As revelações da Wikileaks continuam a abanar o mundo diplomático. Diplomatas na reforma, mais activos no comentário, e diplomatas no activo, mais contidos nas apreciações, são unânimes a condenar a actividade da Wikileaks. O mundo da espionagem guarda de Conrado o prudente silêncio.
Há argumentos para todos os gostos e de todas as cores. Há mesmo quem afirme que a diplomacia tem sido uma verdadeira alternativa à guerra. Nem sempre o terá sido. A história regista inúmeros exemplos em que a diplomacia serviu para intoxicar e facilitar o uso da força, garantindo as costas quentes a várias aventuras bélicas. Não esquecemos a cimeira dos Açores, com Durão Barroso como prestimoso porteiro.
Enfim … isso não é desvalorizar a actividade diplomática ou considerá-la uma actividade principalmente vocacionada para a frivolidade, embora muito pedagogicamente a leitura de “Cenas da Vida Diplomática” de Lawrence Durrell, infelizmente esgotado para quem não o leu, nos divirta com um retrato sarcástico e mesmo cruel.
No centro do furacão desencadeado pelo Wikileaks, há algo de relevante, que pode parecer lateral, altamente esclarecedor. Nos EUA, pelo que se lê numa nota de Tony Jenkins, publicada no Expresso, Mike Huckabee, membro destacado do Tea-Party, diz que Peter Assange devia ser executado, Peter King, membro da Câmara dos Representantes para as questões de segurança, quer que a Wikileaks seja considerada “uma organização terrorista estrangeira” o que configura uma declaração de guerra, Sarah Palin diz que Assange é “um agente anti-americano com sangue nas mãos”. Muitos outros, na mesma linha de tiro, multiplicam-se em ataques, mas não são referidos. O objectivo é o mesmo: se ainda não há leis suficientes para condenar Assange, ou futuros Assanges, à pena de morte ou prisão perpétua, que façam rapidamente essas leis para que não fuja à”patriótica” fúria.
O que é que isto se distingue das fatwas que tanto indignam o mundo ocidental e fazem saltar das cadeiras os intoxicados por uma cultura eurocêntrica, não se vislumbra.
Pode-se traçar um paralelo com os mujadhin afegãos acarinhados, financiados e armados sob a égide do inefável Zbigniew Brzenski, que foram e são o ninho de onde saíram os malditos talibãs.
Talvez se o Wikileaks estivesse a funcionar nessa altura se tivesse evitado que o Afeganistão e zona envolvente, se transformassem no actual vespeiro pantanoso, que não se sabe como irá acabar.
Há que anotar que, para aqueles próceres da diplomacia, aquilo é terreno de interessante e intensa actividade. Provavelmente interessante e estimulante para os protagonistas, com os maus resultados que se conhecem e hipotéticos bons por ora desconhecidos.
O que não se pode tolerar são dois pesos e duas medidas.