazer progresso adicional, o que é claro uma vez que o processo de ajustamento não está completo. Na verdade, o que está aqui em causa é olhar para o processo de ajustamento português e procurar facilitar esse processo de ajustamento.” Esta conversa fiada do ministro das finanças, que ninguém, nem o próprio, entende, é a da credibilidade apregoada por Passos Coelho e que está garantida pelo não cumprimento do défice este ano, “um objectivo claramente difícil” soletra Gaspar.  A luz que se abre no túnel da credibilidade de Passos, Portas & Companhia, é de adiar dois anos o completo e absoluto fracasso destas políticas.

Depois de um ano a vender ao desbarato os bens públicos, a roubar os portugueses, não todos o grande capital continua a viver à tripa forra, o falhanço absoluto é anunciado com o selo da credibilidade. De um certo ponto de vista, falhanço absoluto não será. É para Portugal e para os portugueses não para essa gentalha que, à pala de umas ditas reformas estruturais, anda a  destruir o Estado, os direitos sociais, laborais, culturais entregando numa bandeja a riqueza material e imaterial do país à exploração mais desenfreada, só comparável com o antes do 25 de Abril. Tudo caninamente alinhado com o pensamento neoliberal que está enxertado na União Europeia, na troika, no FMI,no BCE. Tudo em nome de uma esfarrapada credibilidade.

Se dúvidas existissem sobre o desastre que já não é anunciado é uma evidência, surge agora o Borges das catacumbas do seu não-ministério que tem poderes de ministério a elogiar Passos Coelho e a sua credibilidade, dizendo-se “surpreendido com a qualidade com que tem sabido governar”, pelo que “ultrapassou as minhas expectativas e mostra que muitas das críticas que lhe fiz estavam desajustadas”. Era a vela que faltava no velório em que governo cuida de Portugal. Só em Portugal um personagem como António Borges arrota essas tiradas. António Borges que Marc Roche, autor de um livro premiado  que conta a história da Goldman Sachs e de como esse banco dirige o mundo, não conhecia esse “peixe miúdo” da Goldman Sachs, o outro que lá estava ainda mais miúdo é Carlos Moedas.  Agora sabe se foi informar e o “ FMI disse-me que se livraram dele [António Borges] porque não estava à altura do trabalho e agora chego a Lisboa e descubro que está à frente do processo de privatização. Há perguntas que têm de ser feitas”, defendeu o correspondente financeiro do “Le Monde” em Londres, em entrevista à Renascença.

O equívoco de Marc Roche só é possível por nunca ter lido Eça. Não sabe que Portugal é governado por Abranhos de todas as espécies e feitios, com a credibilidade que é contada no romance. Deve é ter percebido o que é fácil perceber: essa credibilidade está a atirar-nos para o mais fundo dos abismos.

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Política

O capote de Portas

Portas está preocupado e quer sacudir a água do capote. Ao ponto de até nos vir dizer que o Governo nada tem a ver com a redução de benefícios fiscais nem aumento de impostos. A culpa, diz Paulo, é da Troika, do memorando, do FMI, do BCE. Talvez até minha e de todos os outros que nem sequer alguma vez votaram nestes partidos do que pomposamente se chama o arco governativo, já que essa foi uma das desculpas que mais se ouviu nos últimos tempos para justificar o estado calamitoso a que as políticas de direita nos conduziram. A culpa, quiseram convencer-nos, é de todos nós. Deve ser…

Vê-se agora que nem sequer Portas, Ministro dos Negócios Estrangeiros do Governo PSD/CDS que se comprometeu a aplicar as medidas da Troika, se quer comprometer. Passos e ele próprio nada têm a ver com isso. Nada mesmo. Leio no “Público” que o “líder do CDS-PP, Paulo Portas, apelou aos deputados da bancada democrata-cristã para verem o que está escrito no memorando assinado com a troika em matéria fiscal. E lembrou que medidas como a redução dos benefícios fiscais no IRS, no IRC, no IMI ou o aumento do IVA na electricidade “não são opção do Governo”. Portas falava aos eleitos do CDS, aparentemente para acalmar a indignação que ameaçam manifestar perante a execução das medidas do memorando.

