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Cultura Gold

images Paulo Portas, com eleições à vista, tirou mais um coelho da cartola. Alargou a atribuição de vistos gold a quem invista na cultura. O mínimo 350 mil euros. Mais barato do que se fizer aquisições imobiliárias, 500 mil euros, ou transferir um milhão de euros, para uma conta sediada em Portugal,. A primeira e já sabida curiosidade, é o governo PPD/CDS, andar a captar capitais com essas ofertas, e preocupar-se pouco ou mesmo nada com os grandes capitalistas nacionais, useiros e vezeiros na fuga de capitais para paraísos fiscais, são centenas de milhões de euros por mês, informa o Banco de Portugal, ou em escapar aos impostos, localizando empresas em países que lhes concedem benefícios, alguns escandalosos como se veio a conhecer com o Luxemburgo Leaks, prática semelhante mas mais agressiva da que a praticada por outras paragens como a Holanda, país de acolhimento a belmiros e soares dos santos. A segunda curiosidade é essa gente vender-se barato. Oferecem um visto gold a troco de uns amendoins para a cultura. O Secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier, veio esclarecer que o montante de 350 mil euros é para criar “precisamente um incentivo adicional”. Acentuou que “o governo está empenhado em divulgar esta medida junto de potenciais investidores mostrando-lhes o que se faz cá se faz.” Dá o exemplo do que aconteceu nos EUA, no Kennedy Center onde, durante três semanas, estiveram “integrados na mostra cultural Iberian Suite mais de uma centena de criadores portugueses e lusófonos com os seus mais recentes trabalhos nas áreas do teatro, da dança, da música, das artes visuais, da literatura, da gastronomia” . A caldeirada das indústrias criativas. O enunciado dá para perceber o conteúdo de tanta criação, cócócóró. A luzidia comitiva era uma montanha russa assim porque não era assado. Lamenta Barreto Xavier “não termos projecção internacional enquanto potência de arte contemporânea significativa” e acrescenta com vergonha “por vezes temos uma ideia exagerada sobre nós próprios a esse respeito”. Mais umas banalidades a juntar às com que nos mimoseia cada vez que abre a boca. Deste governo que outro secretário de Estado se podia esperar? A concessão de vistos gold para a área da cultura está no mesmo nível de mediocridade. Depois de sucessivos anos de desinvestimento no sector da Cultura, até se atingir o estado comatoso actual, não serão os vistos gold que a vai reanimar. Atearão uns fogachos fátuos, iremos ver de que calibre. Os vistos gold serão apoios intermitentes e pontuais. Obviamente, até pela sua natureza, excluem-se de qualquer plano cultural, mesmo de curto prazo. Em nada contribuirão para uma política cultural, mesmo a não política do actual governo. Serão dirigidos com a vista curta de obter rapidamente benefício. Isso vai favorecer quem já tem nome, a mais das vezes não por valor real mas por bem dirigidas operações de marketing. Será mais fácil comprar uns tricotados ou umas panelas à Joana Vasconcelos, lá estará o olho vivo da Everything is News para não deixar escapar a oportunidade, do que apoiar um projecto de João Limpinho, apesar do saber, da seriedade artística, da qualidade estética demonstrada nas esculturas que integram o Museu está na Rua, no Bairro da Bela Vista em Setúbal. Será mais fácil encomendar um espectáculo musical a Rodrigo Leão do que uma obra a António Pinho Vargas, apesar do abismo artístico e estético que os separa. Outros exemplos poderiam ser enumerados. Apesar desse quadro, sempre se poderia ter colocado a fasquia mais alto e com outro fundamento. Dirigi-los para um sector específico, o do património construído, muito em avançado estado de degradação, exemplo próximo o Conservatório Nacional, e não deixar os investimentos serem feitos quase a vontade do freguês. Sem normas, o melhor, mais de acordo com o seu gabarito, será Barreto Xavier montar uma banca de venda de produtos culturais na Feira de Carcavelos, especializada em vistos gold. O Paulinho, frequentador habitual desses eventos, lá o iria visitar para ver como corre o negócio e degustar um menu de farturas pós-modernas. Lugar para diálogos pouco confidenciais: “O senhor vice primeiro-ministro engraxa? Não, hoje engraxo nas Necessidades!” Esta gente vende-se barato e sem critério.

