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AS TROMBETAS DO APOCALIPSE NAS MARCHAS ANTICOMUNISTAS

Fotomontagem de John Hearfield, Agosto1934 . Friedich Ebert, (1871-1925) presidente do Partido Social/Democrata da Alemanha, Chanceler da Republica de Weimar. um dos responsáveis pelo assassinato dos dirigentes comunistas Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht. A Fundação do Partido Social/Democrata da Alemanha ostenta o seu nome, bem conhecida pelo apoio que dado aos partidos socialistas e sociais/democratas da Internacional Socialista. Paul von Hinderbug,(1897-1934) presidente da Republica da Alemanha que nomeou Hitler chanceler

O anticomunismo exibe-se abundantemente na comunicação social corporativa nas mãos da plutocracia nacional que se estende à comunicação social dita de serviço público com o seu longo rol de serventuários do pensamento dominante. Ainda existem umas cada vez mais raras excepções que passam pelas malhas da censura mascarada de critérios jornalísticos ou ainda com mais descaro na apregoada qualidade e independência jornalística coisa que nessas redacções até já foi removida dos caixotes de lixo.

O anticomunismo exibe-se de formas variegadas, nos últimos tempos tem sido um ver que te avias. A Festa do Avante! anunciada para Setembro deste ano num contexto complexo tem sido o grande bombo dos arraiais noticiosos. Vale tudo desde o ser uma fonte de sistemáticos prejuízos (Expresso) até ser a segunda maior fonte de receitas do PCP (Sic). O mesmo Expresso utiliza foto de montagem da festa para ilustrar uma notícia sobre o Covid-9. De repente uma festa em que, nos noticiários dos anos anteriores, era um resíduo cultural entre garfadas dos restaurantes onde as provectas idades eram o traço geral de gente a sonhar com os amanhãs que cantam ( que quer essa malta que os amanhãs façam? que ladrem, uivem juntando-se aos seus afinados coros?) desagua num mar de milhares de pessoas todas potencialmente portadores do coronavirus, pior de coronavirus vermelhos muitíssimo mais potentes.

Esse anticomunismo alarve de antanho, de hoje e dos dias seguintes refina-se num anticomunismo envernizado mais subtil mas igualmente activo. Conhecido o das adjectivações que se colam aos militantes comunistas e aos ex-comunistas. Mesmo os que abandonaram o Partido ficam classificados em duas categorias que vão variando com o correr do tempo: aqueles em que a antiga militância comunista ainda está dentro do prazo e aqueles em que essa militância já está fora de prazo, em conformidade com as aleivosias dos contextos das artigalhadas.

Na área das subtilezas pouco subtis (passe o pleonasmo) as fúrias dessa gente a agitar as bandeiras anticomunistas é contumaz. Vulgar, vulgaríssimo são as iniciativas legislativas do PCP na Assembleia da República serem preteridas a favor do Bloco de Esquerda. Já se chegou ao cúmulo de para justificar uma iniciativa legislativa do PCP, não se ouvir nenhum deputado comunista mas a coordenadora do BE que não tendo apresentado nenhuma proposta de decreto-lei estaria na disposição de votar favoravelmente. Então quando são iniciativas similares mesmo que as do Partido tenham antecedido as do BE é um ver que te avias, a maioria das vezes nem referem as do P.

Mais sornas são outras manobras. Recentemente quando Rita Rato foi seleccionada por um júri para dirigir o Museu do Aljube a sua militância no PCP era impressa em todas as insidiosas notícias que inundaram os media com um anticomunismo larvar, agora quando morre Fernanda Lapa a militância no PCP é rasurada na palidez esquálida do activismo em defesa do teatro, das mulheres, da dignificação humana. Conforme lhes dá jeito rasgam o cartão aos militantes do Partido para os fazer passar por activistas de causas sem filiação partidária o que está na moda e dentro dos padrões da democracia liberal. Não é um acaso os activismos de vários géneros serem largamente subsidiados pelas Fundações Soros, Rockfeller, Ford, Bill Gates, etc. Apagar a militância comunista da Fernanda Lapa em favor do activismo é também uma forma de ocultar as lutas por uma mudança social radical que não se reduz a mudanças de atitude social, por mais importantes que sejam.

Essa gente dos media não têm uma gota de honestidade, uma ruga de moral e ainda tem o desaforo, o imenso descaramento de se escudarem na pretensa ausência de novidades nas áreas do PCP (esta das novidades tem muito que se lhe diga. Lembre-se como um dia Álvaro Cunhal na televisão com o seu imenso humor desmontou essa farsa montada por uma jornalista que insistia em saber alguma coisa da sua vida pessoal « mas o quer saber? Se coso os botões das minhas camisas?») para justificar o PCP, os seus dirigentes e militantes ocuparem um substancial menor número de horas nos noticiários, mesmo contando com as horas em que se destila anticomunismo.

No horizonte, o fascismo mesmo que seja um fascismo de tipo novo numa deriva do totalitarismo invertido um sistema em que esta comunicação social, a clássica e a nova através da internet e das redes sociais, e pelas indústrias culturais e criativas que são dos seus pilares mais importantes e que se caracterizam por uma progressiva concentração. Um sistema, repita-se e sublinhe-se as vezes que forem necessárias esses seus traços nucleares, que se apura para que os cidadãos sejam totalmente impotentes e a alienação global seja uma alienação consentida. É o que Sheldon Wollin classifica de “totalitarismo invertido” que não tem rosto, é anónimo corporizado por dirigentes políticos que são marcas comerciais dos Estados completamente enfeudados às grandes empresas, em que há uma crescente indiferenciação ideológica e programática entre partidos de sectores das esquerdas tradicionais revisionistas e de direita que reduzem a sua acção e medem a sua representatividade pelos resultados da competição eleitoral em que a democracia representativa deixou de ser lugar de debate ideológico. «O governo não precisa acabar com a dissidência. A uniformidade da opinião pública imposta através da media corporativa faz um trabalho muito eficaz» escreve Wollin esclarecendo que «as elites, especialmente a classe intelectual, foram compradas por meio de uma combinação de contratos governamentais, fundos corporativos e fundações, projetos conjuntos envolvendo pesquisadores universitários e corporativos. Com doações de indivíduos muito ricos, universidades (especialmente as chamadas universidades de pesquisa), os intelectuais, os estudiosos e os pesquisadores foram perfeitamente integrados ao sistema (…) Nenhum livro é queimado, nenhum Einstein permanece na condição de refugiado (…) mas no totalitarismo invertido, o inverso é verdadeiro, a economia domina a política e com essa dominação surgem formas diferentes de crueldade (…) Os Estados Unidos tornaram-se a vitrine de como somos tolerados como cidadãos, apenas enquanto participamos da ilusão de que vivemos numa democracia participativa. No momento em que nos rebelamos e nos recusamos a participar dessa ilusão, o rosto do totalitarismo invertido parecerá o rosto dos sistemas totalitários do passado.» Já Orwell tinha avisado que «para sermos corrompidos pelo totalitarismo não temos de viver num país totalitário»

Essa gente que pulula na comunicação social são os mercenários das oligarquias, os serventuários dos plutocratas a abrir caminho para os novos fascismos por mais que desfraldem ao vento as esfarrapadas bandeiras da liberdade e da independência jornalística ao serviço do totalitarismo invertido. Honra ainda a quem, contra os critérios dominantes, ainda consegue fazer investigação séria, que só vê a luz do dia quando interessa dar credibilidade ao lixo dominante.

