Política, Setúbal

Como protestar contra a tua autarquia

volvo_logo_detailQueres protestar contra a tua câmara municipal e não sabes como?

Fácil. Segue os seguintes passos e terás grande sucesso na tua carreira profissional.

1 – Verifica que carro tem o teu autarca. É um Volvo? Estás safo. Repete no Facebook até à exaustão que o autarca tem um Volvo, ignorando que custa o mesmo que alguns Renaults e passa ao passo seguinte. Se o autarca tiver um Renault, desiste já.

2 – Verifica se há algum ganso aprisionado no jardim da cidade e assegura-te de que os patos do lago desapareceram. Se a resposta for afirmativa estás safo. Faz um post no facebook a mostrar a tua indignação, ignorando que o ganso está resguardado para ser protegido das obras que decorrem no jardim. Passas assim por grande entendido nas matérias da cidade e, simultaneamente, por grande defensor dos animais. É o dois em um. Acrescenta que o autarca anda de Volvo e que o carro deve ter sido comprado com o dinheiro da venda dos patos.

3 – Se tiver sido substituído algum bebedouro de brecha da Arrábida no jardim da cidade, faz outro post no Facebook e insinua logo que alguém abarbatou o bebedouro. Passa a chamar-lhe fonte para dar grandiosidade à coisa. O sucesso é garantido. Passas a estrela do Facebook instantaneamente, mesmo que o bebedouro tenha sido substituído porque já não oferecia as mínimas garantias de salubridade. Insinua que alguém meteu o bebedouro dentro de um Volvo e o levou para casa.

4 – Se a câmara quiser fazer mais uma rotunda, junta-te ao grupo dos que protestam contra as rotundas e acusa algum autarca de estar a meter dinheiro ao bolso com a empreitada da obra para comprar mais um Volvo.

5 – Se a câmara quiser aumentar o estacionamento, recorda sempre que o Volvo do autarca pode estacionar em todo o lado sem pagar. Ignora que o carro é da câmara e não do autarca e não faz sentido a câmara pagar estacionamento a si própria, assim como o facto de quem se desloca em trabalho ter normalmente as despesas de estacionamento pagas pelas suas empresas.

6 – Se houver um descarregamento no porto de lixo importado para tratamento numa empresa especializada, criada por iniciativa de um qualquer governo com o qual até simpatizaste, ignora este último facto e acusa a câmara de estar distraída a comprar Volvos e não ter visto passar o barco com o lixo, mesmo que a autarquia não tenha qualquer responsabilidade no licenciamento de tais empresas, não controle o tráfego marítimo e nem sequer tenha autoridade para proibir o que quer que seja nesta matéria.

7 – Se a câmara não faz obra, protesta com veemência recordando só há dinheiro para Volvos.

8 – Se a Câmara faz muitas obras, protesta com veemência, garantindo que são obras desnecessárias, assim como o Volvo do autarca.

9 – Se for asfaltada uma qualquer rua da cidade, insinua de imediato que só é feita aquela obra porque o Volvo do autarca passa muito por ali.

10 – Se arranjarem uma qualquer avenida, apressa-te a garantir que o que deviam fazer era arranjar a rua do lado, mas não o fazem porque o Volvo do autarca não passa por lá.

12 – Repete até caíres para o lado que a tua cidade tem o mais alto IMI do país, mesmo que tal realidade ocorra em mais 32 câmaras municipais, na maior parte dos casos por imposição legal. Acrescenta que deve ser para os autarcas andarem de Volvo e comprarem mais Volvos.

13 – Argumenta que o IMI só não baixa porque os autarcas não querem. Não precisas referir que até agora nunca nenhum governo se quis comprometer, preto no branco, que a Câmara da tua cidade pode baixar o IMI porque sabem que há um quadro legal que a impede de baixar o imposto e, na verdade, preferem deixar os autarcas andarem de Volvo, mas arder em lume brando.

