CDS, Política

Al(l)egro ma non troppo

Alegro-Setubal-renders

Na semana passada foi inaugurado um novo centro comercial em Setúbal.

Tal facto, não constituiria notícia relevante se o país não vivesse a crise actual, com a consequente retracção no investimento privado e se não acontecesse em Setúbal.

A inauguração do Alegro Setúbal inundou as redes sociais de comentários, nos cafés, nas empresas, nas escolas, não se falou de outra coisa e na comunicação social teve lugar de destaque.

Foram ouvidas opiniões para todos os gostos: é muito pequeno, para uns, muito grande, para outros; vai dar cabo do que resta da baixa comercial, para uns, é uma oportunidade para a baixa, para outros; é um mamarracho, para uns, é uma centralidade renovada e bem inserida na malha urbana, para outros… enfim, opiniões que se não valerem para mais, servem para interessar e envolver as pessoas na discussão sobre a vida e a construção da cidade.

No entanto, para lá das opiniões, existem dados que parecem ser objectivos e contrariam as teses daqueles que se limitam a confundir os seus desejos com a realidade.

A abertura deste centro comercial revela, uma vez mais e apesar das dificuldades que o país atravessa, que Setúbal consegue atrair investimento, gerador de emprego e dinamizador da economia, numa lógica de planeamento municipal capaz de estruturar a cidade e o seu desenvolvimento.

É claro que isto não é coisa fácil de reconhecer por aqueles que sustentam outros projectos políticos e são responsáveis pelo estado a que o País chegou e insistem na política de empobrecimento dos trabalhadores e do povo português, exemplo disso, é a extraordinária opinião de João Veigas, deputado do CDS-PP, que não podendo continuar a sustentar a tese da ausência de estratégia da CDU ou de que os comunistas afugentam o investimento privado, diz a seguinte coisa:

«Nunca é demais repetir, principalmente aos eleitores do PCP, que se Portugal fosse governado seguindo as políticas deste partido, dificilmente estaria a ser inaugurado um novo centro comercial em Setúbal e os restantes existentes no distrito, também não existiriam».

Esqueceu-se de dizer que no Portugal governado pelo PCP até as escovas de dentes são partilhadas por todos, porque, à falta de propriedade privada, no socialismo é assim.

Se fosse um exercício de comédia, seria de má qualidade, quanto muito daria para esboçar um sorriso.

No entanto, pelo tom, parece ser coisa séria, reflexão profunda e elaborada, é o chamado raciocínio Allegro ma non troppo, é toda uma filosofia condensada num andamento, pois não existem condições para mais.

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5 thoughts on “Al(l)egro ma non troppo

  1. O articulista não esclarece as consequuências económicas e sociais da implantação desta “catedral” praticamente no centro de setúbal. E não esquecendo que vivemos e intervimos numa sociedade capitalista, pergunto-me se cabe aos comunistas “embandeirarem” em arco pelo aumento do investimentos e da apropriação privada da mais-valia em contexto e aparente defesa do capitalismo. Talvez não seja mas pode parecer sê-lo.

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    • Caro Victor,
      Aquilo que escrevi não tinha qualquer intenção de avaliar ou sequer opinar sobre o centro comercial, limitando-me a observar a pobreza e a demagogia anti-comunista utilizada por um deputado do CDS num artigo de opinião e a considerar que no quadro da mera gestão autárquica Setúbal tem continuado a ser atractiva para o investimento, mesmo quando as políticas governativas tendem para o inverso.

      De qualquer modo, enquanto comunistas que na análise que fazemos do actual momento do capitalismo consideramos intervir no seio das suas instituições, admitimos uma economia mista, tal como consagrada na CRP (pública, privada e cooperativa), defendemos o crescimento económico, o desenvolvimento das forças produtivas e a melhoria das condições de vida, não nos cabendo embandeirar em arco (estou de acordo), pergunto se nos podemos/devemos opor a determinados investimentos privados? Esta consideração perante o investimento, não implica, antes pelo contrário, que não haja uma oposição feroz às condições de trabalho impostas e à exploração praticada, às presumíveis consequências negativas no tecido económico pré-existente.

