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pró e anti Trump / Um Ensaio sobre a Cegueira

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Desde as primárias que Trump criou anticorpos com as suas intervenções obnóxias, xenófobas e sexistas. Rejeição perfeitamente justificada por alguém que é uma variante de um político protofascista e é de algum modo imprevisto. Rejeição que foi amplificada por uma comunicação social e redes sociais que apoiavam descaradamente Hillary Clinton e que, desde o primeiro minuto, a favoreceram em relação a Bernie Sanders que começou logo a ser apresentado como psicologicamente instável e um perigoso utópico de esquerda.

Não deixa de ser curioso como se pode ser anti Trump sendo pró Clinton. Ou mesmo que se pretenda branquear as políticas da ex-Secretária de Estado apontando-a, em comparação com Trump, como um mal menor. Trump e Clinton são os dois piores dos males num país em clara decadência política social e económica que é esse o legado de Obama, um fala barato que defraudou todas as expectativas nele depositadas por quem se deixava encantar com a sua lábia, apesar e contra todas as evidências.

Quando se ouve um Robert de Niro muito excitado nas suas invectivas a Trump, fica muita gente em êxtase sem sequer se interrogar porque é o mesmo de Niro nunca surgiu a invectivar Obama quando ordenou a violenta remoção dos manifestantes do Wall Street Ocuppy, ou deu apoio à Al-Qaeda, etc. etc. a lista é longuíssima, ou as acções de Hillary Clinton no Médio-Oriente e na América Latina. Há que haver coerência. Do mesmo modo ficam todos muito indignados ao ouvirem Trump ameaçar de expulsão três milhões de emigrantes latino-americanos e esquecem que Obama expulsou dois milhões e meio. Ou que vai construir um muro na fronteira entre os EUA e o México que não mais é que completar o muro que Obama já tinha posto de pé.

Também não deixa de ser curioso que apareçam nas redes sociais vários intervenientes que elaboram listas com fotografias de pulhas e que entre os seleccionados não apareçam, Obama, Clinton, Kerry tão ou mais merecedores dessa distinção, sobretudo agora quando Kerry publicamente reconheceu, de forma oblíqua na edição do New York Times, clarificada quando o registo gravado da totalidade da entrevista foi publicado no The Last Refuge, que a administração Obama andou a equipar e financiar o Estado Islâmico. Essa gente é surda, cega e muda para um lado e ouve, vê, e lê para o outro lado. Bipolares políticos que, nos melhores casos, tanto podem estar do lado certo como do lado errado.

Quer isto dizer que Trump não é um perigo para o estado do mundo? É, claro que é. A diferença é que é um perigo mais imprevisível do que seria Hillary Clinton se tivesse ganho as eleições. Até talvez bombardeie menos países que Obama que em 2016, despejou três bombas por hora em vários pontos do mundo, os números são do Conselho de Relações Exteriores dos Estados Unidos da América, uma agência governamental.-

Do outro lado temos alguma gente que acaba por apoiar Trump só por ele manifestar o seu apreço por Putin e afirmar que quer melhorar as relações com a Rússia. Não percebem que essa viragem geoestratégica, se vier a acontecer o que é incerto, se inscreve claramente numa manobra de provocar um corte, mesmo que parcial entre a Rússia e a China, para isolar esse país que ele considera a grande ameaça económica aos EUA. Bem lá no fundo desses cenários o que realmente está em marcha é o que já estava em marcha desde algum tempo, a batalha, que pode degenerar em guerra,  entre dois blocos económicos: de um lado o até agora dominante e sem opositor, dirigido pelos EUA integrando a EU e o Japão tendo como braço armado a NATO e do outro o emergente liderado pelos BRICS que, apesar de todas as diferenças entre os seus integrantes, tem conseguido manter unidade. Até onde e de que formas se revestirá essa guerra é que é muito difícil prever, bem como o seu desfecho.