Cumpriste todos estes passos?

Serás um profissional de sucesso no protesto contra a tua autarquia e podes começar a pensar em prestar serviços noutras cidades.

Talvez até consigas comprar um Volvo…

Nota 1– A Volvo não patrocina este texto.

Nota 2 – Qualquer semelhança com a realidade não é mera coincidência.

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Política, Setúbal

Gatos escondidos com rabos de fora…

gato-escondido-com-rabo-de-foraLeio nos jornais que, em Montemor-o-Velho, a Direção Geral das Autarquias Locais obrigou a Câmara Municipal a aumentar para a taxa máxima o Imposto Municipal sobre Imóveis porque esta tem em vigor um PAEL – Programa de Apoio à Economia Local, programa inspirado em princípios de recuperação financeira idênticos aos de um Contrato de Reequilíbrio Financeiro como o que foi celebrado em Setúbal.

De acordo com o presidente da autarquia, Emílio Torrão, a DGAL – Direção Geral das Autarquias Locais entende que o município de Montemor-o-Velho não podia baixar, como fez, o IMI porque está obrigado aplicar a taxa máxima de IMI (0,5%), dado estar ao abrigo de um PAEL. A decisão municipal de aumentar o imposto para o máximo, votada na reunião de câmara de 21 de dezembro passado, deve-se à ameaça da DGAL de iniciar procedimentos para eventual perda de mandato dos eleitos locais responsáveis pela manutenção da taxa em 0,4%.

Neste caso, a DGAL soube ser clara e indubitável: em Montemor-o-Velho não podem baixar o IMI, pois, caso o façam, perdem o mandato.

A única diferença entre Montemor e Setúbal é que, aqui, a legislação que regulava os Contratos de Reequilíbrio Financeiro não referia a obrigação de aplicar IMI máximo, mas sim “derramas” à taxa de 10 por cento e a “fixação de taxas e tarifas (…) atualizadas anualmente com uma taxa de crescimento médio referenciada à taxa de inflação verificada nos últimos 12 meses”, ou seja, impostos e taxas municipais à taxa máxima e sempre atualizados para cima (quando o pressuposto era o de a inflação subir sempre) para permitir a maximização de receitas e o equilíbrio financeiro da autarquia. Nem podia ser de outra forma: à época em que tal lei foi elaborada não existia IMI, logo a lei nunca poderia apontar para o IMI, embora o princípio de maximização de receitas baseado em impostos e taxas municipais em valores máximos permitidos por lei já lá estivesse presente. Continuar a ler

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Geral

Costa Amigo, o Relvas e o Isaltino estão contigo

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Há um novo paradigma nas eleições democráticas das mais ou menos abertas às mais mais ou menos fechadas ou mesmo completamente fechadas. É o paradigma António Costa, eleito por unanimidade presidente da Comissão Executiva e do Conselho Metropolitano da Área Metropolitana de Lisboa (AML), depois de afastar, como não quer a coisa mas não deixando outra saída em quem tem coluna vertebral, coisa de que ele tem uma vaga ideia do que seja, que não fosse abandonar a votação para não legitimar tamanha tropelia. Um caso de estudo em regimes democráticos.

Pela mão do amigo Miguel Relvas, António Costa sem mexer uma palha seria sempre eleito para uma das presidências da Área Metropolitana de Lisboa. Mesmo que tivesse havido uma abstenção abstrusa e um único votante no concelho de Lisboa, ele próprio a votar em si-próprio, a lei Relvas garantia um dos cargos de presidência de uma das comissões da AML. Malhas que as democracias tecem, cerzindo as leis à medida dos interesses de momento, como aqui já foi explanado por Demétrio Alves no “post” O Eleitor de Oiro. Emalhamentos que xicos-espertos, sem rei nem roque, costuram  para legalizar processos tortuosos, em que os fins justificam os meios, para que o Estado de Direito continue a ser o estado do direito dos mais fortes à liberdade atropelando todos os princípios e qualquer ética. António Costa, mal a lei foi publicada, deve ter enviado um cartão de agradecimento ao amigalhaço Miguel Relvas, antecipando os abraços democráticos que devem ter trocado, rebolando-se de gozo com as consequências da aplicação da lei. A democracia fica sempre mal servida por Costas & Relvas.

