Eleger significa escolher, preferir de entre vários. No caso de eleições legislativas significa escolher um partido ou uma coligação que, por sua vez, representem diferentes políticas servidas por medidas que as corporizem. Mas as eleições marcadas para 5 de Junho serão quase tudo menos isso – isto é, não se vão escolher, nem políticas, nem medidas, só personalidades e partidos. Será uma falsa escolha.
E porquê?
O país, através do seu poder legitimamente constituído, o Governo, solicitou apoio financeiro externo junto da União Europeia, reconhecendo a sua incapacidade para deter o aumento dos custos com a dívida soberana. O apoio pretendido traduzir-se-á num empréstimo estimado num valor entre 80 e 90 mil milhões de euros. Terá como contrapartidas medidas de grande impacto social para a população, como é habitual nas receitas do FMI.E sabe-se que as negociações terão como ponto de partida o conjunto de medidas inscritas no PEC 4, como os nossos prestamistas já fizeram saber.
Em meados de Maio, isto é, a meio de uma campanha eleitoral que já começou, os portugueses irão ficar a conhecer o que os espera nos próximos anos. Isto se tudo não descarrilar – na Alemanha e na Finlândia, por exemplo, por formas diversas, há já movimentos contra o empréstimo a Portugal.
A verdadeira eleição – aquela que ditará a austeridade a que seremos sujeitos – vão os portugueses acompanhando através dos meios de comunicação social, campo em que actores políticos e jornalísticos têm agora terreno fértil para lançar “bombas sociais” destinadas a assustar a população. Basta uma breve consulta às primeiras páginas do jornal “Correio da Manhã”.
Entretanto o país assiste atónito ao desempenho do seu sistema político, nomeadamente de governantes e dirigentes dos dois maiores partidos: um congresso partidário surrealista para aplaudir um líder que mal se refere ao que se passa no país; um líder do maior partido da oposição que, cada vez que fala, perde pontos nas sondagens; ministros que fazem declarações desencontradas – Teixeira dos Santos “manda” a UE negociar o acordo com a oposição enquanto Luís Amado lamenta publicamente as “vergonhas” por que o país passa; personagens das segundas linhas entretidos em fazer foguetório verbal na televisão no diz que esteve mas esteve.
É já claro que os partidos do chamado “arco governativo” (PS, PSD e possivelmente o CDS) vão assinar um compromisso para aceitação das medidas que a UE/FMI decidir e que estão a ser negociadas por estes dias. O cardápio não deverá divergir muito daquele a que gregos e irlandeses estão a ser submetidos e de que nós também já começámos a sentir com as primeiras versões do PEC: mais subidas no IVA, aumentos de impostos sobre consumo, reduções das deduções no IRS, reduções na função publica e congelamento ou diminuição de salários, cortes nas reformas, pensões, subsídios de desemprego e outras prestações sociais. Mas muita da especificidade e do detalhe poderá estar na capacidade negocial do governo.
Que haverá então para escolher quando chegar o dia 5 de Junho? O país está perante uma não escolha. Ganhe J. Sócrates, ganhe Passos Coelho, qualquer um deles irá executar o resultado da nossa dramática perca de soberania.
Pode-se-ia seguir-se a “via islandesa”, adaptada, e procurando renegociar a dívida? Poderia, mas com outros protagonistas. Mas, para que isso fosse possível, seria necessário um suporte político que não existe entre o eleitorado. Era preciso uma alternativa política com potencial eleitoral que não começou ainda a ser construída.
Com esta de cortarem nas reformas e nos subsídios, com a vinda do FMI e de segundo dizem pagarem com títulos da dívida pública; há por aí negócios relacionados com certas herdades, pensões e mansões, etc…, que além de não pagarem imposto a este Estado de graça, também terão que decretar a falência, como tantas sociedades, neste País onde um velho como o Silva Lopes, consegue um precioso tacho:
LÁ SE VAI A HERDADE
Eu tenho uma rica herdade
que herdei desde nascença
onde velhos e a mocidade
vão e me pagam a licença!
–
e todos cá vem com gosto
tanto gostam da frequentar
sem ao estado dar imposto
adoram vir cá e se consolar!
–
e a sua morada vem na lista
e seu telefone toda gente vê
telefona, vem cá o socialista
vem o do CDS vem do PSD!
–
e toda a minha gente é una
ai e nenhuma delas é lerda
a herdade adora um comuna
com’o do bloco d’esquerda!
–
e até vem cá um Intendente
também vem um Comissário
vem um Chefe vem o Agente
e é bem atendido no horário!
–
e até cá já veio um Tenente
e também vem um Capitão
sai de cá o Coronel contente
um General com satisfação!
–
já comprei a minha mansão
com os rendimentos que tirei
e a funcionar como a pensão
vem cá um príncipe e um rei!
–
mas deixemo-nos de lérias
que isto agora vai estar mal
vêm sem subsídio de férias
vêm sem subsídio de Natal?
–
como gosto dum Intendente
e eu a ele, ainda lhe sou fiel
digo-lhe, ele vai-se contente
ao pagar com folha de papel
–
vou recebe-la e fico lívida
vão-me a herdade confiscar
pois com os títulos da dívida
não posso herdade explorar!
–
comprei uma casa no Norte
e já tenho outra cá pelo Sul
ai que me têm trazido sorte
com pequenas de olho azul!
–
e tenho outra casa no Centro
e outra em Évora e em Beja
e todo o quer lá bem dentro
e desta herdade já há inveja?
–
Eugénio dos Santos
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