Política

“A economia é o método, mas o objectivo é mudar a alma”

Esta frase foi dita por Margareth Thatcher há muitos anos quando implantava no Reino Unido as medidas económicas preconizadas por Friedman e que vieram a ser conhecidas por neoliberalismo.

Ela decidira avançar com um plano de privatização e encerramento de minas de carvão. Só o conseguiu fazer depois de uma batalha ideológica intensa tendo por objectivo quebrar o movimento sindical inglês que era muito poderoso, nomeadamente, o sindicato dos mineiros. Thatcher ansiava pelo conflito. A Dama de Ferro via o sindicato dos mineiros como uma das “trincheiras” da extrema esquerda inglesa, a quem ela acusava de preparar “a longa marcha rumo a uma utopia marxista”, conforme escreveu em seu livro de memórias The Downing Street Years.

Política e ideologia à parte, os sindicatos eram um empecilho para a estratégia de privatizações e redução da participação do Estado britânico na economia”, afirma Harry Cocks, doutor em história social da Universidade Birkbeck, de Londres. “O poder que obteve com a vitória esmagadora foi suficiente para aprovar, ainda em 1985, a chamada legislação anti-sindicatos, que inspirou outras tantas mundo fora e que existe ainda hoje”, afirma Harry Cocks. “É por isso que houve pouquíssimas greves relevantes desde 1985.”

A derrota dos mineiros permitiu-lhe, juntamente, com a habilidade de manipular a população com a guerra das Malvinas, avançar para a privatização daa companhia de autocarros, dos caminhos-de-ferro, do gás, da água e da eletricidade. O ataque ao Estado Social foi a outra vertente da sua política contra as classes trabalhadoras.

Durante os anos de governo Thatcher, a política neoliberal centrou-se na propaganda ideológica que a frase There is no Alternative! concentrou e concretizou a mercantilização dos direitos e até da vida. Tornou-se um facto incontestável e explicador de tudo: fim da história, fim do emprego, fim dos sindicatos, fim das lutas, fim do Estado.

A crença na falta de alternativas desempenhou um papel ideológico importante em conjunto com esse fim de tudo. Assim, só restava uma alternativa: a neoliberal altamente individualizante que levou a uma sociedade atomizada, em que cada qual trata de si próprio, com pessoas descomprometidas e pouco solidárias.

O desemprego crescente tornou ainda mais difícil a actividade sindical agravada por campanhas mediáticas para desacreditar os seus principais  líderes.

É claro que tudo isto não significou o fim dos sindicatos nem das lutas sindicais, mas enfraqueceu muito a capacidade de defesa daqueles e a crise sindical surgiu.

Margareth Thatcher sintetizou bem o que pretendia o neoliberalismo fazer de todos nós quando disse que o objectivo era mudar a alma.

E, de certo modo, consegui-o em vários aspectos, servindo-se também dessa força poderosa que são os órgãos de comunicação social que funcionam não só como desinformadores, mas também formatadores de opiniões acríticas e passivas e ainda de objectivos de vida fúteis do ter e do consumir, das modas e do sucesso fácil.

Inclusivé, com a sua forma de apresentar a política (a que os políticos comprometidos com o grande capital dão uma prestimosa ajuda) levando ao desacreditar da mesma a nível dos mais novos (que se queriam apolíticos, afastados dos sindicatos ou de quaisquer outras organizações sociais) e mesmo daqueles que já o não sendo sentem a descrença e o desânimo a envenenar-lhes as cabeças.

Poucos jovens saberão que o que há hoje nem sempre foi assim. Há em todo o processo de formatação ideológica do capitalismo a necessidade de se apagar a memória história. Os manuais escolares não devem ilustrar aquilo que nos trouxe direitos e conquistas fundamentais. Também não devem ilustrar aquilo que há mais de 35 anos os vem destruindo. Sobretudo, valoriza-se a participação individual, a resignação e o colaboracionismo. Não é por acaso que os média dão mais força a modelos de luta que remetem para o que de embrionário e inconsequente havia no século XIX.

Já ninguém acredita ser possível recuar-se até ao século XIX. Mas a verdade é que

o grande capital financeiro e empresarial avançará tanto quanto os trabalhadores deixarem. Cabe a nós impedi-lo e organizar o contra-ataque sem tréguas nem desfalecimentos.

Dizer-lhes bem alto que não nos mudaram a alma a muitos e muitos que continuaram a luta e que, se esteve para alguns um pouco adormecida, ela aí está inteira, límpida, serena e se irá fortalecer ainda mais na certeza de que poderemos mudar este mundo sem alma que as Thatchers, Merkels, Lagardes, e todos os outros que as acompanharam e acompanham, criaram.

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