O Miguel Relvas bem deve ter corado de vergonha quando António Costa vituperou a falta de coragem para levar a lei até às últimas consequências. Ter deixado a porta entreaberta para critérios da lei anterior continuarem em vigor. Pela lei Relvas, o partido cujos municípios somassem maior número de eleitores, independentemente dos resultados eleitorais, elegeria um presidente de um dos órgãos. Para ocupar os dois órgãos seria necessário ter também o maior número de presidências de municípios. Pelo primeiro critério, tendo sido António Costa, eleito presidente de Lisboa mesmo que, como já referimos, com a hipótese absurda de haver uma abstenção desaustinada e um só votante, o Costa no Costa, a sua eleição estava garantida. Como se está a ver nada mais transparentemente democrático!

Pelo segundo critério é que a porca torce, torcia o rabo. A CDU ganhou nove municípios, com um total de 233.414 votantes, o PS, seis com um total de 355.114 votantes (só Lisboa contribuiu com 32,8% desses votos numa coligação que era um ponto de encontro de várias vontades e opções ideológicas, como lembrou Helena Roseta para sublinhar a pluralidade de uma lista, com vários grupos de cidadãos organizados, que se albergava debaixo da bandeira do PS, opinião que António Costa rebateu soezmente no discurso de vitória em que quase afirmou, para Seguro e o PS ouvirem evidentemente, que a vitória se devia a ele e só a ele) o PSD dois, com um total de 196.524 votos, e o delfim do Isaltino, toma lá aquele abraço comovido, que ganhou Oeiras com 25.071 votos.

O PCP propôs ao PS que cada um dos partidos ocupasse a presidência de um dos órgãos da Área Metropolitana de Lisboa. Hipótese liminarmente rejeitada por António Costa que. como bom democrata, queria todo o poder para ele nem que  tivesse que se deitar com o diabo.

A única saída era aliar-se aos presidentes de câmaras ganhas pelo PSD e, o mais fácil, à Câmara de Oeiras, ganha por um discípulo desse autarca exemplar que foi Isaltino Morais. Um exemplo também para o António Costa, sobretudo em anos em que vai rever o PDM. Isaltino grande líder estou contigo, o teu seguidor será meu vice-presidente.

Homem avisado, António Costa preparou o terreno em Lisboa, rasgando uma regra tácita, em que as vice-presidências da Assembleia Municipal eram ocupadas pelas outras forças mais votadas. Sempre virado para a direita enquanto fala para a esquerda ouvir, numa conversa fiada que tem treinado desde a juventude, afastou a CDU de qualquer acordo, antecipando o que iria fazer na Área Metropolitana. Com essas alianças somou tantas câmaras, nove, quantas as que a CDU ganhou. Estava desfeito o nó que o amigo Miguel Relvas não tinha desfeito. António Costa foi eleito por unanimidade absoluta, obtida com a ausência de indignação justificadíssima dos autarcas CDU, É o novo paradigma democrático, o Paradigma António Costa, um político cheio de qualidades, quase nenhuma com qualidade. Ainda há pouco tempo, no programa Quadratura do Círculo, insurgia-se de forma pouco habitual no seu estilo de experimentado e meloso intriguista, contra a alteração estatutária que António José Seguro propunha, em que as propostas de listas de candidatos a deputados pelo PS  abandonariam o método proporcional e a lista vencedora ficaria com todos os candidatos, nem que vencesse por um voto. Para António Costa isso acabava com a suposta marca de água do PS que seria a pluralidade interna. E, coisa rara nele, engrossava a voz enxofradíssimo, quase a ultrapassar as fronteiras da exaltação que  essa proposta lhe causava, apesar de tudo bem mais aceitável que a celerada lei Relvas que o beneficiava descaradamente e de que não discordava de algum modo. Essa gente é assim, sempre pronta para o contrabando ideológico e de princípios desde que saquem vantagens.