(publicado no jornal Avante! em 16/4/2015)

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3 thoughts on “Cultura Gold

  1. António da Silva Vieira - Barreiro/Sanlúcar de Guadiana diz:

    Chamou-me a atençao o comentário especifico acerca da “diferença” entre o trabalho de Pinho Vargas e Rodrigo Leao. A obra de Rodrigo Leao, essencialmente diferente da do outro compositor, nao desmerece, como o autor deste artigo procura fazer parecer. Sou artista também e certamente que há outros colegas que tèm trabalho diferente do meu, mas sem desmerecimento, e seguramente cotado com várias opinioes criticas, que temos que aceitar por vários motivos e mais alguns. Compadrio? Será que entendi bem? faço notar que ambos para mim, sao notáveis compositores. Obrigado pela atençao.

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    • Manuel Augusto Araujo diz:

      Há uma tendência para facilitar a adjectivação. Classificar Rodrigo Leão, não refiro especificamente Rodrigo Leão mas uma série de autores de músicas e canções da mesma filiação, como um notável compositor é um excesso semântico muito em voga, alimentado por uma comunicação social onde os valores críticos quase não têm qualquer significado. Aliás a maior parte da música que se consome, dizer consome já é dizer muito, está padronizada há algumas décadas, é anglo-saxónica na forma e internacional nos sentimentos. A chamada canção de texto, em que o texto tinha a mesma importância da música é uma raridade, foge aos padrões comerciais. Disto isto, comparar rodrigos leões a pinho vargas é comparar o incomparável. Aqui, o meu interlocutor, está pensando que sou elitista e só um tipo de música, a musica sinfónica me interessa. Basta consultar o blogue de uns dias atrás para verificar quanto se engana. Mas não confundo Billie Holiday com Teresa Stich-Randall ou Bárbara Booney, para me limitar aos EUA. Nem John Coltrane, tenho uma extensíssima biblioteca de cd’s de jazz onde o Coltrane ocupa lugar destacadíssimo, com Ives, Cage ou John Adams, continuando a não sair dos limites físicos dos EUA. Passar uma rasoira, fazendo equivaler tudo e mais alguma coisa é sempre penalizador.
      Voltando a Portugal, não quer comparar certamente Zé Afonso com Rodrigo Leão e mesmo Zé Afonso há que notar a diferença do Zé Afonso antes e depois das orquestrações de José Mário Branco, tal como agora acontece com Camané.
      Sobre isso, nada mais vou avançar, mas não posso deixar de sublinhar que a representação da música portuguesa no festival referido no “post”, foi entregue a Camané, António Zambujo, Rodrigo Leão, Carminho, The Gift, posso ter esquecido alguém, longe dos critérios dos espanhóis que, além de cantores equivalentes, fizeram ouvir dois dos seus maiores compositores, Joaquin Turina (1882-1949) e Albeniz (1860-1909). Vá lá que a literatura, certamente por arrasto de termos tido recentemente um Prémio Nobel, tinha outro peso. Senão ainda veríamos por lá o Miguel Sousa Tavares, o José Rodrigo dos Santos e a Margarida Rebelo Pinto.

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  2. da Silva Vieira diz:

    El Jueves 16 de abril de 2015 19:33, Praça do Bocage escribió:

    #yiv7792394346 a:hover {color:red;}#yiv7792394346 a {text-decoration:none;color:#0088cc;}#yiv7792394346 a.yiv7792394346primaryactionlink:link, #yiv7792394346 a.yiv7792394346primaryactionlink:visited {background-color:#2585B2;color:#fff;}#yiv7792394346 a.yiv7792394346primaryactionlink:hover, #yiv7792394346 a.yiv7792394346primaryactionlink:active {background-color:#11729E;color:#fff;}#yiv7792394346 WordPress.com | Manuel Augusto Araujo posted: ” Paulo Portas, com eleições à vista, tirou mais um coelho da cartola. Alargou a atribuição de vistos gold a quem invista na cultura. O mínimo 350 mil euros. Mais barato do que se fizer aquisições imobiliárias, 500 mil euros, ou transferir um milhão de eur” | |

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