Fotomontagem John Heartfield, marco 1934 O slogan do partido nazi Sangue e Aço
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J'Accuse

Nos tempos pós-modernos Zola teria sido passado a ferro. Teria muitos intelectuais ao seu lado mas sem a força e muito menos a unidade com que se fizeram ouvir no caso Dreyfus.

Fotograma do filme «J'Accuse» (2019), realizado por Roman Polanski a partir de um romance inspirado no caso do oficial francês Albert Dreyfus, de origem judaica, acusado de traição à Pátria por círculos militares anti-semitas.
Fotograma do filme «J’Accuse» (2019), realizado por Roman Polanski a partir de um romance inspirado no caso do oficial francês Albert Dreyfus, de origem judaica, acusado de traição à Pátria por círculos militares anti-semitas. Créditos

J’Accuse, o filme de Roman Polanski, recupera o título da carta que Emile Zola publicou no jornal L’Aurore a 13 de Janeiro de 1898, dirigindo-se ao presidente da República Francesa, Félix Faure, acusando membros do aparelho militar e do governo de cumplicidade na forjada condenação por traição de um inocente, o oficial de artilharia Alfred Dreyfus, um dos poucos judeus que faziam parte do exército, acusado de alta traição. Pelo crime, julgado à porta fechada, o capitão é sentenciado à prisão perpétua no presídio da Ilha do Diabo, na Guiana Francesa. Será mais tarde amnistiado e deixa a prisão, apesar de continuar a ser considerado culpado. Só em 1906 Dreyfus é reabilitado e reintegrado no exército.

Foi um caso que agitou toda a França depois da carta de Zola, que será condenado a um ano de prisão, a 3 000 francos de multa e ao exílio em Inglaterra, de onde só será autorizado a regressar depois da reabertura do processo.

O que interessa aqui é assinalar a movimentação intelectual e cultural originada pelo caso Dreyfus. É o centro de um livro de Roger Martin du Gard, O Drama de João Barois, livro bastante esquecido que deve ser relido por equacionar questões entre a religião e a ciência, da inteligência contra a força bruta, as contradições da justiça humana, as relações entre o social e o individual, questões que andam muito arredadas de muita da literatura contemporânea, sendo sempre de relembrar Terry Eagleton: «hoje em dia tanto a teoria cultural quanto a literatura são bastardas (…) pela primeira vez em dois séculos não há qualquer poeta, dramaturgo ou romancista britânico em questão de questionar os fundamentos do modo de vida ocidental». Britânico e de qualquer parte do mundo. As excepções confirmam a regra.

Em França, a carta de Zola denunciando a iniquidade do julgamento de Dreyfus gerou um grande movimento de artistas, advogados, universitários, arquitectos, médicos, músicos, escritores, nomes publicamente conhecidos que assinaram protestos no Aurore Littéraire, juntam-se num manifesto publicitado por Julien Benda. Georges Clemenceau, chefe de redacção do jornal, vê nessa convergência entre tantos especialistas de primeiro plano em áreas tão diversas, «um sinal, no facto de todos esses intelectuais chegados dos horizontes mais diversos, se unirem em torno de uma ideia», a defesa de valores mais importantes ainda que ameaçados pelas acções da autoridade do Estado. O conceito forjado por Clemenceau, intelectuais, parte da constatação de esse grupo tão diversificado de portadores de saberes especializados superarem as suas especializações e qualificações profissionais por se sentirem obrigados a intervir no espaço público para falar em nome da sociedade no seu conjunto.

Regis Debray irá defini-los como «uma colectividade de pessoas, socialmente legitimadas para tornarem públicas as suas opiniões pessoais sobre os assuntos públicos, com dispensa dos procedimentos cívicos regulares que se impõem aos cidadãos comuns»1. Nesse conceito de intelectuais convergiam duas tendências. A primeira era a superação em que a especialização dos saberes os tinha acantonado corporativamente encerrando-os praticamente na exploração dos seus conhecimentos específicos, distanciando-os das questões sociais mais vulgares. A segunda era reentrarem na cena pública, numa altura em que a política começava a ser uma actividade a tempo inteiro, superando os seus interesses profissionais e pessoais, para influenciar as decisões políticas analisando-as sobretudo do ponto de vista ético, criticando-as, procurando corrigi-las. Os intelectuais recuperavam as potencialidades e a capacidade de intervenção que tinham sido proclamadas na filosofia iluminista, e que outrora, efectiva ou supostamente, tinham gozado.

Transponha-se a carta de Zola e o manifesto que a carta promoveu para a actualidade. A maioria da comunicação social mainstream, ignorá-los-ia. Talvez um ou outro deles publicasse excertos, desvirtuando-os. O manifesto seria remetido para as redes sociais. Os seus autores, intelectuais e outros não considerados nesse grupo, conseguiriam impacto junto da opinião pública circulante nessa área, mas embateriam no silêncio dos media. Na melhor das hipóteses Zola iria a uma televisão onde lhe dariam uns 15 segundos, entalado entre uma notícia de uma catástrofe qualquer e outra desportiva ou de um sucesso de um famoso. No violento ruído do mundo, o estado de sítio em que vivemos, a sua diluição seria procurada entre fake news, teorias conspirativas, populismos de várias estirpes, o mundo viral em que estamos mergulhados, que contamina a atmosfera.

Manifestantes fora do tribunal de magistrados de Westminster. O fundador do WikiLeaks, Julian Assange, enfrenta uma audiência sobre um pedido de extradição dos EUA por alegadamente conspirar para “hackear” um computador do Pentágono. Londres, Inglaterra, 2 de Maio. CréditosFrank Augstein /

Se Zola fosse vivo não temos dúvidas que escreveria um J’Accuse denunciando a perseguição a Julian Assange ou a Peter Handke. Denunciaria a farsa do julgamento a que está a ser submetido o primeiro, num tribunal presidido por uma lacaia do imperialismo. Já teria denunciado a perseguição que sofreu desde que delatou publicamente as práticas criminosas dos Estados Unidos para imporem ao resto do mundo a sua super-dominação no espaço geopolítico global. Fê-lo sem nunca procurar recompensas nem protecções judiciais. Fê-lo como um acto de cidadania e defesa da liberdade de informar. Leia-se o interessantíssimo livro de Juan Branco Assange: L’Antisouverain2, em que o soberano é o aparelho de estado. Foi imediatamente perseguido pelos EUA, a primeira linha de ataque foi assumida por Hillary Clinton e Obama, logo apoiados pelos neo-cons e pela subserviente comunicação social anglo-saxónica que contumazmente, não o podendo desmentir, o vilipendiaram e hoje praticamente não noticiam as miseráveis condições de detenção a que foi sujeito nem a farsa do seu julgamento. Os intelectuais não agiram como um grupo, ainda que heterogéneo, como aconteceu com o caso Dreyfus. As petições para a sua libertação ocorrem na internet e não têm eco nos media, como seria de prever por serem na sua esmagadora maioria vozes vendidas ao dono.