Bem pregava Frei António Costa contra as malvadezas do Seguro, malvadezas que só o são dentro do PS mas que são óptimas se, em variante menos justificável e mais violenta, fazem tábua rasa de qualquer veleidade democraticamente pluralista, quando aplicadas na Área Metropolitana de Lisboa, por via de uma lei miserável que abençoou em silêncio e logo  utilizou, fazendo  as alianças espúrias necessárias para ultrapassar os buraquinhos deixados pelo legislador e que punham em perigo o poder absoluto. Ou talvez as alianças não sejam nada espúrias e revelem, para quem ainda tenha ou tivesse ilusões, que António Costa, como o rematador de pólo aquático da Palombella Rossa, aponta à esquerda, sempre à esquerda para rematar à direita, sempre à direita. Aliás António Costa especializou-se em dizer coisas de esquerda, que chegam a ultrapassar a esquerda pela esquerda, para melhor fazer políticas e, sempre que necessário, alianças à direita. Nunca se viu, em todo o seu já longo percurso político, António Costa fazer outra coisa que não seja rasteirar a esquerda na primeira curva em que com ela se cruza. Um artista faceto, um político sem príncipios, um homem da confiança do grande capital como se viu ainda há bem pouco tempo quando fez um ultimato a Seguro, em que acabou por recuar só para tomar mais balanço. Apercebeu-se que ainda não tinha chegado a sua hora apesar dos apoios angariados entre correlegários e os externos que os representantes do capital lhe garantiam. Por ela tem feito tudo, com a habilidade que se lhe reconhece, dando doces mas vigorosas dentadas nos adversários colegas de partido, puxando os cordéis nos bastidores, largando bombas de relógio nos corredores do Rato, rasteirando e intrigando brilhantemente para que não apareça outro Sócrates que lhe atrase o destino para que se acha predestinado e que desde a juventude, as elites socialistas preconizam.

Ao assistir a estas manobras, lembrámo-nos da primeira aventura autárquica de António Costa, quando em 1993 concorreu ao município de Loures. Ainda estavam os votos mal contados, a votação era-lhe favorável. Não perdeu tempo a fazer um extemporâneo discurso de vitória. Na RTP 1, entre vários comentadores, Cáceres Monteiro e Nuno Rogeiro. Cáceres Monteiro babava-se a ouvir António Costa cantando vitória.. Depois a má notícia, Costa tinha perdido. Cáceres Monteiro, muito rápido, quase lacrimejante, desatou a fazer o elogio de António Costa, a lamentar a perda que era para Loures ter atirado para a lixeira a oportunidade de ser dirigida por tão promissor político, ter dado a vitória ao engenheiro “Demérito” Alves (sic). O alvoroço tem desses imprevistos. Nuno Rogeiro sarcástico corrigiu-o. Cito de memória: “Não é Demérito é Demétrio Alves, e você ainda não percebeu que a população de Loures preferiu o ferrari ao burro?!” Aludindo há corrida que o Costa tinha promovido entre um burro e um ferrari na Calçada do Carriche,

