A antiga ministra das finanças e líder do PSD, Manuela Ferreira Leite (MFL), viu finalmente o óbvio. Compreendeu, até, o que os comunistas andam a dizer há mais de um ano, com uma diferença: os comunistas falam em renegociação da dívida, Ferreira Leite defende uma consolidação das contas públicas “mais lenta”.
Vale a pena comparar o que disse a ex-lider do PSD hoje em Setúbal, de acordo com uma notícia da Lusa reproduzida no “Expresso”, e o que disse o deputado do PCP Agostinho Lopes (AL) na Assembleia da República, no passado dia 1 de junho, no debate agendado pelo PCP para discutir a renegociação da dívida pública. Constata-se, no essencial, um alinhamento no discurso, apenas com o desfasamento de mais de um ano…
A ex-ministra social-democrata Manuela Ferreira Leite defendeu hoje, em Setúbal, que a consolidação das contas públicas devia ser feita de uma forma “mais lenta, mais pausada, para não se matar o doente com o tratamento”.
O que disse Agostinho Lopes
Há que travar este caminho. Há que criar um outro rumo, uma alternativa patriótica que rompa com o Memorando da Troika, uma alternativa de esquerda que rompa com as políticas do Pacto de Agressão.
Uma alternativa que, tal como fizemos em Abril de 2011 e hoje atualizamos, estabelece as orientações a usar pelo Governo para renegociar a dívida pública, determinando a sua origem, legitimidade e natureza, fixando um serviço de dívida compatível com as condições de crescimento da economia portuguesa que inclua adequados períodos de carência, prazos alargados de amortização e pagamentos anuais de juros indexados ao crescimento das nossas exportações.
“Do meu ponto de vista, há apenas uma saída que eles [a troika] deveriam considerar: era, sim senhor, este é o caminho, esta é a direção, esta é a receita, este é o tratamento, mas não tratamento de choque, um tratamento mais lento, mais pausado, para não matarmos o doente pelo tratamento, em vez de o deixarmos morrer pela doença”, disse.
O que disse Agostinho Lopes
Esta é uma constatação que não surpreende o PCP. Como a vida comprova, as políticas de empobrecimento da Troika estão a provocar a forte diminuição da atividade económica e uma queda das receitas fiscais e das contribuições, e o aumento das prestações sociais para fazer face à evolução dramática do desemprego. Esta espiral negativa está mais uma vez a conduzir ao disparar do défice orçamental, estimado em 7,4% no final do primeiro trimestre, 40% do valor total previsto para todo o ano, 2,9 p.p. acima do défice previsto pelo Governo para 2012 (4,5%)!
“Acho que vai ter que haver aqui uma solução que obviamente deverá ser considerada pela troika no sentido de não nos desmoronar completamente. Porque a taxa de desemprego significa que o sistema produtivo se está a desmoronar. Por isso não há capacidade de aumentar um determinado tipo de coisas”, acrescentou.
A ex-líder do PSD, que falava em Setúbal, no ciclo de conferências sobre “Consolidação, Crescimento e Coesão”, promovido pelo PSD em todo o país, considerou também que o memorando com a troika “estabeleceu determinado número de regras que não se adaptam à realidade do país”.
Segundo Manuela Ferreira Leite, a receita da troika para a consolidação das contas públicas portuguesas não teve em conta a estrutura produtiva do país, constituída essencialmente por pequenas e médias empresas que, muitas delas, poderão não sobreviver às dificuldades económicas que estão a enfrentar.
O que disse Agostinho Lopes
Um ano depois o País está bem pior e, como então tínhamos avisado, nem mesmo a dívida pública desceu, bem pelo contrário. Em 2011 pagamos mais de 6200 milhões de euros de juros e encargos, com uma taxa média superior à de 2010 (4,1%). Apesar disso, a dívida pública continuou sempre a aumentar, subiu para 184 mil milhões, mais 23 mil milhões de euros que em 2010.
“Nós para recuperarmos a credibilidade evidentemente que temos que o cumprir [o acordo com a troika], mas isso não impede de considerar que a troika estabeleceu determinado tipo de regras que nem sempre se adaptam ao nosso país, nem se poderiam adaptar na medida em que a receita que utiliza para os diferentes países é mais ou menos sempre a mesma”, argumentou.
O que disse Agostinho Lopes
Ao contrário do que PS, PSD e CDS insinuaram há um ano, a dívida pública não está nem vai diminuir. Pelo contrário, vai continuar a aumentar. Em 2014, o País vai pagar 8300 milhões de euros de juros e encargos para que a dívida suba para um valor de 200 mil milhões de euros. É o próprio Governo quem o diz!
“A troika quando analisou o nosso país, não tomou em consideração a nossa estrutura produtiva e social. É extremamente difícil pensarmos que estas consequências não teriam efeitos arrasadores em termos de crescimento económico”, acrescentou.
O que disse Agostinho Lopes
O País soube ontem que a queda na receita dos impostos indiretos totais foi muito maior do que o Governo admitira na execução orçamental de Abril. Afinal, os impostos indiretos não caíram só 3,5%; caíram 6,8%! A receita não caiu só 233 milhões de euros! Caiu 472 milhões, o dobro do que o Governo dissera.
Pior: estima-se já um previsível descalabro na execução orçamental.
Manuela Ferreira Leite salientou também a “especificidade” do tecido social português, onde só a classe média e média baixa paga impostos.
A antiga ministra das Finanças explicou que uma grande parte da população portuguesa não paga impostos, porque não tem rendimentos que o justifiquem, e que há uma outra parte com rendimentos elevados, mas que são poucos, pelo que só a classe média e média baixa é que pagam impostos.
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