Na foto, Peter Handke assiste ao funeral do ex-presidente sérvio Slobodan Milošević, em Março de 2006. Handke foi uma das vozes críticas da guerra de agressão levada a cabo em 1999 pelos EUA e pela NATO contra a Sérvia. O escritor, dramaturgo, ensaísta e realizador austríaco foi recentemente galardoado com o Prémio Nobel de 2019. CréditosPetar Pavlovic / AP

Peter Handke, assim que denunciou a guerra dos Balcãs para desagregar a Jugoslávia – leiam os livros dos generais Carlos Branco3 e Raul Cunha que durante integraram o grupo de observadores internacionais da ONU nos Balcãs – e depois quando fez o elogio fúnebre de Milosevic, que tinha sido extraditado à revelia das leis e decisões do Supremo Tribunal do seu país, entregue ao Tribunal Penal Internacional para a Jugoslávia, instituído por influência dos EUA – que a ele não se sujeita – e que acabou por absolvê-lo por considerar não existirem provas que permitissem qualquer acusação, sofreu a mesma sorte sem que houvessem petições públicas nem notícias que, pelo menos, o deixassem justificar as suas posições. Agora, quando lhe foi atribuído o prémio Nobel da Literatura, houve quem tivesse o descaro de o depreciar, menorizando mesmo a sua importância enquanto escritor, curiosamente os mesmos que aparentemente são defensores da autonomia das artes, a sua não contaminação pela política e pela vida social. Mas foram tirar do baú todas as aleivosias e todas as mentiras, que propalaram durante anos, para agitarem a opinião pública contra a decisão do Comité para a Literatura do Nobel. Vários intelectuais alinharam nessa farsa trágica. Seria espantosa a hipocrisia, o cinismo e a subserviência de muitos intelectuais ao pensamento único se não se estivesse atento aos colunistas que por esse mundo fora são escolhidos a dedo ao serviço do satus quo para justificar a qualquer custo os actos americanos que os querem impor enquanto função regulatória para o resto do mundo, para a normalizar tornando-a natural. Como sempre as excepções, as raras excepções confirmam a regra.

«Zola à saída do tribunal» (1898), óleo sobre tela, 81 x 109,5 cm, do pintor belga Henry de Groux (1866-1930), Médan, Casa de Émile Zola. O quadro, também conhecido por «Zola ultrajado», evoca a turba nacionalista e anti-semita que o escritor teve de enfrentar em Fevereiro de 1898, à saída do tribunal onde fora processado por aqueles que acusara no seu célebre manifesto. A integridade física de Zola, nesse dia, apenas foi mantida graças à sua defesa por outros «dreyfusards», entre os quais o próprio pintor. CréditosBNF / Casa de Émile Zola

Esta nova ordem, fanática e totalitária, considera fundamental que os intelectuais, especialistas e profissionais qualificados que não conseguiram agenciar para seus arautos, sejam elementos passivos das suas competências, remetidos às suas áreas especializadas, tendo por exclusivos interlocutores os seus pares e não a sociedade, para perderem influência na construção da consciência colectiva.

Nos tempos pós-modernos Zola teria sido passado a ferro. Teria muitos intelectuais ao seu lado mas sem a força e muito menos a unidade com que se fizeram ouvir no caso Dreyfus. Desde os anos 60, com advento do mercado sobre a cultura e os vários episódios da Guerra Fria Cultural – leiam-se os documentos da CIA, que embora libertados sob tutela e a contagotas, são suficientemente reveladores – houve todo um trabalho de desagregação dos intelectuais e de desmantelamento da esquerda intelectual até se atingir o ponto crítico actual.

Há um gigantesco trabalho a fazer para que os intelectuais façam novamente ouvir a voz que já tiveram no discurso público, ainda que com a consciência de que se essa não é decisiva é fundamental para se sobrepor à turbulência ruidosa do pensamento dominante que procura tornar inaudível qualquer discurso crítico que a ponha em causa. Para readquirirem o sentimento do seu papel social mesmo com a incertitude de não terem no imediato sucesso garantido.

  • 1.Debray, Régis, Le Pouvoir Intellectuel em France, Editions Ramsay, 1979
  • 2.Branco, Juan, Assange L’Anti-Souverain, les Editions du Cerf, 2020. O leitor que tenha dificuldade em encontrar o livro nas nossas livrarias – e terá – poderá encomendar a versão e-book do mesmo, publicada pela Rakuten Kobo.
  • 3.Ver A Guerra nos Balcãs: jihadismo, geopolítica e desinformação. Vivências de um oficial do Exército Português ao serviço da ONU, Edições Colibri 2016; e A guerra na antiga Jugoslávia vivida na primeira pessoa: testemunhos de militares Portugueses ao serviço das Nações Unidas / The Yugoslav Wars in the First Person: Testimonies of Portuguese soldiers serving with the United Nations, Edições Colibri, 2018, português/ inglês, com Luís Eduardo Saraiva e Henrique Santos.
  • Cunha, Raul, Kosovo, A Incoerência de uma Independência Inédita,Edições Colibri 2019

(publicado em AbrilAbril https://www.abrilabril.pt/ )

TÓPICO

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Insónias!

 

Salvador dali

Os últimos tempos tem sido de grandes preocupações para Catarina Martins. Só noite de insónias com o Tsipras e uma caixa de sapatos cheia de fotografias das meninas BE em efusivos beijos e abraços, escondido num armário lá de casa. Tem sido um desatino. No plano internacional, a Venezuela e aquela eleição para a Assembleia Constituinte “que não é democrática” porque na Venezuela não estão garantidas condições de liberdade e de pluralidade e há também uma enorme ingerência externa que condiciona muitas decisões que são tomadas e, portanto, sobre todos os pontos de vista diria que não estamos a olhar para uma situação democrática”, mas que raio de quem é a “enorme ingerência externa”? Os venezuelanos não deviam votar por causa da “enorme ingerência externa”? Uma boa ideia que não teve eco na Venezuela, foram votar e elegeram uma assembleia Constituinte! Uns estúpidos que se fizeram bem em não ouvir Trump, deviam ter ouvido o BE e a sua coordenadora. O que ela não diz é que a Venezuela está num imenso impasse porque Chavez e Maduro nacionalizaram o petróleo, o que permitiu redistribuir riqueza e dar enormes benefícios a milhões de venezuelanos que melhoraram substancialmente as suas condições de vida, enquanto o petróleo estava em alta, mas deixaram que 200 famílias de oligarcas continuassem a controlar 80% da riqueza da Venezuela com o imenso poder de controlar importações e exportações. Muito menos dizem que essas políticas, como foi amplamente noticiado sobretudo em Espanha, derivaram dos bons conselhos dos seus assessores do Podemos de Pablo Iglésias que substituiu nos braços das meninas do BE, Tsipras.

Angola também muito a preocupa, não porque as eleições fossem fraudulentas, viciadas mas porque “era bom que estas eleições fossem uma mudança, sabemos que não serão ainda, mas também sabemos que há uma nova geração muito empenhada numa mudança política em Angola que vai fazendo o seu caminho”. Aquela malta com tantos activistas a perorarem, dinheiro do Soros, o fraternal apoio das meninas e dos meninos do BE e os seus bons exemplos e não desemburram. Ficam atolados no empenho, nada de se fazerem ao caminho que as passadeiras da comunicação social lusitana lhes estendem para vencerem as distâncias marítimas. Uma frustação e muitas t-shirts nos sacos recicláveis dos supermercados das modernidades da esquerda pasta de sardinha e vinho rosé.

