“A Saúde é uma das maiores áreas de negócio a nível mundial e, negócio melhor do que a saúde, só a indústria de armamento.”
Este “elevado” conceito foi proferido pela Presidente da Comissão Executiva da Espírito Santo Saúde aqui há uns tempos. Também clama por uma maior liberalização a nível dos cuidados de saúde primários.
Estas declarações põem a nú o que pretendem os privados da saúde em Portugal.
De facto, nos anos 90 em que muita coisa aconteceu em termos de privatizações, vemos os grandes grupos económicos estenderem as garras para os lucros na saúde, garras que aumentaram com todas as conivências dos sucessivos governos a partir de então que, tornando cada vez mais frágil o SNS, foram criando as condições para a aceitação da sua privatização por parte dos portugueses.
O próprio Sr. Correia de Campos dá o dito por não dito sobre algumas questões, nomeadamente, sobre as taxas moderadoras. Correia de Campos reconhece, num livro que publicou, que a criação de novas taxas moderadoras não visou moderar o acesso, como na altura justificou, mas preparar a opinião pública para uma alteração do financiamento do sistema.
Temos aqui de salientar desde já algo que é a fundamental diferença entre o Estado e os privados: o Estado investe na Saúde, os privados investem, sobretudo, na doença.
O SNS português, aquele que foi considerado pela OMS um dos melhores do mundo, foi alvo dos ataques das forças de direita logo após o seu nascimento com todo o tipo de ataques ideológicos até aos constrangimentos orçamentais. Na sua defesa estiveram a maioria dos seus profissionais de saúde e também os utentes.
Daqui também decorre que a sanha destruidora tenha aumentado, visando a sua total destruição ou mantendo serviços mínimos na lógica implementada pelo FMI e pelo Banco Mundial, nos anos oitenta do século passado, de que seriam necessários cuidados de saúde primários selectivos, dirigidos aos mais pobres, deixando de lado o carácter universal dos cuidados, porque isso era muito caro. Quanto à promoção da saúde, foi reduzida a acções de informação e de educação para se obterem práticas mais saudáveis, deixando de lado os determinantes sociais da saúde.
O determinante fundamental na saúde passou a ser o do lucro e, se possível, do lucro máximo.
O direito à saúde é um direito humano fundamental e, por isso, os governos têm a obrigação de implementar políticas de saúde que visem toda a população e cuja realização requer a acção de muitos outros sectores sociais e económicos além do sector saúde. Além disso, o desenvolvimento económico e social está dependente da saúde e esta daquele.
Os portugueses já pagam directamente do seu bolso cerca de 30% das despesas totais com a saúde. Esse valor em Inglaterra é de 10% e em França é de 7%.
Em 2008, (dados do Eurostat) os gastos totais em cuidados de saúde em percentagem do PIB foram em França de 10,9, na Alemanha de 10,3, na Suécia de 8,8 e na Finlândia de 7,9,sendo os gastos do governo, respectivamente, de 8,7%, 8,2%, 7,5% e 6,2%. Em Espanha, os gastos foram de 8,7% e de 6,5%.
Em Portugal foram de 9,5% e 6,5%. Em 2005, estes números foram de 9,8% e de 7,0%.
Quanto às despesas em cuidados de saúde por habitante, medidas em Paridade do Poder de Compra Padrão na França foram de 2.963€ as totais e as do governo de 2303€, na Alemanha foram de 3092 € e de 2367 €, na Suécia de 2842€ e de 2317€ e na Finlândia foram de 2464€ e de 1834€. Em Espanha foram de 2320€ e de 1685€.
Em Portugal foram de 1957€ e de 1274€.
O setor público é a principal fonte de financiamento de saúde em todos os países europeus, exceto no Chipre.
Estes números ajudam-nos a perceber a mistificação de que o Estado em Portugal gasta muito em cuidados de saúde.
A outra mistificação é de que os cuidados de saúde são tendencialmente gratuitos; contudo, o SNS é suportado pelo pagamento dos impostos; pagam mais os que têm mais rendimento, assegurando-se a universalidade no acesso; no acto da sua prestação é que são tendencialmente gratuitos. É um serviço pré-pago e isto é importante que se comprenda.
A Resolução 58.33 da Assembleia Mundial de Saúde de 2005 refirma que todos devem ter acesso a serviços de saúde sem necessidade de sacríficios financeiros (incluindo a perda de rendimentos) no momento em que deles venham a precisar.
A defesa urgente e intransigente do nosso SNS geral, universal e gratuito é fundamental para garantirmos a acessibilidade de todos os portugueses aos cuidados de saúde independentemente da sua situação económica e social.
Numa altura em que o SNS mais se justifica a si mesmo existir, prevalecer argumentos de “utilizador pagador” em favor da sustentabilidade do sistema e a preocupação da prestação tendencialmente gratuita praticada pelos médicos, mais afastam a universalidade do sistema pelo acesso àqueles que mais precisam e mais difícil a defesa do nosso SNS.
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Grata pelo seu comentário, pois todos nós pagamos o SNS com os nossos impostos e é isso que o torna gratuito no momento da prestação de cuidados. Mas vemos com certa frequência ataques ao SNS e à sua sustentabilidade com argumentos de que tem de deixar de ser gratuito e muitas pessoas são levadas a esquecer que os impostos servem, entre outras coisas, para financiar o SNS.
Os lucros dos privados foram de mais de 1000.000€ em 2011!
E quanto se injectou no BPN?
Anita Vilar
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