Das duas uma: ou os deputados que o CDS escolheu não sabiam ao que iam, porque nem sequer se deram ao trabalho de ler bem o memorando que se havia de transformar um programa de Governo, o que seria estranho, ou então estão a encenar uma fingida indignação recheada de hipocrisia para enganar os papalvos.

A técnica é conhecida. Equilibram-se os pratos da balança do lado do partido, para dar a ideia de que se discorda de alguma coisa, num simulacro de democracia que apenas resulta da necessidade estratégica de criar escapes para a ira popular (não confundir com tumultos) que está a germinar na sociedade portuguesa e da necessidade de salvaguardar o partido para a possibilidade de uma ruptura repentina, isolando o PSD. Portas nada tem de parvo, ainda que tenha muito de chico esperto…

O líder do CDS ou tem dupla personalidade ou come muito queijo. Não terá sido este partido um dos apoiantes do memorando? Não terá sido o CDS um dos que foi ao beija mão à troika para dar o aval a todas as atrocidades que já estão a ser praticadas? Razão tem Jerónimo de Sousa quando, numa lapidar frase sobre as “negociações” com o FMI e companhia, proferida no comício da Festa do Avante, exclamou: “nem lá fomos!”

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Media, Política

A “CAIXA”

O jornalismo tornou-se uma profissão deletéria. Correm atrás do supérfluo. A investigação é um território longínquo delimitado por interesses espúrios. Os jornalistas comissionados para o trabalho de mediar programas em que as realidades são sujeitas a uma suposta análise, entregam-se à missão de protegerem o pensamento dominante, armados de perguntas e ideias pequenas e formatadas, reduzindo-se a realçar o que é dito e redito pelas vesgas luminárias que andam a animar e enganar a malta, com invisíveis marcadores fluorescentes, não vá o diabo tecê-las e o dono não gostar da voz. Não o fazem por calaceira. Fazem-no por incapacidade que o espírito de sobrevivência acentuou. É um clima insalubre.

Há excepções? Claro que há excepções. O que inquieta é as excepções serem cada vez mais raras. Tão raras que estamos sempre à espera de as ver tragadas na próxima lauda, como vai paulatinamente acontecendo aos opinadores que não estão aprisionados nas celas mentais do neo-liberalismo.

O “zapping” pelas televisões no dia da assinatura do acordo político PSD-CSD é exemplar do estado da arte. Dezenas de jornalistas, empurrados pelas portas da sala, que tanto entreabriam como fechavam, iam fazendo notas de reportagem. O adjectivo histórico abanava a cada quinze segundos os ecrãs dos canais televisivos. O éter radiofónico. Advinhava-se nos textos dos jornais, quiçá mesmo nos títulos.O ridículo não mata! Como não há jornalismo substantivo nada como recorrer à adjectivação hiperbólica e oca. O nervosismo transmitia-se pelas ondas hertzianas ameaçando tornar-se um incontornável tsunami. Decepção total quando perceberam que não iam ver Passos e Portas a rabiscar a assinatura no acordo. Sobretudo não iriam ver, registar e noticiar urbi et orbi que Passos usava caneta de marca e Portas, sempre dado a encenações que fazem corar de inveja os las férias, sacava de esferográfica Bic (passe a publicidade), empunhando-a como o Rei Artur empunhava a Excalibur, para iluminar o acordo piscando o olho aos circunstantes para que não perdessem o número de o ver entrar a correr austeridade dentro. Negado o acesso a esse facto jornalístico relevante, de alma dilacerada, afinavam os neurónios para inferir, nas linhas e entrelinhas, se o desiderato de dez ministros nem mais um se cumpria, condecorando a lapela do Coelho. Coisa magna que os ocupava desde o dia das eleições.

Nos entremezes, não havendo nada ou havendo pouco para dizer, antes ou depois das trocas de galhardetes entre os capitães das equipas, um(a) jornalista saca nota de reportagem notável da evidência irrelevante de a sala estar decorada com 6 bandeiras portuguesas. Para mal dele ou dela, este jornalismo castrado é uni sexo, deixava escapar o que poderia ser a “caixa” do ano.

6 bandeiras portuguesas, por detrás de Passos e Portas de sorrisos estanhados trocando papéis, acolitados cada um por três puxa-sacos da sua maioria das mudanças, 3+3 = 6. Tinham-se esquecido de contar o número de vezes que as portas tinham ameaçado abrir para logo se fechar: 6 vezes! Continuar a ler

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