E agora a AutoEuropa, que tanto preocupa Catarina Martins que faz uma greve com uma adesão massiva que parou a produção o que espantou Chora esse sindicalista histórico do BE

Porque é que o homem se reformou depois de tão notável trabalho na Comissão de Trabalhadores?

Um sindicalista exemplar como muito claramente explicou o doutorando António Damasceno Monteiro, que foi director de Recursos Humanos da AutoEuropa num ensaio publicado na Análise Social em que explicou sem fas nem nefas a relação do Chora com a administração e os quadros dirigentes da empresa. Um sindicalista, o orgulho do BE, bem mais qualificado e com outro jogo de cintura  que o Carlos Silva da UGT apesar do carinho que nutria e nutre pelo Ricardo Salgado não tem, como se pode ler neste item do ensaio do Damasceno Monteiro onde explica como a AutoEuropa é um modelo de produção pós-fordista, desde que existam choras! Os sublinhados são meus.

9.4. A RELAÇÃO COM A COMISSÃO DE TRABALHADORES

A opção por uma relação privilegiada com a comissão de trabalhadores pressupôs que a escolha dos membros que integrariam esta futura estrutura representativa não fosse deixada ao acaso! Quando se começou a pressentir o desejo de constituição desta estrutura, provavelmente estimulada pelos membros ligados aos sindicatos da CGTP — muitos deles eram desconhecidos formalmente por não quererem revelar a sua identidade —, a empresa rapidamente «entrou em jogo». Contactou sigilosamente o director de cada uma das áreas para que este indicasse nomes de trabalhadores de «confiança» que pudessem integrar a futura estrutura. A escolha de um «líder» para esta comissão que inspirasse a capacidade de defesa dos interesses dos restantes colegas e que, simultaneamente, revelasse à empresa as informações necessárias foi ainda o aspecto mais difícil de ultrapassar. Tudo isto acabou por ser obtido através de um convite dirigido a um membro que mostrava enorme capacidade de persuasão dos colegas e que era permeável a uma forte influência. Foi com este dirigente da comissão de trabalhadores que a empresa estabeleceu uma entente cordial e que permitiu, na véspera dos grandes embates, conhecer antecipadamente, através de uma reunião sigilosa entre ele e o director de Recursos Humanos, quais os pontos que seriam objecto de análise na reunião do dia seguinte e a provável maneira de os ultrapassar. Nas eleições para a constituição desta comissão acabaram por aparecer duas listas: uma integrada e liderada por delegados sindicais afecta à CGTP (lista A) e outra constituída, preparada e devidamente suportada pela empresa em sessões de esclarecimento realizadas para o efeito (lista B). Esta segunda lista, inicialmente defendida pelo grupo de trabalhadores independentes de que já se falou — mas que não integravam a lista —, teve uma dupla missão: viabilizar não só uma estratégia de consenso, como anular a força veiculada pelos sindicatos. O risco que a empresa correu foi grande, mas a encenação, o planeamento e a capacidade persuasora e manipuladora de encenação, de alguns gestores permitiram um enorme êxito.

As eleições tiveram lugar em Abril de 1994 e os resultados foram os seguintes:

Trabalhadores inscritos 1 252 Votantes 843 (67,33%) Abstenções 409 (32,67%) Votos brancos44 (5,22%) Votos nulos9 (1,o7%) Lista A 261 (30,96) Lista B 529 (62,75%)

Com estes resultados, a lista afecta à CGTP elegeu três elementos e a lista B oito elementos, o que significava que a empresa se manteria soberana nas relações laborais a estabelecer. Em Abril do ano seguinte voltaram a realizar-se eleições para a comissão de trabalhadores face à transitoriedade do mandato da primeira comissão eleita. Os elementos afectos aos sindicatos da CGTP que no ano transacto haviam pensado ganhar facilmente as eleições optaram por fazer uma lista única com uma parte significativa dos anteriores trabalhadores eleitos pela lista B.

A proporção dos candidatos manteve-se a mesma, apesar de os trabalhadores se terem distanciado significativamente do acto eleitoral, optando a maioria por não votar, como se depreende dos números seguintes:

Trabalhadores inscritos 2367 Votantes 1105(46,65%)Abstenções1262(53,32%) Votos brancos 89 83,76%)Votos nulos 25 (1,05%)Lista única 991 (41,86%)

Os passos iniciais que acabaram por criar um modelo de orientação e de relacionamento permitiriam a paz social idealizada pela empresa.

Só preocupações para a Catarina Martins e para o BE! Noites de insónia que nem os ansiolíticos que a comunicação estipendiada lhes dá em doses cavalares, valha-lhes isso que muito os sustentam, acalmam suficientemente embora continuem a impulsionar o vento fresco que revolteia nas cabeças dessa gente gira.

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O Sono da Razão gera Monstros

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gravura de Goya

Que Donald Trump tenha ordenado bombardear uma base aérea síria com argumentos na base de informações “credíveis” que disse dispor, sem sequer solicitar autorização ao Congresso, como no mínimo e sem correr grandes riscos, deveria ter feito, não pode causar admiração a ninguém. Obama fez o mesmo quando mandou bombardear a Líbia. Ambos dispensaram-se desse trabalho e do mais elaborado trabalho de arranjarem um Colin Powell com provas das fábricas de destruição maciça que nunca existiram. Agora, na Síria, Trump atirou para as urtigas o desmantelamento do arsenal de armas químicas que os sírios possuiam e que foi destruído sob supervisão da ONU. Um proto-fascista do seu calibre, que se auto proclama campeão dos países civilizados, o que não deixa de ser uma boa piada, não se detém nesses pormenores. Como não se detém Hillary Clinton ou John McCain, ambos opositores declarados de Trump, que rapidamente lhe renderam homenagem e aplauso. Claro que também teve conforto no ocidente de Hollande, Merkel, Erdogan e outros tantos, na esteira de Blair, Aznar e Durão Barroso. Ninguém se preocupa ou preocupou em saber o que de facto aconteceu com as armas químicas em Khan Cheikhoun, sabendo-se muitíssimo bem que os terroristas as têm usado e têm arsenais de armas químicas como os que foram encontrados em Aleppo. A hipocrisia e o cinismo dessa gente é bem conhecido, está bem montado e bem suportado por uma comunicação social mercenária a nível internacional, é ler as notícias sobre os ataques a Mossul, compará-los com os que fizeram em relação a Aleppo.

O que é mais interessante e significativo, percorrendo os activos sujeitos das redes sociais em Portugal é o silêncio de todos os que se têm esfarrapado e continuam a esfarrapar em alta grita contra Trump, os seus próceres europeus, Le Pen, Farage, Geert Wilders, Frauke Petry e mais uns tantos e que agora não se indignam, chegando mesmo à desfaçatez de  apoiar a iniciativa de Trump, com mais ou menos vergonha e retóricas risíveis. Muita dessa gente diz-se de esquerda. Parece estar sempre na primeira linha da denúncia do ascenso das direitas no mundo, um perigo real, enquanto não há bandeira de uma qualquer luta fracturante que não agitem. Não há um acontecimento em qualquer parte do mundo que não os comova e suscite adjectivações loquazes e violentas. Desfilam  comentários e fotografias para legendarem execrações de políticos que abominam, metendo no mesmo saco o que não deve ser metido no mesmo saco e não metendo nesse saco quem deveriam meter.