É extraordinário que os argumentos dessas legiões de gente anti-Trump sejam o espelho dos argumentos das legiões pró-Clinton. Todos iguais no essencial, todos diferentes nos pormenores. Um bom exemplo é o das histórias, todas não fundamentadas algumas sem se importarem de ser bem risíveis, da interferência de Putin nas eleições norte-americanas. A divulgação dos mails com as tramas mais canalhas da trupe Clinton para lixar Sanders, desde que ele apareceu e começou a enfrentar a senhora nas primárias até à Convenção Democrática em que ela foi escolhida. Nenhuma ruga de indignação surge. A existência dos mails, a suposta origem da sua divulgação, excita-os. Ficam mudos e quedos quanto ao seu conteúdo que ninguém se atreveu a desmentir. Porquê? Provavelmente porque os mails pouco acrescentam à personalidade intriguista e charlatona de Hillary Clinton que para eles deve ser aceitável, o que é inquietante pela degradação ética que revela.

Logo a seguir um grosso informe sobre como Trump estava nas garras dos russos. Informe obtido por John McCain, personagem da direita mais execrável com um longo historial de alianças com terroristas, que o entregou ao director do FBI e agora, perante o descrédito dessas informações mesmo pelos media mais ferozmente anti-Trump, veste-se de virgem ofendida dizendo que fez o seu dever sem saber se as informações eram credíveis. A sorte dele é que o ridículo não matar. Outro ausente de peso nas galerias fotográficas dos pulhas se houvesse discernimento e coerência.

Acenam com as bandeiras de que Trump é um perigo para a democracia. Será! Mas quem empunha essas bandeiras e está na barricada de Clinton é um perigo igual. Com contornos diferentes, mais de forma que substância, mas rigorosamente igual.

Neste contexto ninguém ou quase ninguém está sequer preocupado em procurar uma explicação racional para a vitória de Trump que é, a traço grosso riscado de forma sintética, a expressão política muito clara do fracasso e da crise estrutural do modelo neoliberal nos Estados Unidos. Todas essas campanhas a favor e contra Trump, chapinhando no pântano em que se transformou a democracia norte-americana, um legado que Obama catalisou, assunto para ser tratado autonomamente, é um bom tema para reescrever o Ensaio sobre a Cegueira. Cegueira de todos os que nela embarcam fazendo juízos políticos, sociais e económicos superficiais, bem enquadrados nas teias da dominante ideologia de direita, mesmo que se digam muito de esquerda. Nem sequer reparam que a grande diferença entre Trump, a administração Trump e os presidentes e administrações dos EUA que o antecederam, é que se antes foi para lá gente que maioritariamente metia a mão no pote, agora estão sentados na Casa Branca os donos do pote.

O mundo é cada vez mais um lugar perigoso mas quando a superficialidade e a cegueira política, tanto pró como contra Trump, se generaliza só o torna ainda mais perigoso.

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ESTRADA PARA ALEPO

 

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Enquanto o exército sírio vai retomando lenta mas seguramente Alepo das garras dos jihadistas do Estado Islâmico, da Frente Fatah Al Cham, que numa rápida cirurgia plástica para se tornar aceitável pelo Ocidente deixou de chamar Frente Al-Nostra, braço da Al-Qaeda na Síria, e uns combatentes de um Exército Livre da Síria que ninguém sabe ao certo quem e quantos são, se é que de facto existem, a estrada para Alepo atafulha-se de gente em pânico por ver os seus desígnios de destruição da Síria esboroarem-se.

A propaganda dos EUA-UE e seus aliados árabes, também conhecida por imprensa livre e informação de referência, afadiga-se a denunciar os bombardeamentos da aviação russa e síria em que mesmo nos dias em que n]ao tem por alvo essa cidade destrói vários hospitais em Alepo-Este, onde os jihadistas estão entrincheirados, fazendo numerosas vítimas civis, muitas delas crianças, contados por um Observatório dos Direitos Humanos para a Síria que tem sede em Londres, cuja principal fonte são uns Capacetes Brancos que quando saem do You Tube e tiram o capacete devem andar a disparar sobre os bairros de Alepo fora do controle do Daesh. Uma curiosidade é não se fazerem contas aos hospitais destruídos pelos media ocidentais. Fica a sensação que só nesses bairros havia um sistema se saúde notável com um número de equipamentos hospitalares raro em qualquer parte do mundo. Por isso não espanta que não se vejam imagens recentes, de ontem, de um hospital de campanha montado em Alepo-Oeste para receber quem foge de Alepo-Este.