Agora o burro, que não é nada burro como os burros não o são, vingou-se e de braço dado com Miguel Relvas e Isaltino Morais, dois democratas estrénuos como ele e de gabarito equivalente, ocupou todos os cadeirões presidenciais da Área Metropolitana de Lisboa. Reconheça-se que o burro vai longe. É um animal político trabalhador, obstinado, com objectivos bem definidos que mascara habilidosamente para os adversários, dentro e fora do seu partido, só deles se aperceberem quando já não há, ou quase não há, retorno. Consumado politiqueiro, onzeneiro experimentado, tem poses e discursos de sereia que disfarçam a voracidade saturnina. Mesmo quando parece recuar está a avançar dando a volta ao texto. O tempo em que teve hesitações que foram escolhos na sua carreira, parece definitivamente ultrapassado. No pântano da democracia, enquanto a democracia for um pantanal mal cheiroso, António Costa está entre os que prometem ir mais longe. Terá é que não ser tão sofrego como na referida edição da Quadratura do Círculo e não desatar a correr atrás do seu fado, para recuperar o tempo e as oportunidades que por maus cálculos deixou passar. Dona Constança Vitorino anda a fazer pela vidinha e os outros não passam de uns seguros de trazer por casa. Oh Costa, tenha calma, nem sempre terá Relvas por muleta, mas os ventos, maus ventos para todos nós, são-lhe favoráveis.

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autarquias, Política

Para que servem as reduções na Administração Local?

Quem conhece o funcionamento das autarquias sabe que o que Demétrio Alves escreve nos últimos parágrafos da análise que faz aqui ao Documento Verde da Reforma da Administração Local é rigorosa. Suscita enorme perplexidade que o governo tenha escolhido como um dos desideratos da cruzada pela redução da despesa alvos que pouco renderão, excepto, talvez, na contabilidade político-populista do ataque aos autarcas, alvo fácil das narrativas de café e do boca-a-boca dos transportes públicos. Isto além da enorme perturbação psicossocial que podem gerar as medidas de redução de vereadores e dirigentes, sem ter minimamente em conta realidades locais muito específicas.

Há exemplos que ilustram bem a perturbação que a proposta do Governo pode gerar. Barrancos é um deles. Com 1841 habitantes registados nos censos de 2011, menos 83 do que em 2001, este seria um dos concelhos cuja câmara municipal se veria reduzida a dois vereadores, com direito a que apenas um ficasse a tempo inteiro. Ou seja, presidente e vereador seriam os responsáveis por recursos humanos, finanças, obras, abastecimento de água, cultura, desporto, habitação, educação, questões sociais, etc.

Veja-se então o que se passa com os dirigentes. Barrancos, de acordo com o documento verde, terá apenas direito a um chefe de divisão, já que se preconiza que os concelhos com menos de cinco mil habitantes apenas tenham um chefe de divisão, o que provocará a necessidade de produzir superdirigentes com capacidades sobrenaturais para lidar com a multiplicidade de assuntos com que uma autarquia lida diariamente.

Deixemos de lado as questões relacionadas com a necessidade de promover políticas que impeçam a desertificação e focalizemos a atenção apenas na governabilidade desta autarquia. Alguém acredita que será possível gerir a Câmara de Barrancos neste espartilho? E, se assim for, quais serão os custos para a qualidade de vida daquela população? Ou será que não resta aquelas pessoas outra opção que não rumar aos centros urbanos litorais já superpovoados, que, por sua vez, serão também obrigados, por força destas propostas do Governo, a reduzir o dispositivo orgânico e respectiva capacidade de resposta aos problemas?

Podemos subir na escala e tentar perceber o que acontecerá num dos concelhos da área metropolitana de Lisboa que, até há vinte anos, era um dos que menos população tinha. Alcochete, de acordo com os censos de 2011, tem 17.565 habitantes, mais 4.555 do que em 2001. A proposta do Governo permite que este concelho tenha três chefes de divisão e nenhum chefe de departamento e apenas quatro vereadores, dois deles a tempo inteiro.

O crescimento populacional de Alcochete foi, aliás, uma tendência que se registou em nove dos treze concelhos do distrito de Setúbal, que, em dez anos, aumenta em 65.260 habitantes.