A sua miopia política é inquietante. Mais inquietante ao pensar no que farão se um dia surgir nesta terra de falsos brandos costumes uma variante do dinossaúrio excelentíssimo. Devem estar confiantes numa manhã de nevoeiro ou num qualquer milagre de Fátima. Nem percebem que os zigue-zagues políticos em que se embrulham estão a contribuir para esse peditório que já está a ser feito. É ler muitos dos comentários que por aí se plantam nas notícias dos media. É percorrer, mesmo na diagonal, muito do que viaja nas redes sociais. Objectivamente vão dando o seu óbolo com os comentários que decoram as suas intervenções. A direita sabe, bem sabe, que a maioria dessa gente será metida na ordem com uns safanões a tempo.

Inquietante é perceber o que isso representa do triunfo actual da ideologia de direita, um cancro que não é um exclusivo da direita. Muita esquerda está contaminada, alguma em estado terminal. Esse é que é um perigo concreto e bem real. O sono da razão gera monstros que, pelo menos alguns, o percebam a tempo.

goya

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ESTRADA PARA ALEPO

 

tunel

 

Enquanto o exército sírio vai retomando lenta mas seguramente Alepo das garras dos jihadistas do Estado Islâmico, da Frente Fatah Al Cham, que numa rápida cirurgia plástica para se tornar aceitável pelo Ocidente deixou de chamar Frente Al-Nostra, braço da Al-Qaeda na Síria, e uns combatentes de um Exército Livre da Síria que ninguém sabe ao certo quem e quantos são, se é que de facto existem, a estrada para Alepo atafulha-se de gente em pânico por ver os seus desígnios de destruição da Síria esboroarem-se.

A propaganda dos EUA-UE e seus aliados árabes, também conhecida por imprensa livre e informação de referência, afadiga-se a denunciar os bombardeamentos da aviação russa e síria em que mesmo nos dias em que n]ao tem por alvo essa cidade destrói vários hospitais em Alepo-Este, onde os jihadistas estão entrincheirados, fazendo numerosas vítimas civis, muitas delas crianças, contados por um Observatório dos Direitos Humanos para a Síria que tem sede em Londres, cuja principal fonte são uns Capacetes Brancos que quando saem do You Tube e tiram o capacete devem andar a disparar sobre os bairros de Alepo fora do controle do Daesh. Uma curiosidade é não se fazerem contas aos hospitais destruídos pelos media ocidentais. Fica a sensação que só nesses bairros havia um sistema se saúde notável com um número de equipamentos hospitalares raro em qualquer parte do mundo. Por isso não espanta que não se vejam imagens recentes, de ontem, de um hospital de campanha montado em Alepo-Oeste para receber quem foge de Alepo-Este.

Nada que os trave. Como não os travam as diferenças semânticas entre o que se passa em Mossul e em Alepo. Até parece que ou há dois Estados Islâmicos ou que o Estado Islâmico está confinado ao Iraque. Os terroristas em Mossul são rebeldes em Alepo. Os civis que os terroristas usam como escudos humanos em Mossul, são civis acossados pelo exército sírio e seus aliados em Alepo. Os civis vitimados em Mossul pelo exército iraquiano e pela frente liderada pelos EUA, que apoia a ofensiva, são vitimas acidentais e colaterais, enquanto os civis que morrem em Alepo são impiedosamente massacrados pelo exército sírio, seus aliados e pela aviação russa. Em Alepo, dizem eles, a ofensiva está a provocar um desastre humanitário sem precedentes só comparável ao Holocausto, que quando olham para Mossul verificam que a ofensiva se faz quase pacificamente com todo o respeito pelos direitos humanos e pelas convenções internacionais. A lista destas comparações entre as notícias dos media ocidentais e declarações dos representantes diplomáticos dos países da NATO em várias instâncias é quase infindável. Só não é maior porque subitamente um manto de silêncio está a envolver, vá lá saber-se porquê, o que acontece em Mossul.

Ainda mais estranho é a ajuda humanitária necessária para dar conforto aos civis que conseguiram escapar aos terroristas em Alepo, que disparam sem olhar a quem, sobre quem tenta fugir-lhes pelos corredores humanitários abertos, não ser distribuída aos refugiados que conseguiram fugir, insistindo-se num cessar fogo para fazer chegar essa ajuda aos territórios ainda em posse do Estado Islâmico. Ninguém, nos media ocidentais estranha esse sucesso nem a duplicidade da diplomacia ocidental que se intensificou agora para salvar os restos dos terroristas que continuam a bombardear as zonas que já estavam na posse do exército sírio e as que foram recentemente libertadas. A hipocrisia e o cinismo não conhecem fronteiras, Até se afadigam em calar ou desacreditar os relatos dos missionários cristãos que estão no terreno, como se assistiu por cá com o testemunho da freira missionária Guadalupe que só agora estão a surgir dada a situação no terreno ser cada vez mais desfavorável aos jihadistas.

Mas a estrada para Alepo não se fica pela Síria. É uma longa rota que está em todo o mundo, tem sinaleiros a cada curva, abre os semáforos a qualquer sucesso. A última mais sonante foi a morte de Fidel de Castro. Da direita, da grossa à envernizada, à esquerda pinóquio do grilo, ouviram-se e leram-se as coisas mais extraordinárias. Desde a mentira mais que provada ser mentira de Fidel ser um multimilionário até à mais vulgar observação que os milhares de cubanos que o homenageavam estavam a homenagear um ditador, um tirano, facto inédito em qualquer parte do mundo. Só faltou dizer que quem ficasse em casa ou saísse das filas era imediatamente fuzilado ou que atrás de cada três cubanos havia um comissário político a vigiá-los. Em Portugal o ponto alto foi alcançado pelo delírio etílico de um conhecido e celebrado comentador que descobriu que Fidel tinha destruído uma nação que era a mais próspera da América Latina e do Sul, coisa que só a Mafia seria capaz de dizer, nem sequer os mais empedernidos direitinhas.

Por cá, como em todo o mundo, a estrada para Alepo está sempre em construção. A toda a hora, a cada segundo. Basta ligar a televisão nos intervalos dos jogos de futebol e dos inúmeros programas a falar de futebol.

Muitas pedras tem a estrada para Alepo e muitas mais estão de reserva prontas a continuar a construir esta auto-estrada com múltiplas bifurcações em que se nega tudo, mesmo as próprias evidências, para manipular universalmente a opinião pública e manter um estado de alienação generalizado.

A estrada para Alepo, que essa gente percorre como formigas que não saem do carreiro, nunca encontrará a estrada para Damasco por lhe desconhecer o significado. É um túnel sem luz, sem que se vislumbre uma qualquer bruxuleante luz ao fundo.

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O Mundo às Avessas

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A Grande Guerra (1964) / Magritte

Vivemos num mundo às avessas! Mundo manipulado por poderosa máquina que controla a comunicação social, que usa os meios tradicionais e os mais recentes proporcionados pela internet. Ser toupeiras para furar aqui e ali esse espesso manto acontece com afinco quase militante para cumprir o desígnio orwelliano de “num tempo de engano universal, dizer a verdade é um acto revolucionário.”