Nada que os trave. Como não os travam as diferenças semânticas entre o que se passa em Mossul e em Alepo. Até parece que ou há dois Estados Islâmicos ou que o Estado Islâmico está confinado ao Iraque. Os terroristas em Mossul são rebeldes em Alepo. Os civis que os terroristas usam como escudos humanos em Mossul, são civis acossados pelo exército sírio e seus aliados em Alepo. Os civis vitimados em Mossul pelo exército iraquiano e pela frente liderada pelos EUA, que apoia a ofensiva, são vitimas acidentais e colaterais, enquanto os civis que morrem em Alepo são impiedosamente massacrados pelo exército sírio, seus aliados e pela aviação russa. Em Alepo, dizem eles, a ofensiva está a provocar um desastre humanitário sem precedentes só comparável ao Holocausto, que quando olham para Mossul verificam que a ofensiva se faz quase pacificamente com todo o respeito pelos direitos humanos e pelas convenções internacionais. A lista destas comparações entre as notícias dos media ocidentais e declarações dos representantes diplomáticos dos países da NATO em várias instâncias é quase infindável. Só não é maior porque subitamente um manto de silêncio está a envolver, vá lá saber-se porquê, o que acontece em Mossul.

Ainda mais estranho é a ajuda humanitária necessária para dar conforto aos civis que conseguiram escapar aos terroristas em Alepo, que disparam sem olhar a quem, sobre quem tenta fugir-lhes pelos corredores humanitários abertos, não ser distribuída aos refugiados que conseguiram fugir, insistindo-se num cessar fogo para fazer chegar essa ajuda aos territórios ainda em posse do Estado Islâmico. Ninguém, nos media ocidentais estranha esse sucesso nem a duplicidade da diplomacia ocidental que se intensificou agora para salvar os restos dos terroristas que continuam a bombardear as zonas que já estavam na posse do exército sírio e as que foram recentemente libertadas. A hipocrisia e o cinismo não conhecem fronteiras, Até se afadigam em calar ou desacreditar os relatos dos missionários cristãos que estão no terreno, como se assistiu por cá com o testemunho da freira missionária Guadalupe que só agora estão a surgir dada a situação no terreno ser cada vez mais desfavorável aos jihadistas.

Mas a estrada para Alepo não se fica pela Síria. É uma longa rota que está em todo o mundo, tem sinaleiros a cada curva, abre os semáforos a qualquer sucesso. A última mais sonante foi a morte de Fidel de Castro. Da direita, da grossa à envernizada, à esquerda pinóquio do grilo, ouviram-se e leram-se as coisas mais extraordinárias. Desde a mentira mais que provada ser mentira de Fidel ser um multimilionário até à mais vulgar observação que os milhares de cubanos que o homenageavam estavam a homenagear um ditador, um tirano, facto inédito em qualquer parte do mundo. Só faltou dizer que quem ficasse em casa ou saísse das filas era imediatamente fuzilado ou que atrás de cada três cubanos havia um comissário político a vigiá-los. Em Portugal o ponto alto foi alcançado pelo delírio etílico de um conhecido e celebrado comentador que descobriu que Fidel tinha destruído uma nação que era a mais próspera da América Latina e do Sul, coisa que só a Mafia seria capaz de dizer, nem sequer os mais empedernidos direitinhas.

Por cá, como em todo o mundo, a estrada para Alepo está sempre em construção. A toda a hora, a cada segundo. Basta ligar a televisão nos intervalos dos jogos de futebol e dos inúmeros programas a falar de futebol.

Muitas pedras tem a estrada para Alepo e muitas mais estão de reserva prontas a continuar a construir esta auto-estrada com múltiplas bifurcações em que se nega tudo, mesmo as próprias evidências, para manipular universalmente a opinião pública e manter um estado de alienação generalizado.

