As coisas tinham até começado com um sinal de esperança – o “irrevogável” pedido de demissão de Paulo Portas prenunciava um novo ciclo político. Mas após uma semana e chegados ao epílogo desta novela trágico-cómica, conclui-se que o mais relevante será Portas e o seu partido (11,7% nas últimas Legislativas) se terem guindado, ao que se sabe, às mais altas responsabilidades no Governo.
No princípio da crise, iniciada com a demissão de Vítor Gaspar e a indicação da sua discípula Maria Luís Albuquerque para o Ministério das Finanças, parecia até genuína a intenção do líder do CDS – provocar o derrube do Governo. Como é que, demitindo-se o chefe de um dos partidos da coligação, o Presidente “aguentaria” o Governo? E mais se viesse a ser votada no Parlamento uma moção de censura ou recusado um voto de confiança?
As reacções dos mercados financeiros, com os aumentos imediatos nos juros exigidos aos títulos da divida soberana e a queda dos valores dos títulos na Bolsa de Lisboa, criaram um clima emocional e político que ofuscou a evidência – o Governo PSD-CDS caía devido ao completo e total falhanço de tudo aquilo a que se propusera, destruído pelas suas contradições internas. Para Paulo Portas o momento era o adequado para sair de cena, assim julgando poder controlar os danos de dois anos de governação. Limitava-se assim a assinar o que julgava(mos) ser a certidão de óbito da coligação!
O estado de protectorado sob o qual o país se encontra impediu o que seria a saída mais saudável para a crise – a demissão do Governo e a convocação de eleições.
Abertas as hostilidades P. Coelho rapidamente se deslocou ao encontro dos chefes europeus, onde avultou o mediático e simbólico encontro com A. Merkel na escadaria da Chancelaria em Berlim. Por esses dias o inefável Schauble, com a ajuda do também inefável Barroso e de outros figurões de primeiro plano do Directório, rapidamente deixaram claro por que baias se poderia conduzir a política portuguesa – manter a coligação da Direita no poder, evitando o recurso a eleições!
Com Portugal assistiu-se à mesma intrusão na soberania nacional que já havíamos visto em Itália com a imposição de M. Monti, ou na Grécia com a recusa do referendo proposto pelo então primeiro-ministro G. Papandreou.
Com Portas reconduzido ao redil, a direita portuguesa teve que voltar a dar uma de bom aluno. Isto é, “fazendo das tripas coração”, segurar as pontas e congelar por mais algum tempo o cadáver político que é a coligação e o Governo.
Com a decisão já tomada pelo Directório europeu, Cavaco Silva entreteve-se em rodriguinhos ouvindo partidos e parceiros sociais e, como sempre, nada dizendo ao país. Já todos sabemos que não é ele quem toma a decisão!
O remendo da coligação é uma manobra de puro tacticismo. Faz com que a partir de agora Portas e o CDS deixem de poder fazer um discurso dúplice. O que custa ao maior partido da coligação, o PSD, entregar ao seu aliado algumas das principais pastas e assuntos: a coordenação económica, as relações com a troika e “reforma do Estado” – a confirmar-se o que foi tornado público. P. Coelho aligeira assim as suas responsabilidades, preparando-se para arrastar consigo os seus amigos do CDS se o barco se afundar.
O que ganhou o país com esta crise ditada a partir do interior do Governo?
O prometido e a que tudo se sacrificou acesso aos mercados financeiros tornou-se mais difícil e distante. Ficou mais próxima a perspectiva de um segundo resgate, agora “brando” nas palavras do jornal espanhol El País”. Para enfrentar tamanho desafio o Governo que agora se apresta a iniciar funções apresenta-se minado pela desconfiança acumulada entre os seus principais actores e desgastado perante o público.
A economia determinará o êxito ou o fracasso deste novo-velho governo. O emprego, o investimento, o rendimento disponível dos cidadãos, a reposição da confiança. Isto é, a inversão do longo ciclo de recessão que as políticas de quem queria “ir além da troika” conduziram o país. Perante isto as explicações que P. Portas terá que dar, mais cedo ou mais tarde, são quase irrelevantes!
Quando se esperava uma clarificação, o Presidente Cavaco Silva decidiu adiar a solução da crise e criar mais problemas. Da sua comunicação ao país resultam mais dúvidas que certezas. Certo é que a crise se vai prolongar, com todos os danos que daí resultam.
Cavaco apela ao PS para que se junte à maioria PSD-CDS, o que, em rigor, não é novidade e tem vindo a ser pontualmente tentado por P. Coelho. Cavaco junta-lhe agora o engodo de um compromisso sobre o cumprimento do “programa de ajustamento” que vá para além de eventuais eleições antecipadas após Junho de 2014. Mas esquece que o PS já se posicionou para virar esse capítulo e assenta agora sua estratégia na reclamação de eleições.
Veremos o que PS responde à proposta de uma União Nacional.
GostarGostar