Não se olha a meios para alcançar os fins que usa e abusa da mentira que acaba, quando acaba, por ser desmascarada depois de ter atingido os seus objectivos. Das verdades e meias verdades para com a verdade me enganares, às omissões cuidadosamente controladas. Um bombardeamento noticioso e opinativo que enche as prateleiras da memória para essas prateleiras também serem de esquecimento. Recentemente essa gigantesca máquina de (des)informação esqueceu-se, na sua esmagadora maioria, de dar realce à sentença do Tribunal Internacional Criminal sediado em Haia, uma invenção dos EUA que cautelarmente colocaram fora da sua alçada os cidadãos norte-americanos e as tropas e mandantes da NATO, que ilibou por unanimidade Milosevic dos crimes de que fora acusado. Milosevic, o carniceiro dos Balcãs como era classificado por essa monstruosa máquina (des)informativa, morreu há dez anos na prisão sem que justiça lhe tenha sido feita.  O silêncio quase absoluto seguiu-se ao rufar dos tambores de guerra. Utiliza-se com enorme desenvoltura o sistema de ocultação e desocultação para que as mentiras propaladas se sobreponham às verdades que não podem ser desmentidas. As falsificações, mesmo as mais óbvias, são autenticadas pelo sistema mundial dos media para que a verdade não se distinga da mentira. A extrema gravidade deste mundo às avessas é que se continuam a fabricar  novas falsificações jogando com a falta de memória ou com memória distante e enovoada das falsificações anteriores.

Volta Goebbels estás perdoado! A verdade está definitivamente assassinada. É o triunfo do império onde tanto faz Clinton ou Trump chegarem ao poder. Nenhum será o mal ou o menor dos males. Ambos são o pior dos males. O mundo está cada vez mais perigoso.

( editorial do Jornal a Voz do Operário/Setembro 2016)

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O primeiro dia da campanha eleitoral para as Presidenciais

 

medusaA campanha da eleição presidencial que hoje  oficialmente se inicia teve nos tempos de pré-campanha algumas curiosidades que se devem registar por desnudarem, mais uma vez, os truques da comunicação social, entrincheirados nos critérios editoriais e jornalísticos. Esventram uma realidade de todos conhecida, por mais sabida, a do mercenarismo aliado à falta de qualidade profissional. O rol, só focado neste tema, seria extensíssimo, algumas notas são relevantes.

A mais notória, desde as primeiras notícias, é a da discriminização entre os candidatos. Todos têm nomes, mesmo títulos. Ele é o professor Marcelo, a imagem de marca muitas vezes dispensa os apelidos, a dra Maria de Belém, o professor Sampaio da Nóvoa, o professor Paulo Morais, o engenheiro Henrique Neto, a deputada Marisa Matias e por aí fora todos alinhados e identificados, até Tino de Rans, menos um raramente referido pelo nome Edgar Silva, sendo mais conhecido como o candidato do Partido Comunista.

O tom dos supostos moderadores e entrevistadores variou da indiferença, da sobranceria, do apoio amigo, à provocação rasca. Reveja-se por exemplo Judite de Sousa com Maria de Belém que aliás disputa o apoio da jornalista com o professor Marcelo, ou Clara de Sousa que, qual árbitro de um combate de boxe, interpôs-se entre os professores Marcelo e Sampaio da Nóvoa, para permitir ao professor Marcelo sair das cordas. No meio das horas de debates e entrevistas não faltou uma baixa provocação. Uma rasteira, pensava o espertalhaço jornalista, a Edgar Silva, querendo saber coisa decisiva num debate daquele teor, se iria visitar a Coreia do Norte. Ninguém se lembraria de perguntar ao candidato Marcelo que país africano escolheria para concorrer com o seu amigo Cavaco a trepar aos coqueiros, ou se Sampaio da Nóvoa, desvelado com o apoio de Mário Soares, iria viajar para cavalgar uma tartaruga ou quando e onde Maria de Belém iria procurar o padre Melícias para obter refrigério espiritual, durante e depois da campanha eleitoral. No mapa mundo só lá estava a Coreia do Norte para ver se o candidato do PC tropeçava num qualquer membro da dinastia Kim. Assim são os altos critérios jornalísticos e editoriais.

Para além dessas curiosidades, os debates tem revelado um professor Marcelo no seu melhor. Diz e desdiz-se com o à vontade de mais de quarenta anos na política activa directa e indirecta, perseguindo os mesmos objectivos, como militante activo, até com responsabilidades máximas,comentador, analista, e essa categoria inventada que faz as delícias da política parola, fazedor de factos políticos. Um faz tudo que tudo faz de vichyssoies políticas. Mesmo quando Sampaio da Nóvoa lhe abriu as defesas e aplicou uns ganchos e alguns uppercuts, não foi ao tapete e andou a fugir pelo ringue simulando uns golpes desapoiados como se fosse um candidato independente. Como bem disse Edgar Silva, o tal candidato do PCP, Marcelo é um mestre do engodo e do disfarce.  Oficioso candidato da direita tanto chora lágrimas de crocodilo pelas consequências das políticas de direita dos últimos anos que sempre amparou, mesmo quando criticava a forma e não o fundo, com jogadas de sumo oportunismo, chegando ao cúmulo de fingir não apoiar o que de facto apoiava. O professor Marcelo continua em todos os palcos, os que lhe oferecem e os que procura, o seu número de palhaço rico, mestre na dissimulação. A sua mais recente prestidigitação é o aparecer como um quase independente político e um interclassista a distribuir afectos. Ainda o havemos de ver mascarado de Francisco a pregar lérias aos votantes,  como se os seus amigos dilectos não fossem a alta finança e a alta burguesia, o seu berço. A comunicação social e as sondagens arrimam o estro e a lábia do personagem com desvelo.

Extraordinário, aliás nada extraordinário, é não houve ninguém que faça contas à campanha do prof. Marcelo. Sem pudor e desfaçatez quase fica roxo de indignação com os gastos das campanhas eleitorais dos outros candidatos. Não irá gastar raspas em cartazes, tempos de antena ou qualquer outro outro tipo de propaganda que não seja o esfolar solas a peregrinar pelo país, a distribuir abraços e beijinhos, a beber e pagar uns cafezinhos. Isto depois de mais de trinta anos a meter ao bolso os honorários principescos com que construiu a sua imagem nas televisões públicas e privadas. São milhares de horas nos chamados horários nobres televisivos É, de longe e em todos os tempos, a campanha eleitoral mais cara de algum partido ou candidato presidencial, com a particularidade de lhe rechear a carteira e demonstrar que, afinal, a banha da cobra é um produto valioso. Durante todo esse tempo, o único português, das dezenas de milhões que vivem em Portugal e na diáspora, que não sabia que o professor Marcelo fazia o seu caminho para Belém, carregado de ouro, incenso e mirra, era o próprio professor Marcelo, enrodilhado nas suas partes gagas, até ficar cansado de esperar que Cristo descesse à terra e  decidisse que era tempo de arrombar as portas do palácio de Belém.

O alfa e o ómega dos debates televisivos foi alcançado quando os candidatos Professor Marcelo Rebelo de Sousa e a dra Maria de Belém, no último debate, concordaram pressurosamente, que não se deveriam fazer julgamentos de carácter aos candidatos. Pudera! Com o currículo de qualquer um deles, um julgamento de carácter seria bastante corrosivo. O bicho comeria toda a maçã.