A estrada para Alepo, que essa gente percorre como formigas que não saem do carreiro, nunca encontrará a estrada para Damasco por lhe desconhecer o significado. É um túnel sem luz, sem que se vislumbre uma qualquer bruxuleante luz ao fundo.

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EUA votam contra condenação do nazismo

 

 

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fotomontagem de John Heartfield

 

Anda o Prémio Nobel da Paz 2009, Barack Obama, a fazer o seu último périplo europeu como Presidente dos EUA, pregando os valores do mundo livre e da democracia e no Comité dos Direitos Humanos da ONU, os Estados Unidos da América, ainda sob a sua liderança e seguindo as linhas mestras dessa liderança, votaram contra uma resolução que condenava a glorificação do nazismo. Ao seu voto contra juntaram-se a Ucrânia e o Palau.

A resolução tinha o objectivo de  “Combater a glorificação do Nazismo, Neonazismo e outras práticas que contribuem para alimentar formas contemporâneas de racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância relacionada”. Texto que muito incomodou a administração Obama que na declaração de voto considerou votar contra “Devido ao âmbito excessivamente estreito e natureza politizada desta resolução, e porque exige limites inaceitáveis à fundamental liberdade de expressão, os Estados Unidos não podem apoiá-la”. A hipocrisia, o cinismo não conhecem limites e acabam, mais cedo ou mais tarde, por se revelar em todo o seu esplendor. Compreende-se perfeitamente que um governo dirigido por um Prémio Nobel da Paz que foi dos presidentes dos EUA que mais países bombardeou, o exemplo mais flagrante é a Líbia que tantas alegrias provocou na sua secretária de Estado Hillary Clinton “Viemos, vimos e matámos”, que mais guerras directas ou por procuração provocou, o Médio-Oriente é o caso mais evidente, que mais intervenções em países estrangeiros fez, apoiando e financiando golpes de estado como nas Honduras ou na Ucrânia, não poderia condenar o nazismo. Todos os sofismas seriam válidos para votar contra tal resolução. A memória do apoio que o grande capital, sem nacionalidade nem credos, deu a Hitler não permitia tal desaforo, aprovado por 131 votos a favor, três contra e 48 abstenções. O voto dos EUA causa sérias apreensões. É bem revelador do que está nos alicerces do pensamento único dominante.

Este voto, é um voto que ajuda a impulsionar as direitas mais radicais. Quem se preocupa seriamente com o ascenso dessas direitas mais radicais em todo o mundo devia estar cada vez mais preocupado com o sistema de vasos comunicantes que as aduba. Com o crescimento do capital financeiro parasitário que tem provocado o obscuro enriquecimento de uma minoria cada vez mais minoria que se apoia num poderoso complexo militar-industrial, domina uma máquina brutal de desinformação e alimenta um pântano de descontentamento onde germinam os ovos da serpente fascista.

A preocupação justifica-se plenamente e deve unir todos os que querem combater este estado de coisas, que tem as mais diversas e variadas formas mas uma raiz comum. Muitos preocupam-se mas afogam-se na espuma, sem mergulhar nas águas profundas. As análises e os comentários às últimas eleições nos EUA são a evidência da confusão que por aí anda à rédea solta, gerada por enormes e sinceras preocupações mas sem conseguirem fazer uma radiografia mais fundamentada, ainda que sem tempo de distanciação para prever todas as suas consequências. Sem perceberem porque é que o mundo é cada vez mais um lugar perigoso e mais aberto às agressões imperialistas que não tem pejo em fazer as alianças mais espúrias na luta pela sobrevivência de um sistema mergulhado em profunda crise.

A não condenação do nazismo é bem denunciadora dos estados de alma do imperialismo e da ausência de qualquer travão que ainda salve as aparências. Quem não condena o nazismo acaba por ser seu cúmplice, por mais penas democráticas que cole no alcatrão das suas vestimentas e por mais cores que essas vestimentas tenham. Actualmente, como escreveu recentemente Jorge Cadima “uma coisa é certa: seja nos EUA ou na UE, a palavra de ordem é militarizar. Os povos nada têm a esperar dos defensores do grande capital, a não ser exploração, miséria e guerra.”

jh

fotomontagem de John Heartfield

 

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