      Ou seja, atrair investimento, promover condições para que se criem postos de trabalho e se dinamize a economia, não significa a defesa do modo de produção capitalista, nem implica, claro está, que tenhamos de glorificar esses investimentos ou que abdiquemos de intervir no sentido de organizar os trabalhadores e conduzir a luta nos locais de trabalho pelo fim da exploração.

      Mas, se analisarmos a situação deste investimento concreto desprovida da sua contextualização no tempo e no espaço em que ela acontece, podíamos cair facilmente na tese do deputado do CDS e chegar à conclusão de que se os comunistas governassem não haveriam centros comerciais. É esse olhar simplista e grosseiro que, julgo, devemos refutar.

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      • Caro João
        Não personalizes o meu comentário ou reflexão. Não é essa a intenção.

        Este nem é um investimento produtivo, a banca e o Governo há muito que não apoiamos investimentos produtivos e quando o faziam era apenas para assegurar “rendas vitalícias” como nas ppp´s. Com investimentos em que a parte de leão nas infra-estruturas ou na formação cabe ao Estado através dos impostos ou de fundos “comunitários”. Tal como sucede também nas “concessões” na área da saúde” ou os “cheques” ao ensino privado, sejam ou não abertamente confessionais.

        Este tipo de investimentos nem favorece a “produção” nacional, pois coloca os produtores “amarrados”. Reflectindo sobre o teu 4º § [de “Ou seja” até “organizar os trabalhadores e conduzir a luta nos locais de trabalho pelo fim da exploração.”]. Eu suponho que o objectivo final dos comunistas, na organização e da luta pelo fim da exploração, que não se reduz apenas aos locais de trabalho, é a abolição das relações de produção capitalistas e sua substituição pelas socialistas, que se não reduzem ao local de trabalho mas implicam tb uma outra consciência e prática sociais.

        Seja na área da produção ou não, seja na pequena ou na grande empresa, não há um investimento capitalista bom e outro mau: todos eles, sob pena de falência empresarial, se baseiam na intrínseca necessidade de maximização do lucro e, consequentemente, do aumento da apropriação da mais-valia criada pelo Trabalho, pelos produtores. Situem-se estes em Portugal, no Extremo Oriente, em África, nas Américas ou na Alemanha.

        O grande dilema, para um partido e para militantes que se pretendam revolucionários, é saber como não esquecer os princípios nem abdicar dos objectivos finais da luta, sem subterfúgios, no quadro duma sociedade capitalista, qd insidiosamente se nos entranham as formas de pensamento e de actuação próprios das relações de produção que dizemos e acreditamos combater, à mesa do café ou nas autarquias ou no movimentos e organizações dos trabalhadores

        Escreves no § 2º [de “De qualquer modo” até “determinados investimentos privados”] Esta foi a CRP possível com a relação de forças entre o Capital e o Trabalho em 1974/1975. Não é, nunca foi, a CRP pretendida pelas forças que financiavam o ps(d)cds, que a aprovaram com reserva mental, como depois afirmaram e confirmada pela prática, alterações e leituras que dela têm feito. Dá garantias e reconhece direitos a sujeitos e agentes de interesses e objectivos radicalmente antagónicos e as relações de produção protegidas pelas práticas governativas e legislativas são as capitalistas. Não há “ilhas” socialistas numa sociedade capitalista.

        Naturalmente que as atoardas do ps(d)cds devem ser desmascaradas e combatidas com os fracos meios ao nosso alcance. Especialmente no plano ideológico. Pois “a messe é grande e poucos e divididos os operários”. Quanto aos “investimentos” em Portugal e não só, esses não deixam de ser capitalistas. Quanto às invectivas do ps(d)c ds, existirão sempre, tal como na história do “velho e do burro” ou do “ser preso por ter cão, preso por não tê-lo”

        Sem acrimónia

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