Com esse histórico, as sondagens, as sondagens valem o que valem e valem também para manipular, tal como a cobertura da comunicação social, o professor Marcelo, com um lastro de dezenas de anos de presença nas pantalhas televisivas, vai à frente e bem à frente de todos os outros candidatos. O grave e grande risco que Portugal corre é depois da múmia paralítica Cavaco trocar o Palácio de Belém pelo Poço de Boliqueime ver emergir das águas do Guincho essa medusa surfista que, ao sabor das ondas, vá fazer companhia aos nenúfares dos lagos de Palácio de Belém. Será constrangedor para Portugal, uma das primeiras nações do mundo ter como Presidente da República um invertebrado jongleur a jogar diariamente com bolas coloridas dos improvisos, das intrigas, dos enganos, das advertências e desavertências, das traições, como se a política fosse um jogo banal e não coisa muita séria na vida das pessoas. Esclareça-se, lute-se para que essa glorieta guiness não aconteça, nem na segunda volta eleitoral e muito menos no dia 24 de Janeiro.

 

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SEM VERGONHA!

ROUBARMais um banco para o galheiro e ninguém vai preso! Os supervisores não têm culpas! Os administradores vão com os bolsos cheios para casa! O governo PSD-CDS esteve cego, surdo e mudo! Os comentadores ditos especializados (*) só se preocupam com o aumento de um euro por dia no salário mínimo, porque destabiliza a economia! O que estabiliza a economia são as dezenas de milhões enterrados na banca para salvaguardar o sacrossanto sistema financeiro e evitar os riscos sistémicos! Uma única certeza mais dinheiro de todos nós vai para essa camarilha privada que vive à conta dos dinheiros públicos! Porque é isso que tem sucedido, com formatos diversos, mas todas com o mesmo escabroso final na banca, do BPN até ao BANIF. Pelo caminho ainda está por resolver o BES!

A única novidade foi António Costa dizer que a resolução(?) do berbicacho BANIF, vai custar muito caro aos contribuintes, uns 3 000 milhões de euros! A dupla Passos-Portas mais Maria Luís Albuquerque ainda devem ter a lata de continuar a afirmar que o processo BES, não nos vai aos bolsos! Com o mesmo descaramento com que Carlos Costa afirmava que o BANIF ia dar muito lucro ao Estado. Claro que vai, como se está a ver e como veremos quando a novela Novo Banco findar. Só não se sabe ainda quanto vai custar. Enquanto o fado continua a ser cantado, há quem siga a ganhar à conta dessas falcatruas. O inefável governador do Banco de Portugal está firme no seu lugar, a distribuir tachos, a contratar por 30 000 euros mês o vendedor da banha da cobra Sérgio Monteiro para vender o Novo Banco, o que na gíria dessa gentalha chamam de BES-bom, um trabalho da treta que acabará sempre por dar grosso prejuízo ao Estado.

Quanto ganharam os administradores do BANIF até o levarem ao estado actual? Tiveram prémios pela sua actuação? Luís Amado, aquele personagem bem engomado que dá bocas parvoides sobre a situação nacional e internacional, no que é muito aplaudido por uma claque, leia-se o elogio que Seixas da Costa lhe faz no blogue, quanto ganhou como administrador do BANIF? Ainda não há muito tempo, numa entrevista ao Jornal de Negócios e Antena1, já depois do Estado, nós os contribuintes, ter recapitalizado o banco e emprestado mais algum, assegurava que proteger o BANIF é proteger o dinheiro dos contribuintes!!! O seu parceiro de administração Jorge Tomé ainda recentemente afirmava sem uma ruga de dúvida que o BANIF tinha uma situação de liquidez confortável, criticando notícias não fundadas sobre a situação do banco. Como se está agora a ver! Os farsolas, como todos os seus parceiros, vendem vigésimos premiados com o à vontade que têm todos os embusteiros bem encadernados e treinados. Depois é a conversa fiada e criativa dos activos tóxicos, dos remédios, das bolhas, das imparidades, do não sei quê, patati-patata, nunca têm culpa de nada, nunca são responsabilizados. O Zé paga para continuar a ver o desfile de intrujas bem pagos com o dinheiro que lhe esmifram!

No meio disto há a célebre e celebrada saída limpa! Saída chafurda em que o défice só não é excessivo e cumpriu os objectivos (qual o rigor científico dos objectivos? Alguém é capaz de explicar?) porque contabilisticamente os bondosos tecno-burocratas de Bruxelas decidiram que o dinheirame para a banca não entra nas contas. Se não fosse assim o défice do ano de 2014 seria de mais de 7% e não 3,2% por causa do BES e de este ano, por causa do BANIF seria quase 5% e não os prometidos 3% pela dupla Passos/Portas e a pendericalho Albuquerque, sempre a dizer as mais obscenas mentiras com a cumplicidade de truques contabilísticos!

Lembram-se de Passos a aconselhar os portugueses a não serem piegas? De Portas a falar de se viver acima das possibilidades? De em coro cantarem alto e bom som que não há dinheiro para a saúde, para a educação, para a investigação, para a cultura, para…? E o brutal aumento de impostos? E os cortes nos salários, nas pensões, nas reformas? Não há dinheiro? Há, há sempre dinheiro e muito para a banca!!! Agora com o BANIF já são mais de 20 mil milhões de euros enterrados nos cofres bancários. Pouco, muito pouco terá retorno. Na melhor das hipóteses nem 10%!!! Um bom negócio dizia essa gentalha! Gente mentalmente prostituída que espalha e contamina tudo à sua volta com uma pustulenta degradação.

Esse bando de aldrabões, esse bando de trafulhas bem pagos continua à solta a mentir sem vergonha e a transitar alegremente de cargos públicos para altos cargos no sector privado que lhes paga e bem os favores feitos ou por fazer. Quando as coisas correm para o torto, lá estamos nós para pagar os resultados da sua incompetência bem remunerada até ao dia da desgraça! Depois alapam-se noutro valhacouto dos amorins, belmiros, jerónimos ou beltranos da mesma igualha!

O crime compensa? Ninguém acaba com esse circo de palhaços sem talento? Ninguém é responsabilizado? Ninguém vai preso? Mente-se, engana-se, vigariza-se e nada acontece? Claro que é gente cheia de ética, muito séria profissional e intelectualmente. Gente preocupadíssima com a sanidade moral da nação, grandes amantes da legalidade, desde que as leis sejam o direito dos mais fortes à liberdade, por isso é que quem, com fome, rouba uma lata de salsichas é preso, quem rouba milhões ao país continua alegremente a rebolar-se nos melhores restaurantes e bares, a pavonear-se pelos salões, a ser ouvido na comunicação social subserviente,(*) a ter contas bancárias bem fornidas, a ser convidado para desempenhar altos cargos tanto no sector público como no privado! Gente que, enquanto trapaceia, proclama com ar profundamente sério o seu profundo amor à transparência, ao Estado de direito sempre a repetir aos quatro ventos, como homens cheios de princípios, uns paladinos da honra da virtude e da lei uns cruzados contra a corrupção,  algo que um seu antecessor menos sortudo disse: Hoje em dia, as pessoas não respeitam nada. Dantes punham-se num pedestal a virtude, a honra, a verdade e a lei. Onde não se obedece a outra lei, a corrupção é a única lei. A virtude, a honra e a lei esfumaram-se das nossas vidas” (Al Capone, entrevista ao jornalista Cornelius Vanderbilt, Liberty, 17 de Outubro de 1931, poucos dias antes de ser preso por fuga ao Fisco). Sensibiliza-se essa preocupação veraz de cidadão tão exemplar, por isso me comovo quando, na mesma linha, Cavaco, Passos, Portas & Companhia apelam aos superiores interesses nacionais para fabricarem mais uma malfeitoria.