Mais habitantes é sinónimo de mais necessidades. Mais escolas, mais infraestruturas, mais equipamentos desportivos e culturais, mais trabalho. Por outro lado, o decréscimo populacional registado nos concelhos do interior rural é, também, sinónimo da necessidade de reforçar as capacidades de atracção e de fixação de população nestes territórios, o que, certamente, não se fará reduzindo capacidades de intervenção autárquica.

Por isso soa tão contraditório todo o tom laudatório em que o Governo insiste quando fala de autarquias neste Documento Verde, em especial quando se afirma que um dos objectivos gerais desta reforma da administração local é “promover maior proximidade entre os níveis de decisão e os cidadãos, fomentando a descentralização administrativa e reforçando o papel do pode local como vector estratégico de desenvolvimento”.  Mais uma vez temos um Governo que se especializa em dizer uma coisa, e fazer exactamente o seu contrário. Mas isso já não é novidade…

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Política

Contar espingardas

A corrida pela liderança do PS começa, finalmente, a dar-nos algumas pistas do que poderá vir a ser o combate político nos próximos tempos. Depois de um decepcionante debate do programa de Governo, com a transitória líder parlamentar a dar a mão ao PSD em tudo o que era essencial, espera-se agora alguma animação suplementar, em especial porque será curioso (e penoso) ver como vão os candidatos socialistas conciliar o que apoiaram há meses no memorando da troika com as necessidades oposicionistas de combater as medidas gravosas que estão para chegar.

Estrategicamente, porque se trata de contar espingardas, os dois candidatos, Seguro e Assis, escolheram como um dos temas de arranque da campanha interna a prevista redução do mapa municipal, por imposição do FMI e do BCE. Seguro escreveu até aos seus camaradas presidentes uma carta em que afirma, «com clareza» que é «contra a extinção dos actuais concelhos» sem o acordo das populações. Já Assis advoga que «há outras formas de o fazer», nomeadamente «através do associativismo intermunicipal e da alteração da lei eleitoral autárquica».

Os dois sabem bem que os autarcas do PS, no momento de votar para a liderança do partido, são elementos cruciais na formação dos necessários sindicatos de voto (além dos outros truques em que os aparelhos locais do PS são especialistas) para garantir a vitória de um ou de outro candidato. O PS é a maior força autárquica nacional, com 132 presidentes de câmara, 119 dos quais governam em maioria absoluta. Estes são, contudo, uma pequena parte dos 921 eleitos socialistas nas autarquias do país, muitos deles com posições de relevo nas estruturas concelhias e distritais do PS. Continuar a ler

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Política

Tribunal do Ajuste de Contas

O Sr. Presidente do Tribunal de Contas (TC) escreveu ao Presidente da Assembleia da República pedindo para ser ouvido previamente à aprovação da Lei do Orçamento de Estado de 2011.

O Dr. Guilherme de Oliveira Martins critica veementemente o facto de o governo ter proposto, na lei depositada no parlamento para discussão e aprovação, que os autarcas passem a ser equiparados aos membros do governo para efeitos de responsabilização financeira pelos actos político-administrativos por si praticados que se revelem irregulares ou ilegais.

Tenho consideração pelo presidente do TC, contudo, neste caso em concreto, discordo da sua visão.

Passo a explicar o que, no meu ponto de vista, está errado na prática e na linha ideológica do TC.

Os municípios têm nos seus diversos órgãos, isto é, a Assembleia, a Câmara e o Presidente desta última, cristalizações do poder democrático das mais genuínas e transparentes que existem no país. Veja-se que muitas das suas deliberações são escrutinadas em público e em directo, tanto nas reuniões públicas ordinárias dos dois órgãos colectivos referidos, como nas dezenas de encontros descentralizados com as populações onde são debatidas questões vitais para a vida local.

O presidente do executivo municipal e os respectivos vereadores podem e devem, no exercício das suas competências e responsabilidades diárias, dar despacho, deferindo ou indeferindo, dezenas (por vezes centenas) de processos que lhes são presentes pelos serviços camarários. Continuar a ler

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