Até quando vamos viver/conviver com esses ratos de esgoto político-económico-financeiro? Não há processo de desratizar o país?

Há que acabar de vez com a pornografia rasca em que Portugal se atola.

 

(*) no bordel em que se transformou a comunicação social, o despedimento de Mourinho foi amplamente noticiado, durante vários dias e continua a fazer manchetes nos jornais, enquanto o despedimento colectivo de 500 trabalhadores da Soares da Costa foi referido, quando o foi, de raspão.

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EMBUSTES

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Por causa das próximas eleições e da organização dos debates na comunicação social, na ordem do dia os critérios editoriais. Paralelamente há lances ridículos como o argumentário do CDS preocupadíssimo com o eclipse do seu querido líder que, sendo número dois de uma coligação, fica afastado das pantalhas. Uma injustiça para quem, apesar das rugas que se acumulam nos tiques e tornam mais evidentes e penosos os vícios, todos os dias se olha ao espelho e pergunta: espelho meu, espelho meu, há político mais esperto que eu? Há político que salte melhor ao eixo sobre a verdade que eu?

Pormenores que empurram para zonas de sombra os debates sobre os formatos dos debates na comunicação social entre partidos políticos, debates  dominados pelos critérios editoriais, o grande embuste dos media ditos independentes e de referência. Qualquer quadro superior de uma empresa é da total confiança dos accionistas principais, dos donos das empresas. Pela mão não se sabe de que deus menor, os directores e editores dos meios de comunicação social consideram-se possuidores de um poder que os torna imunes aos interesses económicos dos seus patrões. Estão a mentir, Mentem, com a convicção dos grandes mentirosos capazes de negar tudo, mesmo as próprias evidências. A Negação de Pedro é uma história infantil comparada com as negações da realidade feita por essa gente. Por tudo e por nada brandem a bandeira dos critérios editoriais que são critérios única e exclusivamente orientados pela caça ao mercado e pela subserviência mais contumaz às directivas do capital.

Se dúvidas existissem basta fazer uma estatística cega das notícias, tempos e dimensão que cada um dos órgãos de comunicação social concede aos partidos, aos líderes partidários. Analisados os conteúdos a miséria ética dos campeões dos critérios editoriais é guilhotinada sem dó nem piedade. Assim se percebe o incómodo causado pelo último livro de Umberto Eco Número Zero, sobre o mau jornalismo “Escolhi o pior caso. Quis dar uma imagem grotesca do mundo, ainda que o mecanismo da máquina para sujar, de lançar insinuações, já fosse usado durante a Inquisição“. O pano de fundo desse mau jornalismo, no livro levado aos limites mais grotescos, é o do jornalismo mercenário generalizado que corre mundo, não dando a imagem real desse mundo. Constroem uma imagem que o procura perpetuar justificando as suas acções, das mais bárbaras às mais persuasivas. Procuram demonstrar que o motor que o faz funcionar pode ter defeitos, falhas mas é o único motor possível. As críticas, as denúncias, por vezes inflamadas, dos escândalos políticos, económicos, sociais são instrumentais. Fazem parte de um jogo em que se compra credibilidade para continuar a generalizada intoxicação. Tal como ainda são necessários e indispensáveis jornalistas e comentadores de estatura e seriedade intelectual. Compulsar o seu desaparecimento progressivo dos órgãos de comunicação social nas últimas décadas elucida como a degradação alastra.

Grécia, Ucrânia, Médio Oriente, Europa, os desastres humanitários, as crises económica mundial, as artes e as letras, o desporto, a chamada Lifestyle, tudo o mais que flutua nesse caldo de cultura, são temas passados pelo crivo dos critérios editoriais que os trata e maltrata, banaliza como coisas naturais, passíveis de correcções de pormenor nunca de fundo. Que as tratam e maltratam na construção de um imaginário que quer impor uma visão  unilateral, uma visão pós-moderna do mundo, em que a ideia moderna de uma racionalidade global da vida social e pessoal se desintegrou numa miríade de mini-racionalidades ao serviço de uma inabarcável e incontrolável irracionalidade, como diz um dos seus próceres, só não concluindo como devia que essas mini-racionalidades ao serviço de uma inabarcável e incontrolável irracionalidade são a base de uma ideologia que tem uma fé avassaladora e totalitária no neoliberalismo económico.

O objectivo final é que o mundo seja um campo de concentração, rodeado de barreiras de arame farpado materiais e imateriais, onde se encerre a dimensão humana enquanto motor de transformação e emancipação. Os fornos crematórios sempre activos para reduzirem a cinzas mesmo pensar a possibilidade de se pensar qualquer transformação significativa da forna de organização da sociedade. Parte substancial dos rolos de arame farpado, do combustível dos fornos crematórios é fornecida pela comunicação social com uso intensivo dos seus meios tradicionais e modernos, decorados com os pendões dos critérios editoriais.

O mundo atola-se nesse pântano que Peter Sloterdijk classifica de cínico por sustentadas em acções descaradas e desonestas o que as distingue do cinismo antigo de Diógenes e seus seguidores, nos quais a crítica das convenções era inseparável de uma prática coerente de recusa de compromissos: (o cinismo) na antiguidade era uma conduta de liberdade e de autonomia individual; na pós-modernidade é um conformismo cúmplice das piores baixezas. O sentir pós-moderno parece ter ficado paralisado pela discrepância entre um conhecimento lúcido e penetrante e uma imoralidade deliberada, sem freio e sem pudor.

Denunciar, desvendar os mecanismos económicos e institucionais em que se funda e afunda esse mundo pós-moderno do capitalismo neoliberal não tem comprometido a sua credibilidade. Aliás, essas desmistificações por mais sérias e credenciadas que sejam são sistematicamente remetidas para buracos onde se espera fiquem sepultadas. Esquecem-se da história mitológica do criado do Rei Midas que contou um segredo terrível sobre o seu senhor a um buraco que fez na terra e que tapou cuidadosamente. Nesse lugar cresceu um zambujal por onde a brisa passava e os bambus transmitiam o segredo aos quatro ventos. As denúncias dificilmente ultrapassam os muros, mas acabam sempre por os saltar questionando a rede de interesses económicos que domina o mercado e impõe, com indisfarçável arrogância, fedorenta ou perfumada, os seus ditames. É o triunfo do economicismo puro e simples que para Ariel Kolnai, não é repugnante, quando procede segundo uma lógica abstracta da qual a vida está excluída. Passa a ser repugnante quando se entrincheira por detrás dos valores, da ideologia, ou seja, por detrás duma afectividade enganadora e hipócrita.

A comunicação social, entrincheirada nos critérios editoriais, é uma das grandes e principais rodas dentadas desse gigantesco mecanismo que tritura o mundo em benefício do grande capital. Proclama em alta grita uma independência em que ninguém acredita, que eles próprios sabem ser um cínico e repugnante conceito. Fazem-no com a impunidade de a vigarice intelectual não ser crime previsto em nenhum Código Civil. A lei é, sempre foi, o direito do mais forte à liberdade. Não será para todo o sempre porque só a verdade é revolucionaria. Há que lutar por ela com todas as armas ao seu alcance.  O mundo apodrece, não se espere que caia.

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